8 » 𝙲𝚊𝚙𝚒́𝚝𝚞𝚕𝚘

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—Sua idiota. Tudo bem não querer vir comigo, também não quero ficar perto de você mas se não vier vai acabar arrumando problemas com o diretor. A enfermeira contou a ele o que aconteceu e ele me encarregou de ficar perto de você e garantir que você fique saudável, alimentada, hidratada, essas merdas.—Ele diz tudo ainda com os olhos concentrados nos meus. Sua voz está baixa e calma, quase sussurrando, seu corpo alto ainda permanece inclinado sobre mim e sua respiração quente me arrepia.

—Por quanto tempo?— O encaro séria.

—Dois meses. Eu ter estado com você na enfermaria fez parecer que somos amigos, foi o que a enfermeira disse a ele.—Seus olhos estreitos parecem tentar desvendar meus pensamentos.

—Por que tudo isso? Duas semanas já seriam suficiente para garantir que eu estivesse saudável.— Pergunto ainda confusa.

—Achei que saberia. Bom, ouvi que você não tem um bom histórico, você já foi parar na enfermaria algumas vezes por passar mal e desmaiar, mas sempre foi sozinha ou com professores, pelo visto eles acabaram pensando que agora você tem um amigo. Ridículo, como podem pensar que eu sou amigo de alguém como você, desprezível.—Ele ri mas volta com seu rosto de indiferença.

—Merda. Vamos logo.— O empurro com raiva e saio a passos rápidos e firmes.

—Olha só, pisca-pisca. Acho bom você melhorar a forma como fala comigo, não se esqueça que a minha família é milionária!—Ele diz andando devagar atrás de mim com a sua voz debochada. Eu me viro.

—Haha, claro senhor. Vou me humilhar para você apenas porque você é milionário, vai pensando. Ser milionário não muda o fato de que você é um idiota!—Não minto, ele é um idiota e muito mais. Serafim pensa que só porque a família dele tem muito dinheiro significa que ele pode tudo.

—Cala a boca, sei que tenho muito mais dinheiro do que a sua família, inclusive eu poderia fazer com que seus pais perdessem o emprego e jamais conseguissem outro, então acho bom você fazer o que eu mando. É só uma dica.— Ele sorri de canto e me lança uma piscadela. Desgraçado, não sabe as merdas que está falando.

—Morre, Serafim. Não pense que eu vou ser como todos os seus amiguinhos interesseiros!—

—O que quer dizer com isso?—Ele pergunta parecendo realmente confuso. Nós paramos, lá vem outra discussão, isso já está chato.

—Eu não vou fazer merda nenhuma que você mandar só porque você tem dinheiro, inclusive eu estou cagando para todo o dinheiro que você tem.— Sorrio mandando um dedo do meio para ele, mostrando o quanto o dinheiro de merda dele me importa.—Os seus amigos podem te tratar bem, serem falsos e sempre obedeceram você mas eu não vou fazer nada disso, pouco me importa. Tendo dinheiro ou não, você e todas as pessoas desse lugar são uns babacas e só ligam para si mesmos, não se importam se estão machucando os outros ou não!—Jogo a verdade na cara dele e ele não parece nada contente com isso quando se aproxima e segura meus braços com força, seus olhar emana raiva e sei que está pronto para despejar toda essa fúria em mim.

—Fico tentando entender quem você pensa que é pra falar algo assim. Você não tem amigos, nenhum pelo o que eu saiba. Ninguém se importa com você, você está sempre sozinha, implorando e desejando que alguém chegue para te escutar e te entender. O problema é que isso nunca vai acontecer porque você não é interessante, você não é bonita, você não é divertida, engraçada, inteligente. Você não é nada.—Ele solta meus braços me encarando ofegante, pensando se é uma boa ideia continuar falando. Por favor, não continue.

—Come sozinha, ou se preferir, não coma. Acredite, ninguém se importa.— Foi sua última frase antes de sair andando e mandar um dedo do meio para trás. Não sei o que pensar.

—Seu babaca!!— Grito vendo ele ficar mais distante quando finalmente sinto as lágrimas salgadas descerem por minhas bochechas e a enorme vontade de gritar me consumir. Não, eu não posso, sou mais forte do que isso.

Me recomponho, seco meu rosto e engulo a vontade de chorar até não conseguir mais, não posso fazer isso, pelo menos não aqui. Me viro e sigo meu caminho para os dormitórios. Minhas mãos estão trêmulas e tropeço várias vezes enquanto subo as escadas mas eu paro assim que uma ideia nasce de meus pensamentos e preciso parar um pouco até decidir se devo ou não. Até que volto a subir, rápido, passando do andar dos dormitórios, eu continuo. Noto a minha falta de ar e a necessidade de respirar me faz ficar nervosa, sinto as lágrimas descontroladas caírem de meus olhos sem parar e a vontade de gritar me consome novamente. Quando finalmente abro a única porta no final da grande escada e seguro com força a barra de ferro que me mantém separada do alto do grande prédio e o precipício diante a mim, com as mais bonitas montanhas verdes e o vasto céu azul. Eu grito, grito de raiva, grito de tristeza, grito de dor.

Finalmente permito que as lágrimas desçam quando olho para cima e deixo de lado todos os pensamentos que me sufocam, todos os sentimentos que me consomem. Os ventos fortes deixam meus cabelos voarem devagar e eu respiro, finalmente sentindo o ar puro, o ar do verde que faz essas montanhas terem cor viva, o ar da água azul cristalina que brilha no lago atrás do internato, o ar das flores e folhas que preenchem as árvores de cor. Me permito ouvir os pássaros, me permito vê-los voarem livremente pelo céu azul e me permito sentir na pele o vento frio que me causa arrepios mas que me faz sentir liberdade, me faz sentir viva. Me sento no chão trazendo minhas minhas pernas para perto e as prendendo contra mim, me encolho para chorar sozinha apenas com a natureza que me cerca. Esqueço a existência do grande prédio que estou e passo o resto dos minutos cantarolando para que meu cérebro não me convença de que tudo isso é uma mentira e que eu sou de fato tudo o que afirmam.

A realidade dói, a verdade dói. Se ao menos meus pais estivessem vivos para me acolher, para me dar o amor que tanto me falta, para me ver crescer, para apoiar os meus estudos, para me darem conselhos, para me ver e me fazer feliz. O livro da minha vida, a minha história, cada parte dela merece ser queimada, não sou a pessoa que eles devem conhecer, não é a minha voz que eles devem ouvir. Se realmente ninguém se importa então não é necessário a minha presença. Eu não sou a pessoa que eles querem ver, não sou a pessoa com quem eles querem conversar, não sou a pessoa que eles querem ouvir, não sou a pessoa pra quem eles querem olhar, de fato não tenho amigos, de fato não sou nada, de fato não sou interessante. Assim como eles não precisam de mim eu também não preciso deles, eu não sou nada. Você tem razão, Serafim.

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⏰ Última atualização: Jul 27 ⏰

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𝑂𝑙ℎ𝑜𝑠 𝑃𝑎𝑟𝑎 𝑀𝑖𝑚 - 𝐇𝐞𝐥𝐞𝐧𝐚𝐂Onde histórias criam vida. Descubra agora