Capítulo 15 - POV Celina Couller

615 42 11
                                    

Pense em coisas boas, disse a mim mesma, olhando para as rodelinhas de pão e as imaginando ser um pote de ouro que eu precisava alcançar. Pense nas melhores coisas. Bolo de chocolate, talvez. Você consegue, Celina. Você precisa.
Fechei os olhos com força, mastigando as torradas como se fossem pedras na minha boca.
"Celina?" Abri os olhos de repente, vendo Sarah e seu caderno de anotações me observarem. "Algum problema com a comida?"
"Ah, não! Está, hmm, deliciosa." Continuei a comer, agora mais calma e com o melhor sorriso que conseguia dar enquanto ainda mastigava.
"Perfeito." Ela virou as costas pra mim novamente e voltou a conversar com as outras criadas, os risinhos e suspiros inundando a cozinha mais uma vez.
Todas estavam animadas pelo encontro que o príncipe teria hoje. Algumas narravam como ele seria, dizendo o momento do beijo e dos olhares que eles iriam trocar, e até mesmo do jantar a luz de velas, mesmo que o encontro fosse acontecer durante o almoço.
Me aguentei para não colocar as mãos nos ouvidos enquanto ouvia todos os elogios que elas davam. Parecia apenas errado demais para mim aquilo tudo que falavam. E o que mais me intrigava era eu não saber o porquê de todo o meu incomodo por algo tão banal.
"Aposto que ela é perfeita!" Annia exclamou, os braços no alto enfatizando sua fala.
"Aposto que ela é uma piranha!" Miranda imitou o tom de Annia, porém em vez do sorriso alegre da garota, Miranda tinha apenas uma careta. Ela se jogou na cadeira ao meu lado, afundando a cabeça entre os braços apoiados.
Por um pequeno momento, um só segundo, juro que tive vontade de abraça-la, ou apenas começar a conversar com ela com a ideia de já virarmos melhores amigas. No momento, ela parecia ser a única pessoa que me entendia. Até mesmo Maélina, sempre tão concentrada em seu trabalho, estava agora com uma caneca de café quente na mão, concordando com as meninas sobre como seria a tal selecionada, Katherin, parando de falar apenas quando dava mais uma mordida dos biscoitos que Windy servira na mesa junto com as torradas.
No entanto, tirando a louca ideia de trocar palavras com Miranda, cruzei meus dois braços na mesa e apoiei o rosto entre eles, imaginando escrever algo na madeira com a mão que estava mais livre. Estava terminando de desenhar o N de meu nome quando ouvi uns ruídos baixinhos. Levantei os olhos assim que Sarah me chamou, a mão ainda na orelha sobre o headeset.
"Precisam de você no-" Ela parou um momento, tentando ouvir melhor o recado que passavam a ela, a testa franzida. "No estábulo."
Foi a minha vez de franzir a testa. Até então, os únicos serviços que passaram a mim era os das criadas, pedindo para arrumar o salão ou algum quarto. Eu nunca havia feito outra coisa, muito menos do lado de fora do castelo.
Ainda encarando Sarah com o olhar desconfiado, me levantei devagar, esperando ela negar tudo dizendo que era um engano dela.
Mas ela não o fez.
Empurrei a cadeira para trás, abrindo minha passagem, e saí do aconchego e calor da cozinha.
Senti os pelinhos dos meus braços arquearem assim que o vento frio me atingiu, levando a mão rapidamente para a cabeça, segurando firme a touca para que não voasse. Arrumei os fios de cabelo que se soltaram do coque e ajeitei os babados do uniforme, voltando a caminhar.
"Dia lindo esse, não?!" Um senhorzinho abriu um sorriso assim que me viu, olhando depois para o céu atrás de mim. Seguindo seu olhar, virei a cabeça, encontrando um céu nublado, uma bolinha amarela fraca aparecendo de relance entre as nuvens que insistiam a tampar. "Não é todo dia que se consegue ver o sol."
"Ela não sabe, pai." Um rapaz saiu de trás de um cavalo, os cabelos castanhos sujos de palha. "Só sabe quando há sol ou chuva se tiver limpando os vidros das janelas." Ele deu uma palmada fraca nas costas do cavalo que não fez mais que dar uma bufada. E então ele olhou em minha direção, o sorriso tão largo que poderia ser visto com ele de costas. "A sua sorte é que têm caras como eu para tira-la de dentro daquele castelo."
"Foi você que me chamou aqui?" Perguntei, irritada, não me importando em soar grosseira demais.
"Sim, eu sei. Nem precisa agradecer." Ele voltou a olhar o cavalo, acariciando os pelos longos da cabeça, o sorriso esticado agora apenas para um lado.
