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Ada Snow
25 anos de idade
Ilhas do Canal da Califórnia

O reflexo no espelho não era apenas um vislumbre de liberdade, era a janela para uma alma acorrentada.

O vestido preto, com fenda audaciosa e ombros nus, prometia uma vida não vivida. As joias de diamantes e safiras, embora reforçassem meu status de impostora, despertavam em mim uma sensação de beleza e poder. Cada suspiro de autoestima trazia à tona a menina sonhadora que um dia fui, antes de ser vencida pela exaustão.

Sete anos de casamento se arrastaram, com cada dia sendo uma réplica do anterior, formando uma série interminável de ecos silenciosos. A gravidez avançada pesava em meu corpo e coração, como uma lembrança constante da autonomia roubada, da escolha que não pude fazer.

Um arrepio percorreu minha espinha e, sem precisar olhar, eu sabia que ele me observava.

Casada com um líder religioso venerado, e tendo como antecessora uma esposa profundamente idolatrada, eu me via submersa em um mar de julgamentos, sob constante avaliação e sujeita a um controle rigoroso.

— Hoje — sua voz veio como um sussurro, sua sombra fundindo-se com a minha no espelho, escurecendo meus pensamentos mais brilhantes —, você será a estrela que ilumina meu céu, Ada.

Levantou um batom vermelho, colocando-o em minha mão, transferindo o peso de suas expectativas.

— A Ella...

— Ella está na cabine dela — me interrompeu, seus braços me envolvendo em um abraço que era mais uma reivindicação do que qualquer gesto de carinho.

— Você não acha mais seguro ela ficar com a gente? Essa embarcação é enorme, e tem tanta gente desconhecida...

— Precisamos de privacidade, vespinha. Confio na minha filha. Ella nunca se colocou em perigo.

Exalei uma rajada de ar, frustrada. A sensação de impotência diante da situação só intensificava meu mal-estar.

— Não tem mesmo como a gente se hospedar em terra firme? — Minha voz vacilou, traída pelo enjoo. — Continuo fazendo vômito.

— Estamos em uma embarcação projetada para ser estável — respondeu, com um tom de suspeita. — Com essa desculpa, posso pensar que você está tramando algo em terra firme.

— Como eu tramaria algo nessas condições, Asmund? Eu realmente sinto balançar!

— Se você não fosse uma preguiçosa intelectual, saberia que essa é a máxima estabilidade que uma embarcação pode ter no oceano — ironizou.

— De qualquer maneira, não estou bem...

— Calada — ordenou, cheirando meu pescoço e me dando mais um arrepio. — Vamos ficar apenas uma noite e um dia. E aqui é mais seguro para você e para Ella.

— Estou com aquelas contrações novamente — avisei.

— Trinta e seis semanas, ainda não é trabalho de parto. Não faça drama usando meu filho...

— Drama, Asmund?

— Não me desrespeite! — Me beijou no ombro. — Ganhou sua tão desejada licença para se comportar como uma vagabunda pagã, foque na minha gentileza, em querer me agradar como tal.

— Estou avisando desde o voo... E eu não queria...

— Shh! — me silenciou. — Você precisa e vai aguentar mais três semanas para que meu herdeiro nasça forte e saudável. Não tente me desobedecer.

O. C. R.Onde histórias criam vida. Descubra agora