MOONIE | Olhos Brilhantes.

Pássaros.

- Cara, eu desisto, isso definitivamente não está rimando! Estou totalmente sem inspiração alguma, quer me ajudar com alguma ideia?

- Sério isso? E por acaso eu tenho cara de dicionário?

- Grosso, mas, tudo bem, eu sei que você me ama.

E este somos eu e meu melhor amigo tendo mais uma conversa rotineira no pátio de nosso colégio, Ray não é lá um dos melhores em demonstração de afeto, ele tenta muito melhorar este lado depois que nos tornamos melhores amigos, isso já tem muitos anos, se eu não me engano 6, eu sou péssimo com datas...

- O que está tentando escrever agora? Alguma outra história sem começo, meio e fim novamente? Poema? Música?

- Me alegra muito saber que você sente firmeza nas minhas histórias! - A ironia em pessoa - bem, eu estou no momento tentando compor uma música para treinar no piano, mas você sabe, no quesito composição eu consigo ser pior do que nas outras duas, por mais que eu use o piano para criar melodias nunca parecem se encaixar ao que eu tenho em pensamento... acho melhor desistir de uma vez da música.

- Deixe de ser tapado! Se fizer isso, eu vou esganar você.

Acabei dando risada do comentário espontâneo, como disse, ele me ama, e demonstra do jeitinho dele. Balancei minha cabeça levemente e guardei meu caderno junto aos lápis que estava usando, me levantei da mesa em que estávamos vendo Ray me observar curioso, um olhar do tipo "aonde vamos?", peguei minha mochila e coloquei-a nas minhas costas ajeitando-a, dando um longo suspiro.

- Hora de ir para casa, ainda tenho afazeres de um adolescente que por enquanto não tem boletos para pagar, porém, tem que dar uma de "mãe" da casa já que a verdadeira está ocupada demais lidando com os problemas do mundo capitalista.

- Eca, faxina. - disse Ray, zombando. - Pelo menos se a música der errado, você tem talento para faxina. 

- Vai se catar! - Passei andando por ele, escutando ao fundo sua risada divertida seguida de um "me avisa quando chegar em casa", não pude conter um sorriso de canto, Ray é basicamente a pessoa que eu mais confio em toda essa minha mísera vida, além do meu avô que infelizmente não está mais aqui, ele faleceu tem um ano, foi duro, difícil e bem complicado, bom, no caso ainda é, mas eu tenho que continuar, certo? Afinal, a única certeza de que nós temos neste mundo é de que um dia vamos morrer e talvez, ir para um lugar melhor, não sou muito ligado em religiões ou algum ser celestial, costumo dizer que se existe um Deus ele é único, para tudo e todos como deveria ser perante as pregações que meus tios ficam fazendo, claro, eles praticam? Não, mas, acontece, as pessoas são hipócritas e não reconhecem isso grande parte das vezes, Ray, por outro lado, não gosta deste tipo de conversa, ele diz que isso é história para boi dormir, lorota, papo furado, entre outras mil e uma coisas que eu tranquilamente consigo me lembrar, pois um dos passatempos favoritos dele é ficar mandando mensagem no grupo da família  (que, é todinha evangélica) e me mandar registros de tela de todos bravos o dizendo que ele deveria ser mais respeitoso com a religião, claro, ele deveria, mas Ray teve seus motivos para hoje, não seguir e não acreditar, não vou dizer que não o compreendo, pois na geração atual em que estamos e por toda a história de perseguição de igrejas fica difícil realmente acreditar em determinadas coisas, mas, já dizia minha vovó, "cadum, cadum".

Estava bem frio na cidade, tenho ultimamente ficado bem gripado por conta do tempo, eu tenho uma péssima imunidade, não posso tomar um vento errado que no dia seguinte já acordo com diferentes sintomas pelo corpo, tudo isso porque sou extremamente chato (e até um pouco irresponsável) em relação a minha alimentação, eu não como carne e nem gosto muito de todos os tipos de grãos, isso dificulta bastante minha vida quando o assunto é voltado a ter nutrientes essenciais para não viver morrendo na porta de um hospital tendo que repor os mesmos pela veia, mas, fazer o quê, não é?- O céu estava bem escuro naquele dia, as nuvens se misturavam em uma coloração branco e cinza, aparentemente, iria cair o mundo, vulgo significado = iria chover para um senhor caralho, apressei o meu passo em direção ao meu apartamento, pois eu realmente não queria chegar ensopado e ainda ter que correr o risco de amanhã acordar extremamente gripado e não conseguir levantar da cama, ou pior, ser obrigado a levantar da cama pela minha mãe, que odeia que os outros a digam o que fazer (até mesmo o óbvio) mas adora ficar mandando nos outros e ter tudo no seu tempo, está aí, uma coisa que talvez eu nunca vá entender, mas não fico perdendo meu tempo pensando nisso, não tem como exigir postura materna de alguém que só foi mãe para compor família, não é? Bom, se tiver, talvez quando for mais velho eu compreenda melhor essa parte emocional familiar, por enquanto já tenho muitos traumas com esse assunto ao qual já tento lidar toda semana em minha terapia.

