Dois | Ross Enterprises

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New York, 7:30 A.M.

Mesmo a caminho do meu primeiro dia de trabalho na empresa nova, comecei a minha manhã como quase todos os outros dias em Nova York: na cafeteria de Jasper. Para mim, estar ali significava servir bebidas quentes e limpar mesas sujas, mas nesse dia eu estava ali como cliente. Era minha vez de estar bem vestida e com pressa para não me atrasar para o meu trabalho corporativo.

— Bom dia! — disse animada ao chegar minha vez depois de esperar na longa fila. Jasper, meu ex-chefe, mal me reconheceu.

— Bom... dia! — ele respondeu surpreso ao perceber quem era.

O homem loiro de olhos claros deu a volta no balcão e me deu um leve abraço. Ele não encarou o meu pedido de demissão muito bem, sabia que com uma funcionária a menos as manhãs caóticas na sua cafeteria ficariam piores ainda. Mas ele também sabia bem o que estava fazendo em Nova York.

— Bom dia, amor — Jasper tentou dar um beijo na bochecha de Alessia, mas ela desviou.

Eles estavam no meio de uma de suas brigas que duravam dias, às vezes até semanas. E dessa vez foi sério, o café inteiro testemunhou. Era uma quarta-feira à tarde quando Alessia aproveitou a sua hora de almoço para continuar uma discussão que começou de manhã no apartamento do casal.

Eu achava engraçado, mas, ao mesmo tempo, confuso. Suas brigas nunca eram sobre coisas sérias, eram sempre questões como ciúmes, esquecimento de datas importantes, mal-entendidos. A falta de comunicação deles era intensa e era questão de dias para voltarem a ser como se nunca houvesse uma briga para começo de conversa. Agora que Alessia morava comigo, talvez essa volta demore mais do que o normal.

Paguei pelo meu café e decidi deixar os dois a sós. Fui acompanhada do meu copo quente para o lado de fora observar o movimento da rua. Foi aqui que tudo começou, foi aqui que, através do Jasper, conheci e virei amiga de Alessia. Ela sempre estava aqui para tomar café da manhã no começo dos meus turnos e sempre a encontrava no final do dia esperando Jasper para ir embora. No meio tempo, ela atravessa a rua para seu emprego no glorioso prédio da Ross Enterprises.

Na verdade, foi do outro lado da rua que conheci Alessia. Gostaria de dizer que foi um encontro por acaso, mas foi exatamente o contrário. Eu tinha o endereço da Ross Enterprises desde que cheguei em Nova York e foi para cá que vim assim que desembarquei do avião. Foi uma das primeiras pistas que aquele cartão postal me proporcionou.

Tudo começou quando minha mãe, em mais uma das suas visitas ao hospital para uma sessão de quimioterapia descobriu que seu diagnóstico de câncer era terminal. Desde esse dia, sabendo que teria apenas alguns meses de vida, minha mãe começou um movimento na sua vida para resolver todas as pendências antes de partir desta terra. Minha irmã Lauren considerava esse esforço da minha mãe mórbido, já eu achava honroso.

A apoiei nessa sua jornada desde o começo, e a primeira etapa foi com a minha tia. Minha mãe e sua irmã Tina tinham diferenças grandes desde crianças e depois que a mãe delas faleceu, tudo piorou. Tina não queria saber da família, não quis ajudar com o velório da minha avó Townes, não quis nem saber das coisinhas que herdou dela. "Raven, nada que essa pobre miserável tenha me deixado me interessa" foi como ela assinou a última carta que enviou para minha mãe.

Quando finalmente desistiu do contato com a Tina, minha mãe quis usar o restante da sua pensão para pagar a sua pequena dívida com o mercadinho do bairro, resultado de todas as suas compras fiadas. Ela também fez uma boa doação para a igreja, um dos seus lugares favoritos no mundo. Desde que me lembro, minha mãe sempre foi uma pessoa muito religiosa, e não teria diagnóstico nenhum que a faria desistir da sua fé em Deus. Eu achava admirável, mas era difícil para mim acreditar que alguém tão poderoso e amoroso deixaria uma filha ver a sua própria mãe morrendo aos poucos.

Ever Since New YorkOnde histórias criam vida. Descubra agora