"Você é louco." Soltei, cruzando os braços.
"Esse discurso já está velho demais, não acha?" Ele pegou uma das selas penduradas na madeira do estábulo, voltando para o animal e colocando-a sob suas costas. "Que tal começar a dizer coisas como, Você é tão legal, Allan. Ou Allan, pare de ser tão gracinha."
Cruzei os braços ainda com mais força sobre o peito, estreitando os olhos até que eles se transformassem em um fiozinho, quase não dando mais para enxergar. "Prefiro continuar com o meu antigo."
Ele se calou por um tempo, atacando as fivelas na barriga do cavalo e ajeitando a cabeçada e a embocadura. Quando voltou a me olhar, eu ainda com os olhos estreitos, ele apenas deu de ombros.
"O que foi?"
Abri os olhos e deixei que meus braços caíssem em encontro com minha cintura, apenas para depois ergue-los pro ar.
"Podem estar precisando da minha ajuda lá dentro. E você me chama aqui pra nada?" Manti a voz dura, indignada com toda sua audácia.
Allan, desde que o conheci uma vez que foi a cozinha consertar o chuveiro do banheiro feminino das criadas, percebi o tipo de rapaz que era. E com ele, tão irresponsável, eu deveria ficar longe para manter a promessa que fiz a Catrina e a mim mesma. Não poderia deixar de ajudar Maélina. Eu não queria ser seu fardo.
"E quem disse que você não ajudará?" Allan perguntou, parecendo ter lido os meus pensamentos. "Não é, Rain?" Ele voltou-se ao cavalo, dando tapinhas em seu ombro.
"Rain?"
"É, ela é uma égua. Pertence a princesa Evlyn." Ele, a cabeça ainda abaixada, levantou apenas os olhos, o sorriso novamente se esticando em seus lábios. "Então, preparada para monta-la?"
"Como?" O olhei atônita, revezando olhares entre ele e a égua.
"Você sabe, coloca o pezinho aqui e com a outra perna você passa por cima das costas..." Ele foi dizendo, a voz zombeteira, mostrando como se montava.
"Allan," Eu comecei, calma. Ele poderia estar brincado, ainda tinha essa esperança para eu me agarrar. "eu não posso montar nela." Apontei pra égua com a mão, como se aquele gesto bastasse pra mostrar a loucura que seria eu cavalgando por aí. "Eu sou uma criada, lembra?"
"Aprendiz de criada." Ele me corrigiu. "E Sarah falou a todos quando chegasse que, quando qualquer um de nós precisasse de ajuda, era você que deveríamos chamar. E eu preciso." Puxando as rédeas de um segundo cavalo, ele trouxe os dois pra fora do estábulo e puxou-os perto de mim. "Meu pai está cansado, e os cavalos não podem ficar presos pra sempre. Nem soltos sozinhos também." Ele puxou as rédeas da égua, esticando para mim com a mão estendida. "Me ajuda?"
Olhei pro senhor sentado no banquinho, descansando na sombra. Ele ainda tinha o seu quase-sorriso a mostra, a cabeça dando apenas um aceno positivo para mim. Me virei então para os cavalos, os grandes olhos brilhantes parecendo querer o meu Sim. E por último, olhei para Allan, o sorriso confiante que sempre carregava consigo, agora transformado em um sorriso pequeno, como a do pai, a mão ainda erguida.
Revirei os olhos, bufando. "OK, tudo bem! Eu ajudo!" Agarrei as rédeas, confiante, e puxei a égua um pouquinho. Ela soltou um bufo irritado, se negando a dar mais passos. Mordi o lábio, já não mais tão confiante. "Vem cá, como é que se monta mesmo?"
Allan começou a rir, me deixando a segurança dos dois cavalos e indo pra dentro do estábulo, voltando com uma calça e camiseta.
"Se troque primeiro. Não vás querer cavalgar de vestido." Ele jogou as peças de roupa no ar, e eu tive que esticar bem o braço pra alcançar elas antes que o vento carregasse-as para longe. "Trocador lá trás. Depois te ensino a montar." Ele disse, apontando para além do estábulo. Atrás da estrebaria, uma pequena portinha mostrava o interior de um cubiculozinho onde eu mal cabia dentro, com uma só privada. As roupas, diferentes das que Allan agora usava, estavam bem limpas, porém largas demais para mim. Foi preciso dobrar algumas vezes a borda da calça para que eu não tropeçasse nela, e a manga da blusa caía para um dos lados dos ombros. Até tentei dar um jeito, prendendo a barra da camisa para não ficar tão larga e dobrar as mangas até que ficassem do tamanho que seria de uma camiseta feminina, mas mesmo assim tive de soltar o cabelo em uma falha tentativa de tampar o busto. Com as bochechas vermelhas, saí de lá e fui ao encontro deles, dizendo a mim mesma para não me importar com a aparência ridícula que provavelmente estaria, já que nem espelho tinha na casinha para dar uma checada.
