🍒 | capítulo onze.

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— Quando era adolescente eu tentava me encaixar nos padrões também... na verdade desde a minha infância.

Jisung mantinha seu foco no trânsito, mas se dedicava em mostrar atenção à garota no banco do carona. Felicia havia tirado seu tênis e com as meias nos pés estava encolhida no banco, escorada na janela e falava distraída enquanto ouviam The Driver Era em uma altura agradável.

— Desde pequena sempre me senti deslocada, diferente das outras crianças, minha forma de expressar e pensar. Com os anos tudo se intensificou e daí os problemas começaram, tive que iniciar na terapia muito cedo. — Ela riu se recordando. — Hoje posso sorrir por estar aqui, eu me reprimi por tantos anos me escondendo por trás de alguém que eu tentava acreditar que era eu... e inclusive quando meus pais me apoiaram a passar pela transição, foi um processo muito louco, porque, infelizmente, a maioria das famílias são rígidas e assim, sabemos que é estrutural. Não é um problema apenas familiar, é social. É porque crescemos dentro de uma bolha difícil de perfurar. Mas... eu tive sorte, e poderia não ter sido assim. Mais um motivo pra que meu aniversário seja especial.

Jisung a observou de relance, sabia que era algo muito importante para ela, e naquele momento tornou a ser importante para si também.

— Minha família não aceitava muito bem minha orientação sexual inicialmente. Pra eles era difícil entender que um dia qualquer eu poderia estar com um cara, e em outro momento uma garota, ou alguém que se alinha a ambos os gêneros ou que não se alinha a nenhum e enfim, você sabe toda a história por trás disso. Eles queriam acreditar que eu estava em uma fase rebelde e que logo minha mente mudari. — Dizia rindo. — Só que foi mais complicado ainda quando me descobri demi, e já no final da adolescência eu resolvi me abrir.

— Demissexual??

Jisung riu negando. — Demiboy.

A revelação fez com que Felicia olhasse para Jisung surpresa. Ele nunca havia tocado no assunto, talvez porque não achou necessário ou talvez por ainda não estar confortável.

— Sim senhorita, eu me reconheço como demiboy. E antes que me pergunte quais pronomes seriam adequados: qualquer um. Apesar de usar o masculino com mais frequência. Eu não ligo, eu só existo, com tanto que sempre seja dito com respeito e não como ofensa e chacota.

A bailarina sorriu concordando. — Nunca vou fazer da sua existência uma piada.

— Certo senhorita... — Dizia já parando o carro. — Chegamos!! E hoje ainda é seu aniversário e eu ainda quero comemorar com você.

Felicia se distraía calçando seu tênis. — Você vai conhecer meus pais agora...

A fala repentina causou uma breve sensação de pânico em Jisung. Pensava que a bailarina morasse sozinha, era cedo demais para ser introduzido a sua família e ele não estava tão apresentável. Nem mesmo pra dizer que eram amigos e se conheceram recentemente.

— Oh, por que você tá vermelho?! — Felicia se inclinou após soltar o cinto e o observou de perto cutucando as bochechas fartas do inglês.

— Não sabia que você morava com seus pais, eu pensei que tivesse vindo pra França sozinha... — Disse manso.

Felicia gargalhou tão alto que ao invés de tranquilizar Jisung, apenas lhe deixou ainda mais ansioso e confuso.

— Disse que nunca faria da minha existência uma piada... — Acusou.

— Não, Peter, ai... — Tentava se conter do riso sem fim. — Você é muito fofo, meu Deus você é tão fofo!! Mas olha, relaxa tá?! Meus pais moram em Sydney, é que todo ano no meu aniversário nós cantamos parabéns por vídeo chamada. E é claro que não vou deixar você de fora...

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