Pratos limpos

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Tsukishima

- Tadashi - chamo, mas ele está tão imerso em seus pensamentos que não ouve minha aproximação. Observo por um momento, a silhueta familiar de Yamaguchi contra o crepúsculo, enquanto ele procura pela chave do portão da casa. Não fiquei surpreso quando Kageyama me disse que ele ainda morava no mesmo lugar; há conforto na constância, e Yamaguchi sempre valorizou as raízes que o ligam ao passado.

Finalmente, ele encontra a chave e levanta os olhos, surpreso ao me ver.

- Tsukishima? O que você está fazendo aqui? - sua voz traz um misto de emoção e cautela.

- Vim ver você - respondo, a sinceridade em minha voz mais nítida do que pretendia. - Kageyama me contou que você ainda morava no mesmo endereço.

Ele abre o portão, um gesto de boas-vindas que parece carregar mais significado do que as palavras poderiam expressar.

- Entre - diz ele, um sorriso hesitante se formando em seus lábios. - Vamos conversar.

Passo pelo portão, sentindo uma estranha sensação de retorno. O jardim, embora um pouco descuidado, ainda tem os mesmos canteiros de flores que costumávamos cuidar juntos. Tudo aqui fala de um passado compartilhado, de dias despreocupados e sonhos juvenis.

Sentamos nos degraus da varanda, e Tadashi parece um pouco ansioso, ainda mais depois que percebe que os pais estão ausentes. "Ele está nervoso por estar a sós comigo", penso, observando-o discretamente.

- Está tudo bem? - pergunto, quebrando o silêncio que se instalou entre nós.

Ele assente, mas há uma hesitação em seus olhos que não passa despercebida.

- Sim, só não esperava que... - ele começa, mas sua voz desvanece.

- Que estaríamos sozinhos? - completo por ele, tentando aliviar a tensão.

- É, isso - ele confirma com um sorriso fraco.

- Tadashi, se estiver desconfortável, podemos ir a algum lugar público - sugiro, querendo que ele se sinta à vontade.

- Não, está tudo bem. Na verdade, é bom ter esse momento, só nós dois - diz ele, ganhando confiança. - Há tanto que eu queria falar, mas nunca tive a chance.

Encorajado por suas palavras, decidi me abrir também.

- Eu também tenho coisas a dizer, coisas que guardei por muito tempo - admito, sentindo um nó se formar em minha garganta.

O vento sopra suavemente, trazendo consigo o aroma das flores do jardim. É um lembrete da passagem do tempo e das oportunidades que ele traz.

- Então, vamos falar - diz Tadashi, virando-se para mim com determinação. - Vamos colocar tudo em pratos limpos.

- Sobre aquele dia... - hesito um pouco, mas percebo que não é esse o momento para dar para trás. Sinto meu rosto queimar, já imaginando o quão vermelho devo estar. - Eu não devia ter te deixado sozinho, devia ter ficado para conversarmos.

Tadashi me olha com uma expressão suave, seus olhos refletindo uma mistura de surpresa e alívio.

- Tsukishima, você não sabe como eu esperei por esse momento - ele confessa, sua voz baixa, mas firme. - Depois daquele dia, eu fiquei confuso, não sabia o que pensar ou sentir.

- Eu também fiquei confuso - admito, encontrando coragem nas suas palavras. - E me arrependo de não ter enfrentado isso com você. Deixei que o medo e a incerteza me afastassem.

Ele assente, compreendendo.

- Mas você está aqui agora - diz ele, um sorriso tímido surgindo. - E isso significa mais do que você imagina.

- Eu quero consertar as coisas, Tadashi - digo, sentindo uma determinação crescente. - Não quero que um mal-entendido do passado defina o que temos.

- Nem eu - ele responde, estendendo a mão. - Vamos começar de novo, como amigos?

A sugestão de Tadashi para sermos apenas amigos me incomoda mais do que esperava. Por anos, guardei o desejo de sentir novamente a sensação da boca dele na minha, de explorar o que aquele breve contato poderia ter se transformado.

- Não posso ser seu amigo - digo, encarando seus olhos. Vejo seu rosto, antes repleto de expectativa, passar pelo choque e, em seguida, assumir uma expressão triste.

Ele retira a mão lentamente, e eu posso ver a confusão se formando em sua mente. Antes que ele possa se afastar ou murmurar qualquer palavra, eu fecho a distância entre nós e o beijo.

É um beijo suave, hesitante no início, mas que carrega toda a sinceridade e os sentimentos reprimidos ao longo dos anos. Dessa vez, não é um selinho rápido; é um beijo em que disputamos para encontrar o sabor um do outro. Quando nossos lábios se separam, o silêncio que nos envolve é carregado de significados e possibilidades.

- Eu... - Tadashi começa, mas para, claramente lutando para encontrar as palavras certas.

- Eu sei que é inesperado - digo, minha voz firme apesar da incerteza que sinto. - Mas eu precisava que você soubesse. Não posso fingir que não há mais nada entre nós além de amizade. Levei um ano para perceber que devia ter te ouvido naquele dia, que devia ter ficado, e muitos anos até finalmente ter coragem de te retribuir.

Tadashi me olha com uma intensidade que nunca vi antes. Seus olhos estão cheios de emoções conflitantes, mas há também uma faísca de algo mais - algo que se parece com esperança.

- Tsukishima, eu... - ele tenta novamente, sua voz mais firme desta vez. - Eu pensei que esse momento nunca chegaria. Que você nunca...

- Que eu nunca o quê? - pergunto, encorajando-o a continuar.

- Que você nunca me veria da mesma forma que eu vejo você - ele confessa, e é como se uma barreira invisível entre nós desmoronasse.

- Tadashi, eu sempre te vi - digo, segurando suas mãos entre as minhas. - Só me faltava a coragem para admitir o quanto você significa para mim.

Ele sorri, um sorriso que ilumina toda a varanda e aquece meu coração.

- Então, o que fazemos agora? - ele pergunta, com uma nota de brincadeira em sua voz.

- Agora, nós exploramos isso juntos - respondo, sentindo uma onda de alívio e alegria. - Sem medo do passado ou do que os outros possam pensar.

Fim?

Recomeço - TsukiyamaOnde histórias criam vida. Descubra agora