Capítulo 05

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      Quando Jean se deu por si, já estava sentada na beira da cama do quarto da cabana

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      Quando Jean se deu por si, já estava sentada na beira da cama do quarto da cabana.
     O local estava bem abafado, na verdade. E Jean acreditou que fosse o calor da lareira que fazia a madeiragem do local ficar com um aspecto menos acabado.
     Daddy se aproximou da garota, portando na mão duas taças preenchidas até o meio de vinho.
     — Você contou a mais alguém que veio aqui?
    Ela não tardou a responder.
     — De jeito algum. — Ela fez uma pausa, observando os movimentos dele. — E você?
     — Não.
       Ela olhou para os lados, insegura.
     — E aqui está, como você pediu — ele a entregou um envelope, certamente com o pagamento previamente estabelecido.
      — Valeu. — Sua voz saiu quase baixa.
     Depois de um certo silêncio, de maneira cautelosa, Daddy se aproximou, entregando-a uma das taças que portava.
      — Então, quantos anos você tem mesmo? — agora, ela podia notar que a voz dele tinha um grave, mas não deixava de ser grossa.
     Ela bebericou o vinho.
     — Hm, vinte e três. — Ela comprimiu os lábios em uma linha fina.
     Ele deu de ombros.
     — Sabe, você aparenta ser mais jovem.
     — Hm, obrigada.
     — Mora por aqui mesmo…, Zona Norte?
     Ela quase hesitou, engolindo o sumo da garganta.
     — Hm, não. Eu vim visitar uma amiga.
     — Aham…— mais um gole.
     — E você? — Foi a vez de Jean.
     — Eu?
     Ela assentiu, bebendo mais um gole ao balançar as pernas.
     Por um certo momento, ele a encarou, ignorando totalmente a sua pergunta. Olhou para o corpo dela com atenção, sem ter certas urgências.
      Jones estava sem camisa, apenas com a calça social.
     — Você anda por aí assim? — E de maneira minuciosa, com a outra mão, Daddy tocou-a no rosto, entrelaçando os dedos grossos entre os fios loiros da garota.
     — Assim como?
     — É assim que se veste normalmente?
     — Eu acho que…— Jean ponderou, estando totalmente hesitante com a situação, sentindo o julgar pelas suas roupas. — É. É sim.
     Ele acariciou sua bochecha com o polegar pesado, chegando até mesmo a tocar na ponta de seu nariz.
     — Você é tão linda.
     Jean, sem saber como reagir, soltou um sorriso nervoso. Todos esses movimentos a deixavam tensa.
     Ela sorriu desajeitadamente.
     — Valeu.
      Ele a encarou. Jean estava sentada, o que fazia com que Daddy Dominador ficasse superior a ela.
     — Você pode me chamar de Jones, ou apenas de Daddy, se preferir. — Ele sorri, depois de mais vinho descer pela garganta. — Jovens da sua idade costumam, sabe, ter certos fetiches com coroas como eu.
      — Legal — é o que ela disse em resposta.
      Jean não queria soar fria ou nem nada tipo, mas sabe se Deus o que ela estava sentindo.
     Também era notório o quanto Jones a olhava com desejo esmero, como se ela fosse algo precioso a se zelar.
     — Sabe, Eva, eu tenho um pouco de inveja da sua geração. Vocês não se importam tanto com as regras. E, e eu acho que isso é muito bom. Também são meios contraditórios, entende? Não de jeito ruim. — Os dedos dele deslizaram novamente para a bochecha dela. — Deve ser muito bom ter essa liberdade em mãos, não é mesmo?
     Jean assentiu, e ele continuou. Mas a verdade é que ele não sabia de nada. Nada que Jean ou sua amiga Bea passaram e vinham passando.
     — Olha, eu não quero ser o velho chato que fala bobagens, mas eu olho para você e acredito que existem muitas possibilidades. E me pergunto o como a sua vida deve ser para você ter se submetido a isso.
      “É uma merda”, ela pensou.
     O polegar de Jones foi para os lábios de Jean. Sentindo a aspereza deles ao deslizarem na boca. Ela se manteve quieta, segurando a taça gelada com as mãos entre as pernas, sentindo o acolchoado se amassar como a sua dignidade.
     Ela sentiu umas das pernas de Jones se instalar entre as suas, dando-lhe certo calafrio, enquanto o polegar dele entrou vagarosamente para a sua boca.
     Jean ficou imóvel.
     — Eu espero que você goste. — ele disse, na mesma medida que seu polegar adentrava ainda mais na boca da menina. — Abra mais. — Ele pediu, e Jean fez. — Mais. — Ela obedece. — Assim mesmo.  
