Capítulo 11

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Acordo sobressaltada, com o som estridente da voz da minha mãe ecoando pelo quarto. O pânico me consome enquanto meus olhos ajustam-se à escuridão, e minha mente tenta compreender a cena diante de mim.
- Eu te encontrei, sua inútil! Achei onde você estava se escondendo, achou mesmo que tinha o direito de me desobedecer, depois de tudo que eu fiz por você! Ela grita, e seu rosto se contorce de raiva. Eu tento me levantar, mas estou paralisada pelo medo. Meu coração bate descompassado, e meu corpo se recusa a responder.
Procuro desesperadamente por Seo-jun, o único que poderia me ajudar. Olho ao redor e o vejo de cabeça baixa, sentado no canto do quarto. Sua expressão está carregada de tristeza e culpa, e ele evita encontrar meu olhar. O que está acontecendo?
Meu olhar se fixa em sua mão, onde ele segura um maço de dinheiro. Ele me traiu? Não pode ser verdade. A dor da decepção se mistura ao terror que sinto, tornando difícil respirar, no final tudo que ele me disse não passou de uma mentira descarada. Todos se aproximam de mim com máscaras, dizendo serem amigos, mas no fim só querem o que eu tenho para oferecer e Seo-jun não foi diferente, ele comprou minha confiança, baixei minha guarda e mostrei minha vulnerabilidade.
Minha mãe se aproxima de mim com passos decididos e me puxa violentamente da cama.
- Você vai implorar e pedir para nunca ter nascido! Você é apenas um erro, um desperdício de vida, da minha vida! Ela rosna. Suas palavras cortam fundo, mais afiadas que qualquer faca, cravando ainda mais no meu peito algo que já estava tatuado desde do dia em que nasci, que eu era um erro.
Eu nem tento lutar para me soltar, suas mãos são como ferros, firmes e implacáveis. O desespero toma conta de mim, e sinto meu corpo ceder à impotência. Tudo o que eu queria era escapar, mas ao mesmo tempo aceitava que o sentimento de  encontrar um lugar seguro era ilusório, até Seo-jun se virou contra mim.
De repente, tudo começa a girar. A dor, o medo, a traição, tudo se mistura em um turbilhão de emoções insuportáveis. E então, como se um interruptor fosse acionado, a escuridão me envolve, e acordo de verdade, suando e ofegante, no quarto de Seo-jun. Meu coração ainda bate acelerado, mas estou sozinha, e o silêncio é ensurdecedor. Foi apenas um pesadelo.
Tento voltar a dormir, rodo de um lado para o outro, quero evitar meus pensamentos, o sonho é como um replay em minha mente, é como se eu revivesse ele e tentará encontrar uma forma de criar um final feliz para mim. Depois de tentativas fracassadas de voltar a dormir e pensar muito, decido levantar e ir até a cozinha beber um pouco de água. Abro a porta bem devagar, ela range um pouco, o som passaria despercebido se tivesse o barulho matinal, mesmo assim continuo o meu caminho com passos leves, evitando fazer mais barulho. Encho um copo de água, bebo um pouco mais da metade e o restante despejo na pia.
Sinto que perdi meu sono, preciso respirar um pouco, vou até a porta na esperança de que ela estivesse aberta, puxo a maçaneta e ela abre, para minha surpresa. Vejo uma figura sendo iluminada pela luz da lua, ela está parada olhando o céu que se encontra cheio de estrelas, é Seo-jun. Ele percebe minha presença, então me sinto na obrigação de iniciar uma conversa.
- Desculpe, não imaginei que estivesse com problemas de sono também, não quero atrapalhar. Me viro fechando a porta para entrar de novo mas, Seo-jun me chama.
- Ari! Ergo a cabeça e ele está me olhando, cesso o movimento da porta e o escuto.
- Tá tudo bem, sinta-se à vontade para ficar. Eu não vou ficar muito tempo aqui também. Ele volta o seu olhar para o céu.
