Gurunga 6 de 10

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Praça da Igreja, Matinho, 09:00 AM

Era sábado, dia da feira livre em Matinho, a cidade estava movimentada, especialmente o centro, onde ficava o Mercado Municipal e uma área aberta destinada a feirantes. A figura que quase fazia parte daquela paisagem estava lá, Zépedin, sentando na calçada entre as duas portas do bar de Lôlô, ele fumava um cigarro muito grosso, feito com folha de jornal e sem muito capricho.

— E aí Zé! Já tomô uma hoje? — Perguntou Binha de Zé Magro —

Zépedin ergueu a cabeça lentamente para olhar para Binha e respondeu sorrindo.

— Tomei. — Respondeu Zépedin —

— É iss aí Zé! Eu também vô tomá uma pra esquentá. — Disse Binha —

Binha entrou no estabelecimento, o local estava bem mais cheio de gente do que o habitual, afinal de contas era sábado, Binha cumprimentou alguns velhos conhecidos e foi direto ao balcão.

— Bom dia Lôlô, me dá uma branquinha da Betana. — Pediu Binha —

O dono do bar respondeu a saudação do cliente com um aceno de cabeça e atendeu ao pedido. Ao receber o copo com a dose de cachaça, Binha não se deu ao trabalho de sentar-se, provavelmente nem havia cadeiras disponíveis, ele bebeu de um gole só e recolocou o copo sobre o balcão.

— Me dá mais ôta da merma e uma banda de limão. — Pediu Binha —

Ao receber o que pediu, Binha espremeu a metade do limão dentro da dose de pinga, fez um movimento suave de rotação com o copo para misturar as substâncias e bebeu o conteúdo do copo de uma vez.

Binha pagou um real e vinte centavos pelo que consumiu e saiu do bar, Zépedin estava tentando acender seu grosso cigarro que havia se apagado.

— Puxa o ar com força Zé! — Disse Binha —

Zépedin riscou o isqueiro Bic de cor branca, a chama começou a queimar a ponta do cigarro, Zépedin soltou o gatilho do isqueiro e a chama se esvaiu, ele puxou o ar com todo a força que restava em seus pulmões deteriorados por anos de consumo de tabaco. Ele até conseguiu acender o cigarro novamente mas ficou sem ar e foi acometido por uma crise de tosse com catarro, Binha deu uma risadinha e seguiu em direção à feira.

— Meu primin... bunitin... chêrosin... viadin. — Disse Binha olhando para seu primo Milson —

— Sai fora! — Disse Milson rindo —

Milson, Leonardo e Jardel estavam sentados num banco de concreto embaixo de uma árvore, eles conversavam sobre algum assunto quando Binha chegou e começou a encher o saco de Milson, seu primo de primeiro grau por parte de mãe.

— Ô Binha, para cum essa prosa ruim! — Disse Milson meio sério, meio de brincadeira —

— Ocê é tip eu... eu côm de tud que aparecê pela frênt, eu como buceta, cu de muié, cú de hôm, eu meto a rola ni qualqué buraco. — Disse Binha —

Leonardo e Jardel riram, no entanto Milson não achou graça.

— Meu negóç é xana! — Disse Milson sério —

Binha prosseguiu falando mais obscenidades e absurdos por alguns minutos e depois tomou seu rumo.

— Parece que a doidice é de família. — Comentou Jardel —

Milson olhou para Jardel, sorriu e falou.

— Dôid é ocê que acorda de madrugada pra batê punheta na rua! — Disse Milson em tom acusativo —

Milson se referia a um episódio onde Jardel confessara que havia acordado de madrugada e se masturbado na rua, num local escuro, isso havia acontecido anos antes quando Jardel tinha dificuldade de controlar seus impulsos sexuais no começo da adolescência. Por essa época, Jardel também praticara outros atos um tanto peculiares, ele tinha fantasias sexuais especificas e também praticas, ele frequentemente ia até casas em construção (quando não havia ninguém lá) para se masturbar, ele normalmente retirava toda a roupa ficando totalmente nu para praticar a o ato, às vezes ele também ia até um local de mato fechado para fazer o mesmo, porém casas em construção eram mais acessíveis e próximas, por tanto ele praticava a masturbação com mais frequências nestes locais. Havia também a questão da praticidade, como Jardel não podia fazer aquilo em qualquer lugar, as casas em construção acabavam sendo locais propícios para a pratica da masturbação sem receio de ser visto por alguém. No entanto, Jardel acabou sendo visto por pessoas duas vezes enquanto praticava esse ato, mas isso ele nunca contou a ninguém.

— Nesse tempo eu era um muleque sem juízo. — Defendeu-se Jardel —

— Hum, eu que não sei que cê ainda não faiz iss. — Disse Milson desconfiado —

— É sério, eu parei, só bato uma em casa agora, esse tempo dessa doidiçada passou. — Explicou Jardel —

Jardel estava realmente dizendo a verdade, ele tinha mesmo abandonado essa pratica peculiar de se masturbar nestes locais inapropriados, afinal de contas, ele estava invadindo propriedades privadas.

Leonardo estava só escutando a conversa e rindo, de repente ele olhou as horas em seu relógio de pulso digital e falou.

— Bóra cumê um pastel! — Propôs Leonardo —

Os outros concordaram e os três foram até a barraca de Regis do Pastel.

Mais tarde, perto da hora do almoço o trio de primos foi para casa de Anísia e Cassiano (avós de Jardel e Leonardo, Anísia era irmã do pai de Milson, portanto, sua tia) essa era uma casinha simples que era usada apenas nos dias de feira ou em outras situações, a casa onde Cassiano e Anísia realmente moravam ficava na Taboquinha. O cheiro de carne de gado sendo frita tomava conta do ambiente, Anísia estava quase finalizando o almoço, os rapazes estavam sentados nos sofás da sala, dessa vez conversando sobre assuntos que não eram tabus.

— Que dia que cê vai ni Viaporã? — Perguntou Leonardo a Milson —

— Eu tô querên i na semana que vem. — Respondeu Milson —

— Vai lá porra, pra nóis jogá vídeo game e ir dá uma volta na praça. — Disse Leonardo —

— É, acho que de hôj a ôit eu vô mais seu pai quand ele voltá. — Disse Milson —

Milson se referia a Ivan, pai de Leonardo, Ivanvinha todo sábado de Viaporã onde vivia até Matinho para vender fumo de corda,papel de cigarro e isqueiros.

Gurunga 7Onde histórias criam vida. Descubra agora