     O dedo dele estava quase em sua garganta, fazendo-a ter ânsia de vômito.
     — Isso…— Ele dizia. — Boa garota.
     Jean fechou os olhos, desejando que tudo acabasse logo, pois não entendia o porquê de sentir tanta culpa.
     — Você deve ser tão apertada…
     Ele finalmente tirou o dedo da boca dela, suavemente, e Jean se prestou em silêncio, articulando sua respiração.
     Quando os dedos dele a tocaram, ela sentiu uma espécie de calafrio correndo atrás de si. Ela não estava sendo obrigada a se submeter, mas de certa forma, estava se submetendo.
     — Você está bem?
     —  Ãh? — Ela pareceu voltar para o corpo. — Desculpe. Eu só…não estou acostumada a isso — Jean disse, dando um gole e entregando a ele a taça de vinho.
     Ele colocou a taça na cabeceira.
     — Melhora com o tempo, meu anjo. Será rápido.
     Ela assentiu.
     Então Jones se aproxima, fazendo-a deitar na cama. Ele fica por cima, tocando em seu braço e a encarando com desejo. Jean não se move. Não consegue. Ela está paralisada, e não sabe dizer se está viva ou apenas dentro de seu corpo parasitando.
     Jones tem cheiro de madeira verde e suor misturado com antitranspirante masculino.
     Ele começa a beijá-la na base do pescoço, indo para a nuca, depois tocando perto de suas costelas, indo em direção aos seios, no entanto, os movimentos deles são interrompidos com o toque de celular vindo de uma maleta.
    De início, ele volta a fazer os movimentos, mas à medida que ia beijando Jean, o aparelho tocava, vibrando ao mesmo tempo, sem parar.
    — Puta merda! — ele se esquivou e saiu de cima de Jean, indo até a maleta, sacando o aparelho e atendendo. — Alô? Sim, eu ainda estou aqui no trabalho…— ele diz ao telefone. — Não, tudo bem, eu posso ficar com as crianças amanhã…— Ele olhou para Jean, avisando que será breve no telefone. Então Jones entrou no banheiro do quarto para ter mais privacidade na chamada.
     Jean sabe que pensar em fazer o que está prestes a fazer enquanto Jones está no banheiro não é legal. Nada legal mesmo, até porque ele pagou um preço justo para foder com ela. Mas ela tem uma oportunidade em mãos. Jones tem família, filhos…uma esposa, dinheiro... Coisas que ela nunca teve na vida, principalmente dinheiro ultimamente. Então, de maneira silenciosa e prestativa na porta do banheiro, a garota pôs o envelope com a grana na bolsa, endireitou a saia e saiu do quarto em silêncio. Fazendo o possível para que os barulhos do piso não sejam altos demais.
     Jean sabe que essa não é a coisa certa, embora já estivesse a ponto de abrir a porta e sair para a fora. No entanto, ela força a maçaneta, mas a maldita porta estava trancada. Ela força mais uma vez, sem sucesso. E outra vez, mas nada.
    
     — O que você está fazendo? — Jean para imóvel perto da porta.
    Em um giro minuciosamente calculado ela vira para trás, vendo a imagem de Jones com celular na mão, a encarando sem reação.
     — Eu…
     — Que merda…— Ele a olha, desacreditado. — Você estava tentando fugir com o dinheiro? É isso?
     Ele solta uma risada, uma risada bem áspera e amarga. — Você…Vem cá, tá achando que eu sou burro, putinha?
      — Eu só…. — Ela não podia.
      — Me devolve a porra do envelope!
    Jean não hesita.
      — Tudo bem, só me deixa ir embora.
      Ele a olha com desdém.
      — Escute bem, eu, eu… só não quero fazer isso.
      — Ia só fugir com o meu dinheiro para variar. Me devolve a grana, porra.
      — Tudo bem. Não precisa falar assim.
      — Caralho, você acabou de tentar me roubar. Queria o quê?
     Ela não tem coragem de encará-lo no rosto.
     Jean tira o envelope da bolsa, se aproximando de Jones. Mas em um movimento bruto, ele agarra seu braço, puxando-a para mais perto de seu corpo.
     — Você pensa que pode me enganar, é? — Ela sente o hálito quente de vinho saindo da boca dele.
     — Me solta. — Jean murmura. — Eu já devolvi a porcaria do dinheiro! — e ele aperta ainda mais o braço dela com força.
      Jean até tentou se desvencilhar, mas sem sucesso para desgarrar. Ele cheirou a nuca dela, e Jean se retraiu, mas não pareceu evitar a situação.
      — Pensei que você fosse uma putinha mais inteligente, sabia? — Ele disse de forma compulsiva. Parecendo até um cachorro raivoso.