Me direciono ao seu lado, sigo sua visão olhando as estrelas também. Ficamos um tempo assim, mas acabo quebrando esse voto de silêncio, algo dentro de mim diz que devo algumas explicações para Seo-jun, sinto um aperto no coração, que se não conversar com ele agora, não terei outra oportunidade.
- Seo-jun. Uma vergonha me toma, estou tão vulnerável prestes a revelar minha história, verdades que nunca contei a alguém antes e vou fazer isso com Seo-jun.
- Preciso te deixar a par do poço que você entrou. Continuo.
- Já disse que não tenho interesse em conhecer seu conto de fadas. Não sinta que tem a obrigação de me contar algo que não fique confortável. Seo-jun fala me interrompendo. Olho para ele, mas o olhar dele continua no mesmo lugar.
- Eu quero contar, se não for para você, vai ser para quem, você me revelou algo, me contou seu segredo, sua verdade. Deixe eu te contar a minha. Ele para e se vira para mim, não diz nada, vejo em seu olhar que ele quer que eu fale, ele quer me ouvir.
- Lembra no primeiro dia que saímos para comer, eu tinha te perguntado o motivo de ter se tornado modelo, você acabou não me dizendo nada e nem precisava, a pergunta tinha sido para mim mesma. Eu falei que não foi escolha minha. Seo-jun o motivo da minha mãe ter me permitido vir ao mundo, foi para ser um protótipo dela, uma boneca movida de acordo com suas vontades. Por muito tempo eu fui dada como morta para a sociedade, ela fingia que eu não existia, até ela ceder a pressão que as pessoas estavam colocando nela, queriam saber o que havia acontecido comigo, onde eu estava, havia passado anos e ela nunca revelará como se deu sua gravidez desde o parto. A partir daí ela encontrou o que precisava para achar algo útil em mim, comandar minha vida do jeito que ela queria, me tornar ela. Afinal já diziam que éramos parecidas, ela se convenceu disso também. Eu odeio me parecer ela, eu não sou igual ela. Nesse momento as lágrimas começaram a cair, não tive como conter. Tudo isso estava dentro de mim por muito tempo.
- Durante toda a minha vida fiz tudo o que ela queria, era obrigada a tratar as pessoas da pior forma possível porque segundo ela, eu era superior e se caso eu não a obedecesse, ela.... Evito tocar nesse assunto, o olhar do Seo-jun dizia que tinha me entendido, continuo desviando de seu olhar.
- Eu tinha medo dela, então não hesitava em obedecer ela, me colocava acima das outras pessoas, maltratava-as, por conta do medo que eu tinha. Eu me odiava por isso, eu diminuía a dor alheia, pra aliviar a minha. Todos tem seus monstros, mas eu não queria enfrentar o meu, não tinha coragem, pelo menos até você aparecer.... Seo-jun. Encontro seu olhar, ele me olha com pena e tristeza, nos olhos de Seo-jun vi algo que não esperava: uma compreensão profunda, quase dolorosa, que espelhava a minha própria.
O silêncio entre nós era palpável, cheio de palavras não ditas e emoções compartilhadas. Ele deu um passo à frente, reduzindo a distância que nos separava. Seu olhar nunca deixou o meu, e por um momento, parecia que ele podia ver todas as cicatrizes que eu guardava por dentro.
Então, sem dizer uma palavra, ele me envolveu em um abraço. Um abraço quente, seguro, e tão necessário. Senti suas mãos nas minhas costas, firmes, mas gentis, como se ele soubesse exatamente quanto conforto eu precisava. Eu me permiti relaxar em seus braços, deixando que algumas lágrimas escapassem, sentindo o peso da minha dor começar a aliviar, mesmo que só um pouco.
- Bom, pelo menos agora você tem uma boa desculpa para chorar nos meus ombros. Ele disse, a voz tingida de seu habitual sarcasmo.