"Cabelo solto?" Ouvi Allan perguntar assim que me aproximei dos dois, porém não olhava para ele.
"Não diga mais nada." Lhe avisei, indo até o animal, encaixando o pé no estribo. "Vai ficar aí parado?"
Levantando as palmas da mão pro ar, Allan dobrou os joelhos em minha frente para dar impulso aos meus pés, me fazendo montar na égua.
"Agora posso dizer algo ou...?" Ele falou, calmo, me fazendo revirar os olhos. "Certo. Uma etapa já se foi, agora só falta você segurar as rédeas e guiar o cavalo. Simples."
Sua voz, tão firme e segura, fez parecer aquilo tudo realmente fácil. Puxei o laço nas mãos, enrolando a corda de algodão nas palmas. "Assim?" Quando perguntei, agitei forte demais as rédeas, puxando a cabeça do cavalo para trás, fazendo-o relinchar e sair correndo. No mesmo segundo, parei de prestar atenção nas cordas e me agarrei ao pescoço do animal, berrando o máximo que meu fôlego permitia.
No meio de meus gritos, jurava ter ouvido o velhinho gargalhar antes de ouvi-lo exclamar Vá atrás dela, garoto!, e em um minuto já via Allan do meu lado, o braço esticado em direção a cabeça da égua, tentando fazer carinho nela, ainda em movimento.
Eu vou morrer, meus pensamentos berravam na minha cabeça já que minha voz estava rouca demais para ela própria berrar. Mas, para minha maior surpresa, o animal começou a galopar cada vez mais devagar, desacelerando os passos corridos.
"Ela foi treinada assim desde filhote, por causa da princesa, quando ela ainda era uma criança." Allan dizia pausadamente, recuperando o fôlego no meio das palavras. "Então, para fazê-la parar de correr, é só acaricia-la. Viu?" Quando ele terminou de falar, a égua já estava quase parada, andando bem devagar.
"Você poderia ter me dito isto antes. Eu poderia ter me machucado!" Eu estava ainda mais ofegante. Bem mais, gaguejando tanto que quase chegava a cuspir a palavra quando finalmente conseguia dize-la.
"Celina, não ficasse montada nem cinco segundos nela."
"É tempo suficiente para eu cair."
"Mas não caiu. Agora deixe de drama." Ele puxou pra si as rédeas da égua, ficando no controle dos dois cavalos.
Respirando o máximo de ar que podia, a boca entreaberta, me permiti acalmar.
O céu agora estava mais escuro, o sol fugindo de nós de uma vez. Nuvens grossas e cinzentas anunciavam a tarde chuvosa que teríamos, e já imaginava-as desmancharem em lágrimas sobre nossas cabeças. E imaginei como seria relaxante sentir a água gelada na minha pele.
Só sabe quando há sol ou chuva se tiver limpando os vidros das janelas, ouvi a voz de Allan de repente em minha mente, quebrando meus pensamentos. A sua sorte é que têm caras como eu para tira-la de dentro daquele castelo.
Observei Allan pelos cantos dos olhos, o rosto sério mirando algo a nossa frente, nossas pernas as vezes se encostando pela proximidade dos cavalos, sem nunca deixar de soltar a corda que prendia o meu.
Abaixei a cabeça, um sorriso amargo se abrindo no meu rosto. "Você nunca precisou de mim, não é?" Olhei para as orelhas da égua que as vezes se agitavam. E para os pelos longos cor de caramelo, voando no vento. Olhava para qualquer coisa, menos para ele. "Consegues guiar mais que um cavalo sem problema algum. A minha ajuda nunca foi o caso."
Ele deu um suspiro longo, cansado. Cheguei a esperar mais um pouco por sua resposta, mas os próximos minutos foram tomados apenas pelos sons dos cascos chocando-se ao solo.
"Isto é bom, não é?" Me assustei quando ouvi-o falar novamente, encarando-o. "Se sentir livre."
Enruguei a testa o máximo que pude, as sobrancelhas juntas, olhando-o inclinar a cabeça pro alto e fechar os olhos, sentindo o vento lhe assoprar o rosto enquanto os cavalos cavalgavam agora mais animados, mais rápidos.
"Por que me chamasse aqui?" Não resisti perguntar, talvez um pouco fria, porém eu estava realmente começando a gostar daquele passeio.