     O braço de Jean ardi. Estava quente  por causa da força dele ao apertar. Ela também conseguiu sentir a respiração dele no pescoço, o que a faz se retrair cada vez mais do corpo dele.
     Jean, por instinto, acaba acertando um golpe na genitália dele. Ele urra de dor, a soltando brevemente, mas antes que ela pudesse se afastar para fugir, Jones a agarra pela perna, fazendo-a perder o equilíbrio e cair violentamente no chão de madeira. Atordoada pelo impacto, Jean sente uma dor aguda percorrer seu rosto enquanto o sangue começa a escorrer de seu nariz e, ainda zonza e com a visão embaçada, vê os respingos manchando o carpete.  
    — SUA FILHA DA PUTA! — Ele grita.
     Juntando forças, a garota consegue se levantar, mas é surpreendida pelo abraço de Jones, que a agarra por trás. Jean se debate, mas de nada adianta. E suas tentativas só parecem irritá-lo ainda mais.
    Enquanto Jean continua a resistir, a força de Jones parece aumentar, seu aperto no corpo dela cada vez mais opressor. A sensação de asfixia se intensifica, fazendo-a temer pelo pior.
     Sem dizer absolutamente nada, Jones a arrasta de volta para o quarto. Jean se debatendo.
     — Por favor…— Jean pede, sentindo o gosto de ferrugem do sangue que desce de seu nariz entrando em sua boca.
     — Você veio aqui com um propósito, lembra? — Jones zomba, não se importando com quão ela tenta fugir. 
     Ele a joga com força sobre a cama, Jean, eufórica, tenta sair dos lençois, mas novamente é surpreendida pelo toque de suas mãos. Ela tenta chutá-lo, mas sua força parece se suspender.
      — Não…por favor…— Ela luta para controlar o tremor em sua voz.
     Ele a agarra pelas mãos, a garota até o morde, mas é surpreendida com um tapa como resposta, fazendo respingos de sangue de seu nariz espalharem-se nas cobertas.
     — Você acha mesmo que pode me enganar assim, hein? — Ele diz, a pretendo contra as almofadas. — SUA VADIA BURRA!
     Jean está horrorizada, soltando grunhidos que se resumem à súplica à medida que o agressor aperta seu seio. O desespero a consome enquanto ela olha ao redor em busca de uma saída, mas o quarto parece se fechar ao seu aspecto. Como um cubículo amaldiçoado. O ar se torna pesado, sufocante, e ela tem a sensação de estar encurralada em um pesadelo sem fim.
     As palavras ameaçadoras de Jones ecoam em sua mente, aumentando seu pavor a cada segundo que passa.
     Com o medo tomando conta de seus pensamentos, Jean se esforça para esticar o braço até a perna, buscando desesperadamente o punhal que havia escondido ali antes, entre a meia. Cada movimento é rápido. Seus dedos tremem enquanto deslizam pela parte interna de sua coxa, em busca do objeto que pode se tornar sua única esperança de saída. Cada toque é uma lembrança de que ela está lutando por sua vida, e que não pode falhar.
     O suor frio escorre pela testa de Jean, mas ela ignora qualquer desconforto físico, mesmo que os toques de Jones a façam querer morrer. Seus movimentos são articulados e rápidos, pois qualquer deslize poderia alertar ele para suas intenções e pôr fim a qualquer chance de escapar.  
     Com um movimento rápido e preciso, Jean olha em direção a Jones, o punhal em sua mão. Seus olhares se encontram, um misto de medo e fúria preenchendo o espaço entre eles. Ela sabe que não pode hesitar, que precisa agir antes que seja tarde demais. Com muita urgência, acompanhado de um grito gutural que preenche a cabana, o punhal corta o ar em direção a Jones, deslizando no pescoço dele, fazendo-o colocar a mão para cessar o sangramento em seguida.
     Ele não teve reação.
     Ele parece mudo ao se afastar de Jean, com sangue passando entre seus dedos enquanto tenta cessar o sangramento. Seus olhos estão amarelados, encarando-a feito uma assombração. Tão espantoso feito a fúria de um furacão.
     Ele até tenta falar, mas sua boca é consumida por saliva vermelha. Vermelha de sangue. O mesmo sangue que jorrou no rosto de Jean, que ainda está se recuperando do que fez, segurando o punhal com a mão trêmula.
     Ele, novamente, tenta sibilar algo, mas o sangue que sai de sua boca consome suas palavras.
     Jean observa da cama, a respiração pesada, sem reação alguma com o objeto em mãos pingando nos lençóis. Jones até tenta avançar em direção a ela, mas acaba escorregando no próprio sangue, caindo logo em seguida.