- Estou aqui para salvar o dia, aparentemente. Seo-jun termina falando.
Não pude evitar um sorriso, apesar das lágrimas. Ele sempre sabia como tirar a seriedade do momento, de uma maneira que, surpreendentemente, trazia alívio.
Mas logo após essas palavras, senti seu corpo ficar tenso. Ele se afastou ligeiramente, o rubor subindo em suas bochechas.
- Digo, não que eu seja o herói ou algo assim. Ele murmurou, claramente envergonhado.
- Só... estou aqui, sabe?
Assenti, igualmente envergonhada, mas também tocada.
- Estou sabendo Seo-jun. Respondi sorrindo.
- Obrigada!
Ficamos ali, meio desajeitados, mas compartilhando um entendimento silencioso. E, de alguma forma, aquele pequeno embaraço nos fez sentir ainda mais próximos.
- Sua vez! Quer me contar agora por que virou modelo? Falo em tom animado.
- Quer dizer, eu já te contei duas vezes como acabei aqui, mas nunca soube a sua história.
Ele hesitou, claramente desconfortável. Eu podia ver a batalha interna refletida em seus olhos. Mas, eventualmente, ele soltou um suspiro e começou a falar com um sorriso que apareceu em seu rosto.
- Na verdade, meu sonho sempre foi debutar como músico. Revelou, com um toque de animação na voz.
- Eu e meus amigos tínhamos uma banda incrível. Era divertido! Passávamos horas ensaiando no quarto do.... Ele hesita mas não diz o nome da pessoa.
- Tentamos criar o som perfeito. Era caótico, mas de um jeito legal. Seus olhos brilhavam enquanto ele falava, a paixão evidente.
- Essa banda era com o Kim Cho-rong e os meninos? Digo curiosa.
- Não, aqueles caras não têm capacidade de criar algo delicado como uma música, são uns cavalões. Ele diz rindo.
- Estávamos terminando uma música que planejávamos lançar juntos. Era uma faixa especial, um presente para um dos nossos melhores amigos, pelo menos meu melhor amigo, Se-yeon. Nós tínhamos grandes sonhos de debutar juntos. Cada ensaio era um desafio, cheio de risos e brincadeiras. Aquela banda era nossa vida.
Mas então, à medida que ele continuava, a animação começou a desaparecer lentamente, substituída por um olhar mais sombrio.
- As coisas desandaram. Se-yeon se envolveu em algumas polêmicas, e as fake news e comentários maldosos começaram a surgir. Ele foi atrás de ajuda, e eu tentei desesperadamente estar lá para ele, mas não consegui fazer muito. Se-yeon acreditava que aquele idiota, outro amigo nosso, nem sei se posso chamar ele assim, poderia resolver a situação, com a influência que ele tinha, poderia desmentir essa história mal contada. Mas, por algum motivo, ele não atendeu suas ligações, ele não estava lá quando mais precisávamos de sua ajuda.
Seo-jun fez uma pausa, seus olhos agora sombrios e cheios de dor.
- Se-yeon não conseguiu alcançar, eles não conseguiram se falar a tempo. A única solução que ele encontrou foi tirar a própria vida. Ele não aguentava mais a pressão e os comentários maldosos. Eu não pude impedir, deixei ele ir. Cheguei a tempo de ver a multidão em volta de seu corpo, as sirenes, as luzes piscando, a pulseira caída. Ele fala olhando uma pulseira que tem em seu braço.
Meu coração apertou ao ouvir suas palavras. A profundidade da dor que ele carregava era evidente. Eu queria dizer algo, mas as palavras me faltaram.
- Depois disso. Continuou ele, com a voz baixa e olhos fixos no chão.
- Decidi que seguiria em frente, de alguma forma. Tornar-me modelo foi uma maneira de entrar na indústria e, eventualmente, alcançar o sonho de debutar e ficar famoso. É a única maneira que encontrei para honrar a memória dele e nosso sonho.
