O que ela fazia com ele? Por que ela estava com ele? Minha mente rodopiava de perguntas, uma risada suave e melodiosa me trazendo novamente para o campo largo do castelo, a chuva batendo em meu rosto violentamente, porém de uma forma relaxante. Parecia que, por mais que a água quisesse me ferir, eu continuava a aprecia-la de braços abertos. E Celina era como uma chuva.
"Há séculos que eu não faço mais isso!" Katherin voltou a rir, me arrancando de vez de meus pensamentos. "Não chove muito em Calgary, sabe? Já não me lembrava como isto era bom." Ela inclinou a cabeça para trás, querendo sentir mais das pesadas gotas d'água lhe escorrer na pele. Imitei seu gesto, os rastros que as gotículas deixavam no pescoço me fazendo cócegas.
"É, eu também."
Não sei dizer por quanto tempo ficamos parados em silêncio. Algo em mim sentia vontade de sair de lá. Talvez ir pra cozinha, checar como tudo estava, como ela estava. Mas não conseguia pensar em nenhuma desculpa boa o suficiente para sair correndo daqui e ir atrás dela. Não tinha nem uma razão pra realmente pensar na Celina.
Ela me faz sentir bem? Argumento ruim, pense em outro. Me sinto confortável perto dela? Oh, Kaylon! Como és bom nisso! Vá falar pra ela então que você se sente confortável perto dela.
"Você deveria falar." Katherin voltou a dizer, parecendo decepcionada. Franzi a testa, tentando me lembrar se havia dito aquilo em voz alta. "Sabe, em encontros, as pessoas tentam conversar. Se conhecer." Ela sorriu, olhando para suas mãos que acariciavam o pelo encharcado da égua. "Sei que não sou muito interessante, mas imaginava algumas perguntas. Passei a manhã tentando pensar em boas respostas para elas, seja lá quais irias fazer. Mas não pensei em nada para isto."
Fechei meus olhos com força, fingindo que isto bastaria para eu voltar no tempo até a parte em que eu me lembrava que estava em um encontro. Ou ao menos concertar a cagada que estava fazendo.
"Me desculpe," comecei sem pensar direito no que poderia dizer, voltando a apertar os olhos. "acho que estou-"
Pense em algo bom agora, gênio. Não estrague as coisas mais ainda.
Continuei com os olhos fechados. Não enxergava mais absolutamente nada, sentindo os músculos dos olhos doerem pela força.
Quando criança, tinha mania de ir para o escritório de meu pai a noite, e sempre encontrava ele sentado em sua mesa, no escuro, pensando. E eu então sentava ao seu lado, encarando meu reflexo nas janelas. Era mais fácil pensar na realidade quando estava na escuridão. E eu precisava encontra-la agora.
"Acho que estou perdido." Disse por fim. Senti dedos gelados tocarem minha mão, e abri meus olhos para encontrar os dela, verdes, vivos, me fitando. "Sinto muito. Planejava algo melhor para esta manhã. Algo melhor pra você."
"Eu não disse que não estava gostando do encontro." Eu não olhava mais pra ela. Encarava nossas mãos, os dedos se entrelaçando uns nos outros aos poucos, timidamente, parecendo se fundirem a cada toque. "Podemos continuar em silêncio. Seria um encontro bem diferente, uma coisa nova." Voltei a mirar seu rosto, os olhos parecendo ganhar ainda mais brilho. "Uma coisa só nossa. Nosso encontro silencioso." Ela esticou os lábios em um sorriso, nossas mãos agora totalmente juntas, grudadas como uma só. "Isto me parece melhor do que as perguntas."
Deixei escapar uma risada fraca. Estávamos no meio do nada, na chuva, e não havíamos trocado nenhuma palavra desde o jardim, quando ela mencionou as corridas de cavalo que havia visto eu participar, e mesmo estando montados nos cavalos, estávamos parados. Era o pior encontro que alguém poderia ter, mas para Katherin, o fato de estarmos aqui, juntos, já tornava tudo mais bonito.
Ela merecia algo melhor que isto.
"Vem," segurei sua mão com mais força, puxando as rédeas do meu cavalo com a outra que estava livre, sentindo já uma brisa se formar conforme o cavalo acelerava sua corrida. "conheço um lugar melhor para ficarmos em silêncio." Tive o cuidado de olhar para ela enquanto dizia isso, a chuva fazendo com que meus olhos ficassem entreabertos, mas mesmo assim consegui ver o momento que ela arregalou os seus, piscando os olhos várias vezes quando os pingos d'água atingiram seu rosto.
Desacelerei o animal assim que chegamos na estrebaria, porém não havia mais ninguém aguardando o retorno dos cavalos. Mais uma vez, o rosto alegre de Celina junto ao tratador de cavalos surgiu na mente. Saltei do cavalo, batendo os pés com mais força no chão, desejando que a pressão dos sapatos contra a areia desviasse meus pensamentos dela.
Não pense nela, não pense nela, não pense nela. Recitei as palavras para mim, agarrando a mão de Katherin e avançando os passos para sair logo de lá, porém voltei a recuar assim que olhei para a entrada mais próxima. Uma porta pequena e desgastada de madeira que levava até a cozinha onde os criados costumavam ficar.
"Onde vamos?" Katherin tinha a voz ansiosa, encarando aquela porta com o mesmo temor que eu. A única diferença era que ela não sabia o que esperar ao passar daquela entrada. Eu sim.
"É surpresa." Suspirei com calma, abrindo então a maçaneta.
O lugar escuro deixava a garota ainda mais assustada, a escada rangendo e protestando a cada subida nossa nos degraus. Mais uma porta, e eu já estaria diante ao corredor dos dormitórios dos funcionários.