     Jean segurou o punhal com força e cerrou os dentes por nervosismo. Piscou duas vezes, pensando ter desacordado ou algo assim, porque isso só poderia ser um pesadelo. E ela preferia que fosse.
     Ao vê-lo se debruçar e se engasgar com o próprio sangue, não pode negar que sentiu um certo alívio, mas precisava se livrar disso tudo.
    De início, ela sai da cama e olha para o corpo ao chão. Ela não sabe muito como deve agir. essa situação a deixa meio desconexa e angustiada. Deixando seus movimentos mais lentos e quase intermináveis. E ela também jura que está vendo as coisas multiplicadas, como se estivesse anestesiada ou drogada.
     Após um instante de reflexão, ela cerrou os olhos.
     — Hm… me desculpe…— Então, sem nem mesmo conseguir controlar, Jean começa a chorar. Sua respiração fica mais forte à medida em que olha para o corpo à sua frente, ensanguentado e suplicando por vida.
     — Foi, foi,...— Ela olha para o corpo no chão. — Foi em legítima defesa…— Bom, é claro que as autoridades não iriam acreditar em uma pobretona da Zona Sul. Uma pé rapada. Ainda mais quando descobrirem o porquê de a encontrarem ali. Na maldita cabana com um cadáver de um homem hetero, branco e de — provavelmente bom status — no chão.
     Ela engole em seco, tirando essa ideia da cabeça, colocando os fios loiros para trás da orelha. Levanta, vai até o banheiro do cômodo, olha para o espelho, liga a torneira e depois lava o rosto, fazendo o vermelho escorrer pelo ralo. Jean se analisou, encarando seu reflexo mórbido. Ela também mexe no braço, tentando apagar as marcas que Jones deixou, assim como a mesma que preenche seu rosto devido ao tapa. Ela o sente arder.
     Ao seu lado, há uma banheira, e Jean tem uma ideia. Ela sai do banheiro, passando por cima do corpo de Jones, tomando cuidado para não pisar no sangue. Segue para a sala, onde deixou a bolsa caída depois da luta corporal, abriu o zíper da mochila pegou seu celular.
       JEAN: oi, Bea, estou com problemas
       Bea devia estar dormindo naquele instante. Já é tarde e ela não pode fazer nada.
      jean tem que ser rápida e prática, sem deixar seus resquícios ali. Ela prendeu o cabelo em um rabo de cavalo, ajustando a respiração e racionando a situação.
     De volta ao quarto, com cuidado, pegou o celular de Jones, colocou a digital dele no aparelho e apagou as mensagens que tivera como ele. Depois do feito, ela arrastou o corpo de Jones para a suíte, de maneira cambaleante.
     Com certa dificuldade, ela levantou o corpo inerte e o colocou com cuidado dentro da banheira. A água, logo, foi tingida com o sangue que escorria do ferimento do pescoço, se espalhando no local. Com precisão cirúrgica, ela posicionou o punhal entre os dedos dele, simulando que ele havia cometido o ato contra si mesmo. Cada movimento foi calculado, cada gesto ensaiado para criar a imagem de um suicídio perfeito.
     Depois desse feito, ela parte para o passo seguinte. Jean procura pelos cômodos da cabana por produtos de limpeza, mas não encontra nada, até que, avista a garrafa de vinho pela metade na mesinha de cabeceira. Ela não sabe se é adequado, mas pode acabar dando certo.
     Com cuidado, ela saiu  para fora da cabana, com os lençóis em mãos, caminhou até uma certa distância na floresta escura, com apenas a lanterna do aparelho iluminando sua vista. Depois de certa lonjura, com as mãos trêmulas, derramou o restante do vinho sobre os lençóis manchados, misturando o rubro do sangue com o vermelho profundo da bebida. Com um isqueiro em mãos, Jean acendeu o fogo, testemunhando as chamas dançarem e consumirem os vestígios do ocorrido.
     Depois retornou à cabana, certificando - se de colocar os objetos no devido lugar e limpar os respingos que estavam no piso da sala e no quarto e as digitais na maçaneta. E enquanto ainda estava na sala, comendo um salgadinho de forma dramática antes de deixar a cena do crime, ela viu o envelope com o dinheiro no chão. Ele tinha manchas de sangue. Então o guardou na mochila.
     Havia conseguido dinheiro. Ela e Bea teriam um lugar para morar.
    Mesmo com sangue seco nas vestes, Jean saiu da cabana, pegou bicicleta, ainda sentindo-se atordoada, e saiu, sumindo pela estrada de terra para chegar à Avenida entre os pinheirais sob a escuridão.
     E bem, até que suas pesquisas na internet lhe ajudaram um pouco.

Garotas Mortas Não Contam Segredos| Conto.Onde histórias criam vida. Descubra agora