Douma

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- O meu maior sonho era estar com a minha mãe em um lugar seguro e bonito! E qual é o seu maior sonho?

Sentir alguma coisa.

- Meu maior sonho é ver todos vocês felizes e saudáveis - Respondeu Douma, afagando os cabelos de uma pequena menina - Agora vá. Sua mãe lhe espera.

Douma observou a criança correr para fora de sua sala e suspirou, tirando a capa e o chapéu. Há dois dias atrás, Douma se encontrou com Akaza de repente enquanto este estava em mais uma de suas missões. Douma tentou pensar que foi engraçado implicar e perturbar com Akaza, mas tudo o que havia saído como reação fora uma risada forçada, como sempre.

Sempre que terminava de aconselhar e acalentar pessoas, Douma voltava para seus aposentos, ignorando a todo custo o espelho quebrado que ficava na entrada de seu quarto. Um de seus funcionários já havia perguntado o porquê do espelho rachado, mas Douma, como desculpa, apenas havia dito que foi um acidente que não precisava ser consertado.

Já se faziam anos que Douma evitava espelhos. Evitava pensar muito no que não podia expressar. Muzan quase não o convocava à missões; os onis com quem procurava conversar o ignoravam ou fugiam de medo. Os humanos o reconheciam apenas como um salvador, mensageiro dos deuses. Douma não tinha ninguém. Então não teria porquê expressar qualquer coisa para pessoas falsas. Apenas ser falso também.

Ele não deveria se importar com esse tipo de coisa. Afinal, era um oni. O lua superior dois. Todos os demônios se importavam apenas com sangue e poder, porque era isso que ocupava suas mentes, era o que fazia seus corpos se moverem todas as noites, além dos deveres de Muzan. Por isso, Douma não tinha que externar aquele pensamento, aquela vontade que guardava a cinquenta chaves dentro de seu coração.

Ninguém precisava saber que Douma tentava fazer amigos ou amar pessoas para sentir alguma coisa, nem que fosse uma mísera migalha de sentimento, para que no fim, jamais funcionasse.

Ninguém precisava saber que Douma observava a si mesmo nos espelhos, tentando simular sentimentos e sempre falhando, restando no fim apenas uma expressão estóica, vazia e derrotada de alguém que não conseguia nem sentir ódio ou tristeza ou mesmo frustração por não sentir nada.

Ninguém precisava saber que o maior sonho de Douma era sentir alguma coisa. Não era necessário. Sua vida estava ótima, seu cargo de lua superior dois seguro, seu culto lotado de mulheres para devorar quando bem quisesse. Era isso. Apenas isso. Sua vida estava ótima, não havia porquê se preocupar com espelhos quebrados e sentimentos vazios.

Em seu quarto, Douma apertou o cobertor da cama, procurando sentir alguma coisa com aquela invasão de pensamentos.

E como sempre, nada.

O oni fechou os olhos, aguardando o anoitecer.

***

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