Coloquei a mão envolta da maçaneta e a girei, liberando nosso acesso.
Eles não estão aqui. Olhei de uma ponta a outra da ampla passagem iluminada,
completamente vazia. Sorria Kaylon, você está com sorte.
Puxei Katherin junto a mim mais uma vez, andando em passos grandes e rápidos, ainda temendo escutar vozes ou risadas por trás de alguma porta.
Estávamos já dobrando o corredor, indo em direção a cozinha, quando ouvi a voz de uma mulher se aproximar de nós.
"Não estamos muito longe!" Exclamei, alto, para Katherin, que deu um salto ao meu lado. Queria abafar qualquer outro som que não fosse minha voz, elevando o máximo que conseguia, praticamente berrando. Só que Katherin não foi a única que se assustou, roupas voando para todos os lados do corredor, e uma criada assustada caída no chão. Larguei meu braço de Katherin e me abaixei, ajudando a garota a recolher os panos.
"Você tá legal?" Ela concordou nervosa com a cabeça, a touca rendada balançando pra trás e pra frente rapidamente, quase escorregando do cabelo. Estendi meu braço para ela, puxando-a quando sua mão segurou a minha. "Miranda, não é?" Perguntei, reconhecendo a criada. A garota arregalou os olhos quando ouviu seu nome, concordando, me fazendo recordar a noite em que conheci Celina, um sorriso se formando em meus lábios automaticamente.
Não pense nela, idiota.
Voltei a ficar sério, a criada franzindo a testa.
"Passar bem." Entreguei as roupas sujas para a garota, saindo de lá apressado com Katherin ao meu lado.
Minha cabeça estava uma confusão, e eu não tinha consciência de mais nada. Apenas andava, saindo da cozinha e caminhando pelos corredores, subindo degraus, ignorando quem mais passasse por mim. Era o dia mais estranho da minha vida, e provavelmente de Katherin também.
"Me desculpe." Me ouvi dizer mais uma vez. "É o meu primeiro encontro, e eu realmente não sei o que fazer ou falar. Tudo o que consegui até agora foi arruinar tudo." Continuei, sem nem saber se ela estaria ainda do meu lado, mirando o caminho a minha frente sem deixar de olhar pra outra direção. "Mas, se você ainda quiser dar uma chance pra mim," puxei uma escadinha de metal presa ao teto, subindo ligeiro até o último degrau. Aspirei o cheiro já familiar, o dia chuvoso deixando o lugar achatado muito úmido e gelado, fazendo com que os livros e objetos ali deixados não parecessem empoeirados demais. "eu prometo que o restante desta manhã será incrível."
Finalmente olhei para trás, agora já quase no centro do sótão, observando Katherin subir as escadas e fitar o lugar, correndo seus olhos verdes por entre a pilha de sapatos abandonados em um canto.
"Não brinca," Ela pegou na mão um dos pares, o rosto indignado, apontando o sapato depois para mim, parecendo prestes a taca-lo na minha cara. "esse é o tamanco da sua avó!" Ela exclamou, fascinada, a boca aberta. "É a coisa mais linda que já vi na minha vida!" Katherin devolveu o sapato na pilha, colocando-o com o maior dos cuidados, até que avistou mais um, desmoronando o monte para alcança-lo. "Oh meu deus, olha este couro!" Ela voltou a devolver, analisando o resto da pilha. "Eu não entendo como alguém pôde largar eles aqui em cima."
Me agachei ao seu lado, deixando Katherin à vontade para olhar as coleções. "A maioria das coisas foram dos meus avós. Não sei por que meus pais não se livraram disso ainda." Katherin me encarou feio, e pude até imaginar ela dizer Não fale assim dos meus bebês. "De qualquer forma, gosto de vir aqui quando quero ficar sozinho." Dei de ombros, flagrando-a arregalando os olhos claros, desviando o olhar e abaixando a cabeça timidamente.
"Quer dizer então que sou a primeira pessoa que entra em seu esconderijo?" Eu ri em resposta, balançando a cabeça positivamente, porém sua risada tirava toda minha atenção e eu nem mais sabia o que fazia. "Obrigada." Ela voltou a falar assim que os risos se cessaram, o sorriso grande ainda estampado no rosto. Seus dedos, agora já não mais tão gélidos, tocaram de leve os meus, nossas mãos se juntando agora mais rápidas, como se já tivessem se acostumado com o toque de cada um. Seus olhos que sempre me desconcertavam, agora me traziam mais pra dentro daquele verde, hipnotizando, não me deixando pensar em mais nada. Nem mesmo Celina existia mais na minha mente. Era apenas Katherin e eu. "Esse foi o melhor encontro silencioso que já tive"
(Me sentido a mãe do Chris, Rochelle) VOLTEEEEEEEEI! hahaha
Tá, eu sei. Demorei. Demorei muito. Demorei pra caramba. Demorei mesmo! Mas deixem eu me defender: Este capítulo me dava medo! É sério! Tinha medo e realmente não sabia como fazê-lo. (ah, mas por que, Suéllen?) Eu não sei explicar! E sim, tô arrasando aqui na minha defesa, convenci todo mundo. Mas sabem aquela sensação que bate no peito e você teme estragar tudo? Eu sentia isso a cada minuto que abria o Word. E embora não completamente satisfeita, consegui terminar o/ Espero que tenham gostado ^^
E pra variar, quem aí já achou seu selecionado (a)? A caçada continua!
#ACaçadaDosSelecionados
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Projeto Princesa
FanfictionVocê já imaginou como seria viver no sótão de uma velha escolinha, escondida de tudo e todos por toda a vida? Essa era a realidade de Celina, uma garota que fora abandonada pelos pais e acolhida por uma desconhecida, que por sinal, era professora. ...