"Porque de todos os outros, você me parecia a mais infeliz. Parecias presa em um mundo que não era seu. E eu queria que você sentisse um pouco disso, de liberdade." Ele manteve seus olhos fechados até então, sem trocar de posição, e quando ele me mirou novamente, os olhos verdes me fitando intensamente, eu praticamente congelei. "Eu queria que você entrasse no meu mundo."
E ele manteve o seu olhar por um tempo sob os meus, e tive a certeza de que eu poderia cambalear e escorregar do cavalo a qualquer momento, quando ele soltou mais um daqueles sorrisos marotos, voltando a ser o Allan que eu conhecia. "Então, bem-vinda a Allandia."
Retribui um sorriso sem graça, as bochechas ardendo. "Me mostre esse mundo, então." Levantei o queixo, disfarçando a vergonha que havia me consumido, fingindo desafia-lo.
A chuva de repente resolveu fazer parte daquele instante, deixando apenas algumas gotas tímidas pingar minha testa.
"Com prazer." Ele sorriu, ignorando a chuva que engrossava a cada segundo, largando as rédeas e agarrando a minha mão antes de começar a correr com o cavalo. E desta vez eu não gritei. Na verdade, estava gargalhando junto a Allan, e comecei a entender o que ele dizia. Eu sentia que poderia ser quem eu quisesse naquele momento. Um momento que, alias, não durou muito quando vi Kaylon rindo ao lado de uma garota, a selecionada, o rosto ficando sério assim que botou os olhos em nós dois. E em questão de segundos, todos pareciam não estar mais felizes, eu parando de gargalhar e Allan seguindo meu olhar, acabando por deixar apenas um sorriso fraco após as risadas calorosas. E a garota tratou de se abraçar ainda mais ao príncipe, amassando o vestido verde-esmeralda que se misturava ao tom do gramado molhado.
"Celina?" Seus lábios se moveram silenciosos, o olhar confuso. Ele pigarreou alto, voltando a sorrir, olhando agora somente para Allan. "Que bom que preparasse os cavalos! Lady Katherin tinha comentado agora mesmo que queria conhece-los."
Vi Allan virar a cabeça rapidamente em minha direção antes de descer seu cavalo, erguendo a mão para mim assim que alcançou o chão. "Sempre disponha, senhor."
Com uma troca de acenos, Allan, ainda segurando minha mão, desviou-se deles e seguimos nosso caminho de volta ao estábulo, molhando as botas na grama úmida em nossa correria para não nos encharcamos mais ainda.
"Desculpe, Allandia é muito disputada." Ele começou a dizer, desacelerando os passos conforme chegávamos a estrutura de madeira novamente, segurando os joelhos com as mãos. Voltamos a olhar para os cavalos de longe, fitando o príncipe Kaylon e Lady Katherin darem risadas, tendo dificuldades para montar por conta da chuva que deixara o chão escorregadio. "É, acho que sim." Recordei aquela manhã quando ainda estava na cozinha, Miranda bufando e chamando a garota de piranha. E comecei a rir, imaginando como ela reagiria ao ver aquilo.
Você não sabe o quanto ela é, Miranda, pensei, olhando para a selecionada que fazia o possível para tocar o príncipe enquanto estavam nos cavalos.
Quando voltei a olhar para Allan, ele já não mais prestava atenção nos dois lá distantes. Ele olhava pra mim.
"Mas vem cá, Allan gracinha? Sinceramente, meu discurso de você ser um louco é muito melhor e tem muito mais a ver com você." Sorri, dando-lhe um soquinho no ombro.
"Nem vem, Allan gracinha vence todas." Seu sorriso largo veio a tona novamente, abrindo a porta dos fundos, ao lado do estábulo, para revelar uma escada comprida e estreita que dava acesso a cozinha, sem nunca parar de falar sobre como ele estava certo, virando a cabeça para trás enquanto subia as escadas na minha frente. "São argumentos bem convincentes, não acha?"
"Não. Pra mim, você sempre será um louco." 
 
                                                                                        

Demorei? Sim, muito ou claro? haha Olha, juro que não faço de propósito! Mas olhem pro lado bom: Fiz um capítulo mais grandinho U

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.



Demorei? Sim, muito ou claro? haha Olha, juro que não faço de propósito! Mas olhem pro lado bom: Fiz um capítulo mais grandinho U.U 

Agora vem cá, quero saber como tá aí com o lance dos personagens. Tão shippando muito? E o Allan? Aprovado ou o príncipe ainda é o "rei" dos garotos fofos e perigosamente gostosos? Me contem!! Quero saber de tudo!
#Acaçadadosselecionados
 





Projeto PrincesaOnde histórias criam vida. Descubra agora