ᴄɪɴᴄᴏ-ʀᴇᴄᴏᴍᴇᴄ̧ᴏ

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Minha casa estava um completo caos, havia roupas pelo chão e brinquedos por toda parte. Me dava até um aperto no coração guardar os brinquedos dos meus irmãos, já que isso era o último rastro deles. Ao varrer a casa, reparo em cada detalhe do lugar. É muito estranho olhar ao redor e não ver meus pequenos rindo ou minha mãe lendo algum livro clássico, como Machado de Assis, e usando seu coque e roupas impecáveis. Por mais que tivesse uma nova amiga que fosse quase tão bagunceira quanto meus irmãos, eles ainda faziam falta.

Desde o ocorrido, a casa estava de cabeça para baixo. Não faço ideia de como minha mãe mantinha tudo sempre impecável. Me vem uma tristeza ao varrer o chão e lembrar das vezes em que não valorizei seu trabalho. Me sinto muito ingrata por nunca a ter agradecido por tudo. Depois de horas arrumando cada canto da casa, percebo que minha nova companheira andava vasculhando o cesto de lixo.

— Meu Deus, eu acabei de limpar aí!

Assim que a repreendo, seu olhar se torna envergonhado e ela começa a choramingar.

— Ei, desculpa, tá? Eu não queria brigar com você.

Me agacho e faço carinho em sua cabeça.

— Você tá com fome? Quer comer alguma coisa?

Selena abana o rabo e late algumas vezes, então levo isso como um sim. Escoro a vassoura no canto e vou em direção à geladeira, que estava praticamente vazia, com apenas metade de um doce de goiabada e embalagens vazias. Droga, era óbvio que a comida não duraria para sempre. Eu precisava guardar suplementos.

Não gosto de colocar coleira nela, já que na última vez que fiz isso ela saiu me arrastando. Então, prefiro deixá-la correr livremente e cheirar cada canto das estradas esburacadas dessa cidade. Ainda não me acostumei ao silêncio das ruas, então tento chegar o mais rápido que posso, o que é difícil já que Goiânia é enorme e quase não saia de casa , então não sabia me localizar nessa cidade e as chances de me perder no meio do caminho eram grandes. Enquanto andava gostava de sentir a brisa suave batendo em meus cabelos e pensando em como meus pequenos amariam minhas novas descobertas, eles adorariam ver a casa chique que sempre falei que um dia morariamos todos juntos nela ou o meu novo animal de estimação ,eles sempre pediam um e a mamãe nos enrolava falando que um dia comprariam um.

Não pretendia andar mais então entro no primeiro mercado que vejo, no qual tinha um cartaz visualmente poluído,, com frases em verde e neon e fotos de diversos produtos, acredito que o local estivesse indo a falência, porque praticamente tudo estava em promoção, apesar disso, o mercado era bem organizada e com bastante diversidade de produtos.

Eu pretendia pegar bastante coisas, então acredito que ninguém se importaria se eu pegasse um carrinho emprestado,me sinto muito rica ao poder pegar qualquer produto sem olhar o preço. Como precisava armazenar comida, peguei o máximo de enlatados possíveis,também peguei alguns doces, pacotes de ração e produtos de limpeza e higiene. Quando estou saindo me deparo com sementes de todos os tipos e me dou conta de que se quero sobreviver precisaria aprender a plantar então pego todos os pacotinhos.
Eu assobio uma vez para chamar Selena, que estava correndo atrás de seu próprio rabo .

—Vamos garota-  levantando o braço fazendo um gesto chamando-a para vir até mim
Ela para de brincar no mesmo instante que a chamo e se aproxima de mim latindo e correndo de um lado para o outro.

O carrinho pesa muito mais do que eu imaginava e foi um sacrifício arrastá lo por todo o caminho de volta para casa, quando cheguei na rua de casa já estava tão cansada que sentei na calçada, após muito tempo ali sentada tomei coragem para me levar.

                                [...]

Depois de muito custo, levei as coisas para dentro da despensa, o que não foi fácil, porque Selena decidiu se deitar na parte de baixo do carrinho e não  quis mais sair de jeito nenhum. Após guardar tudo percebo uma lata de legumes que me chama atenção, ao abrir sobe um cheiro forte e desagradavel, se o gosto for tão ruim quanto o gosto eu com certeza não ia comer aquilo, eu aproximo aquilo da minha boca na intenção de ingerir mas odor era tão azedo quem me vem um refluxo e me recuso a comer .Ao invés disso  pego minha bolsa e coloco todos os artigos de agricultura.

Nunca me imaginei plantando nada, mas não deve ser difícil assim. Vou ao canteiro central que fica em frente ao semáforo de casa, há algumas árvores pequenas e  flores murchas, a pá  era azul com um cabo de madeira extremamente pesado, sinto certa dificuldade ao levantá-la e até tento bate-la no chão algumas mas minhas mãos doem e minha ferida arde . Me sinto muito inútil, sou fraca demais e mal consiguiria sobreviver,eu daria sorte se sobreviver mais uns três meses sozinha nesse mundajoelho no chão de cabeça baixa ,após alguns segundos sentada algo voa em minha direção.

—Ei- grito quase que de imediato.

Era Selena que cavava incansavelmente, vendo sua inocência e determinação não pude deixar de sorrir.

—Ok, garota,vamos tentar de novo- falei tentando consolá-la ,mas o comentário servia mais para mim mesma.

Agora com um pouco de ajuda ficou bem mais fácil, juntas cavamos uma horta enorme, levou algumas horas, mas plantamos uma vasta diversidade de legumes e flores. Depois de alguns momentos admirando nosso trabalho acabou anoitecendo e nós nos deitamos na grama admirando as constelações.

Então ali deitadas admirando a imensidão do universo ,eu me senti  parte de algo maior, como se as estrelas fossem as únicas testemunhas da nossa existência.




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