Capítulo 3 - Vingança (pt. 1)

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"Estou me sentindo inspirada porque o jogo virou
É, estou em chamas e sei que queima [...]
E, é, eu sei que você pensou que tinha coisas maiores e melhores
Aposto que agora está doendo"

(Sorry Not Sorry - Demi Lovato)

Vingança (s.f.): ato retaliativo contra quem seria o causador de uma ofensa ou de um prejuízo.

Eu era só mais uma garota de 16 anos com lágrimas inundando os olhos, inúmeros questionamentos e um cara como melhor amigo. Admito que, hoje em dia, é muito mais fácil para a minha memória lembrar de como fomos nos tornando cúmplices aos poucos e das coisas dolorosas que ouvi por culpa dele anos à frente. Apesar disso, vez ou outra, suas palavras certeiras para aquele momento difícil ainda vem à tona. “Viver bem pode ser sua melhor vingança.”

Frase de efeito, palavras ensaiadas, título de best-seller, sabedoria copiada. Como quiser. Por mim, eu poderia resumir a um simples conselho que me fez parar de chorar durante o desespero, mas que, com o tempo, se mostrou cada vez mais inviável de ser aplicado. E eu juro que tentei. Por anos quis ser como os outros ao meu redor. Aqueles que, mesmo com todas as injustiças, controvérsias e escândalos acontecendo debaixo do próprio nariz, conseguiam ter sangue frio e fazer vista grossa. Mas a verdade é que eu nunca seria capaz de viver bem daquele jeito... Não com minha vida sendo um fiasco.

Para alguém como eu, o mundo assume uma ótica incomparável. Não é drama, nem exagero, muito menos vitimismo. É só uma realidade distinta o suficiente em que pessoas como meu ex-melhor amigo não podem se colocar no meu lugar, dizendo que entendem como eu me sinto.

E como ele seria capaz de entender?

A mais esquisita, a mais azarada, a mais sem graça. A menos inteligente, a menos bonita, a menos interessante. Não que eu não fosse boa o bastante, mas eu sabia que eu nunca seria boa o suficiente. Eu não era daquelas de quem se sente orgulho e de quem se fala para Deus e o mundo. Ou daquelas que são convidadas para as festas e que fazem falta. Eu era importante, mas nunca fui escolhida primeiro. Sempre a sombra de alguém, sempre o resto, sempre a última a ser lembrada. Eu nunca fui a pior, mas o perfil mediano nunca me faria melhor.

Por isso, eu sempre soube que pessoas como eu não podem simplesmente viver. Pessoas como eu precisam jogar se quiserem ser vistas. Pessoas como eu estão destinadas a se vingar.

Então, quando aparece uma oportunidade de vingança - seja ela da mais sutil a mais dolorosa, da mais efêmera a mais duradoura, da mais catastrófica a mais inocente, da mais encoberta a mais escancarada — precisamos agarrá-la com força e com as duas mãos. Não podemos desperdiçar a nossa única oportunidade de vitória. Não dá para jogar fora nossa primeira e última chance de roubar o protagonismo.

— Daí eu pensei: o que dá mais dinheiro? Ser um psicólogo no Brasil ou um dono de lanchonete nos Estados Unidos? — reflete Moose, coçando a barba. — Com certeza, a segunda opção.

Eu e Musa gargalhamos alto.

O emprego no Moose's Diner é mais divertido do que eu pensei seria. Meu trabalho não é tão difícil, e os poucos clientes que apareceram me trataram muito bem. De fato, o restaurante merecia ser mais reconhecido, a comida do Moose é uma delícia.

O expediente já terminou, porém tive que ficar um pouco mais para ajudá-los com os pratos sujos.

Nós tivemos bastante tempo para conversar durante o dia, mas foi só agora que consegui perguntar para Moose como ele havia conhecido a Rose. Aparentemente, eles estudaram psicologia juntos na faculdade, só que ele preferiu largar tudo para vir para a Califórnia. O homem está contando toda história para mim e para Musa, e eu concluí que ela estava certa — pode não parecer, mas ele é muito legal.

Amor à DerivaOnde histórias criam vida. Descubra agora