Ficamos em silêncio por um momento, absorvendo a tristeza compartilhada. Eu alcancei sua mão e a apertei suavemente, tentando transmitir algum conforto.
- Seo-jun, sinto muito. Eu... nem sei o que dizer. Ele sorriu, um sorriso triste, mas genuíno.
- Às vezes, não há o que dizer. Mas saber que alguém entende e está ao seu lado já é o suficiente.
Ele apertou minha mão de volta, e por um momento, o peso do mundo parecia um pouco mais leve. Ambos carregávamos nossas dores.
De repente, ouvimos uma voz atrás de nós. - Oh, estou atrapalhando o casal? Disse uma voz feminina, carregada de sarcasmo.
Nós dois nos viramos rapidamente, ainda de mãos dadas, e vimos a irmã de Seo-jun parada na porta, com um sorriso travesso no rosto.
- A-ah, não é isso. Seo-jun gaguejou, soltando minha mão imediatamente, o rubor subindo em suas bochechas.
- Go-woon, você realmente sabe como fazer uma entrada, não é?
Eu também me senti corar.
- Oi, Go-woon, acordada também! Disse tentando soar casual.
Go-woon riu, cruzando os braços.
- Relaxa, Ari. Estava só brincando. Mas é bom ver meu irmãozinho finalmente se soltando com uma garota.
Seo-jun revirou os olhos e deu um sorriso forçado.
- Claro, porque minha vida privada não seria completa sem a sua narração. Você tem algum comentário construtivo ou está aqui só para ser uma pedra no sapato, não deveria estar na cama hein?
Ela deu de ombros, ainda sorrindo.
- Alguém tem que te dar um empurrãozinho de vez em quando. Além de que vocês dois também não estão na cama ou no seu caso no sofá.
Go-woon olhou para nós com uma expressão ligeiramente mais séria.
- Vocês sabem que horas são?
Eu e Seo-jun nos entreolhamos, surpresos.
- Bem que eu imaginei, são quase duas da manhã, eu levantei para ir no banheiro e escutei vozes vindo aqui de fora, achei estranho e a curiosidade falou mais alto. Ela diz rindo.
- Pelo visto, vocês dois estavam tão envolvidos na conversa que nem viram o tempo passar. E se vocês não se importam, eu realmente gostaria de voltar a dormir.
Seo-jun deu um sorriso irônico.
- Dormir à essa hora? Parece perfeito. Vamos fingir que somos normais e façamos isso. Quem sabe, pode até ajudar a disfarçar o fato de que estamos aqui fora em plena madrugada.
Go-woon balançou a cabeça com um sorriso.
- Vocês são impossíveis. Vamos lá, antes que eu tenha que me preocupar com o café da manhã em vez de dormir.
Enquanto nos dirigimos para dentro, a atmosfera leve que Go-woon trouxe ajudou a aliviar o constrangimento. Apesar da hora avançada e do embaraço, eu sentia um alívio reconfortante em estar cercada por pessoas que se importavam e estavam dispostas a apoiar uns aos outros.

[...]

Em minha mente já na cama, ainda estava presa nas palavras de Seo-jun. A revelação sobre seu amigo que havia tirado a própria vida me deixou profundamente abalada. E quem será que é o amigo com o qual ele não quis dizer o nome ou até mesmo disse que nem dava para considera como um amigo? Será que estuda lá colégio? Quantas pessoas conhecem essa história do Se-yeon e porque nunca ouvi ninguém falar? Tantas perguntas. Parando para pensar, lembro-me do que a Soo-ha me disse quando estava apresentando o Seo-jun e o Su-oh, "melhores amigos que se distanciaram por algum motivo e ninguém sabe". Será que Su-oh é o tal garoto? Chega de perguntas não respondidas tenho que dormir, amanhã tento conversar com Seo-jun sobre.

Beleza Verdadeira PS: Eu Te Amo Onde histórias criam vida. Descubra agora