Depois de alguns minutinhos caminhando cheguei em meu prédio e assim que me coloquei para dentro do local, olhei para fora e vi alguns chuviscos, ótimo, pela primeira vez eu consegui escapar da chuva, coisa que normalmente não acontece, eu sou bem azarado quando o assunto é... bom, sabe aquela frase? Se tem como alguma coisa acontecer, vai acontecer, seja boa ou ruim, então, comigo, tudo o que pode acontecer de ruim, acontece, antes você já esperar uma bela desgraça do que se frustrar com um final feliz fantasioso que só existe na sua cabeça.

Tratei de seguir até o elevador, apertando o botão para chamá-lo, alguns minutos e ele estava no térreo. Adentrei-me olhando no espelho, esperando que a porta se fechasse sozinha. Precisava arrumar um tempo para fazer uma limpeza de pele, apesar de nunca ter tido o hábito de cuidar da pele do meu rosto, mas, a partir de uns tempos para cá, seria interessante, pois não quero ser mais velho e ter o rosto cheio de espinhas! Imagina? Em pleno auge de meus trinta e poucos anos, com mil e um problemas fora do meu controle (fazendo bem o meu tipo) ainda sofrer com a pele de um jovem que parece que acabou de entrar na puberdade? Ninguém merece.

Ao adentrar o último andar, desci do elevador e fui até a porta, destrancando-a. Finalmente, estava em minha residência, silenciosa, por enquanto, uma vez que meus irmãos estavam na escola. Deixei a mochila em cima do sofá e olhei ao redor. A casa não estava suja e nem tão bagunçada, o que é um milagre, visto que isso costuma não acontecer. Além disso, é uma ótima oportunidade para ler e estudar. Sentei-me no sofá, pegando o celular. Eu passava bastante tempo vendo posts aleatórios do mundo geek/pop, e com isso meu feed ia se atualizando a medida que ia fazendo minha pesquisa de accounts pelo site. Eu adorava ver lojinhas de produto para cabelo, corpo e até mesmo brincos e acessórios de personagens, tenho 17 anos, mas ainda tenho um lado infantil bem aflorado quando o assunto é" material", quem não gosta de usar camisas com estampas dos seus artistas favoritos ou com referência da série favorita? Quem disser que não, está mentindo feio. Até hoje meu tio é apaixonado pela Marvel e não pode ver nada do homem de ferro, e ele é um homem bem-sucedido e decido, e eu o compreendo, afinal, quem não gosta do Tony Stark? Ele é o deus da Marvel, levantou uma marca inteira somente com um filme (e carrega nas costas até hoje a franquia inteira de vingadores, afinal, o ucm não seria nada sem ele.) Mas há quem diga que ele é somente um gênio, bilionário, playboy e filantropo. 

Ri sozinho. É engraçado como, às vezes, consigo ser bem cafona. Não que me importe com isso, mas deve ser bom perceber que desenvolvemos características mais maduras à medida que envelhecemos. Não acho que isso me impacte de maneira profunda, mas acredito que teve sua influência em minha infância. Às vezes, fico pensando sobre isso e me pergunto se deveria compartilhar com meu analista. Talvez eu precise de um caderninho para anotar melhor minhas emoções. A música, assim como meus textos e poemas, servem como uma forma de expressar tudo o que não digo em voz alta. Anotar meus sentimentos e emoções pode ser benéfico para essa minha veia artística, não é?

Suspirei e desviei o olhar da tela do celular, observando o cômodo da sala. O dia estava realmente escuro e silencioso. Isso, por um lado, não me incomodava; dias assim geralmente trazem uma sensação de conforto. Contudo, agora, sem a presença do meu avô, que costumava fazer suas piadinhas e compartilhar histórias ou discutir temas que considerava relevantes, essa ausência se torna angustiante. Às vezes, enquanto realizo minhas tarefas, sou tomado pela ilusão de que ele está me chamando para um café da tarde ou para assistir algo na TV. Não há sensação pior do que perceber isso e, em seguida, ter que aceitar que ele nunca mais estará ali para isso. Embora entenda que a vida é feita de ciclos de nascimento e morte, é difícil não ceder ao egoísmo e preferir vê-lo ali, na cadeira de rodas, em vez de não receber nem um simples "bom dia, bambino" ao acordar. É uma dor corrosiva e desgastante, mas vamos em frente. Mesmo que, às vezes, os passarinhos sigam caminhos opostos, mantenho a esperança de que um dia verei meu avô novamente.

"Você recebeu um link de convite para entrar no grupo de WhatsApp"Roc NovA"

Em? 

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