Capítulo Um

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Somerset, Inglaterra, 1815

O sol da manhã lutava para atravessar a névoa que pairava sobre os campos de Renfield Park, criando um véu etéreo sobre a propriedade ancestral dos Sinclair. Alexander Edmund Sinclair, agora Barão de Renfield aos vinte e cinco anos, permanecia imóvel diante da grande janela do escritório de seu pai, seus olhos percorrendo as terras que haviam sido o lar de sua família por gerações.
Cada árvore, cada colina, cada pedra do caminho guardava uma memória. Ali, sob o grande carvalho, ele havia aprendido a montar, as risadas de sua mãe, Lady Cecília, ecoando enquanto o jovem Alex caía e se levantava repetidamente, determinado a dominar a arte da equitação. Naquele riacho cristalino, passara tardes de verão pescando, observando o pai com uma mistura de admiração e temor, sempre ansioso por um raro momento de aprovação.
E no bosque de teixos...
Alexander fechou os olhos, a dor da lembrança ainda aguda mesmo após oito anos. O bosque de teixos, onde ele e Frederick haviam compartilhado momentos roubados de felicidade, longe dos olhares reprovadores e das expectativas sufocantes. Aquelas árvores antigas haviam sido testemunhas silenciosas de promessas sussurradas e corações partidos.
Seus olhos vagaram para a escrivaninha maciça de mogno, ainda coberta com papéis e livros contábeis. Alexander se aproximou, seus dedos roçando levemente a superfície polida. Quantas noites ele havia passado ali nos últimos anos, debruçado sobre esses mesmos livros, tentando desesperadamente encontrar uma maneira de salvar Renfield Park?
As lembranças o assaltaram, amargas e dolorosas.
Cinco anos antes naquele mesmo escritório, ele tinha tentado colocar algum senso na cabeça do pai:
— Pai, por favor — Alexander implorara, sua voz tensa com frustração contida. — Não podemos continuar assim. As dívidas estão se acumulando e…
— Silêncio! — O Barão James Sinclair bateu com força na mesa, fazendo os copos de conhaque tremerem. Seus olhos, injetados e turvos pelo álcool, fixaram-se em Alexander com uma mistura de raiva e desprezo. — Você ousa me dizer como administrar minha própria propriedade? Meu próprio legado?
Alexander respirou fundo, lutando para manter a compostura.
— Não se trata de ousar, pai. É uma questão de necessidade. Os credores estão ficando impacientes, e se não tomarmos medidas…
— Medidas? — James riu, um som áspero e sem humor. — E que medidas você sugere, meu filho tão sábio? Que eu pare de jogar? Que eu pare de viver como um Sinclair deveria?
— Se for necessário, sim — Alexander responderá, sua voz baixa mas firme. — Renfield Park está à beira da ruína. Se continuarmos assim, não haverá legado para preservar.

Por um momento, algo parecido com vergonha passou pelo rosto do velho Barão. Mas foi rapidamente substituído pela familiar máscara de arrogância.
— Você não entende nada sobre honra, sobre o que significa carregar o nome Sinclair. Seu avô…
— Meu avô construiu esta propriedade com trabalho duro e administração cuidadosa — Alexander interrompeu, sua paciência finalmente se esgotando. — Ele ficaria horrorizado em ver como você está desperdiçando tudo pelo que ele trabalhou.
O tapa veio rápido e forte, pegando Alexander de surpresa. Ele cambaleou para trás, o gosto metálico de sangue em sua boca.
— Saia da minha vista — James rosnara. — Quando você entender o que significa ser um verdadeiro Sinclair, talvez possamos ter esta conversa novamente.
Alexander saiu do escritório, seus punhos cerrados e seu coração pesado. No corredor, encontrou sua mãe, Lady Cecilia, seu rosto uma máscara de preocupação e simpatia.
— Oh, Alex — ela murmurou, tocando gentilmente o rosto do filho. — Eu sinto muito. Seu pai... ele nem sempre foi assim.
— Eu sei, mãe — Alexander respondeu, cobrindo a mão dela com a sua. — Mas não posso ficar parado enquanto ele destrói tudo.
Lady Cecília assentiu, seus olhos cheios de uma mistura de tristeza e determinação.
— Você é um bom homem, Alex. Nunca se esqueça disso.
No fim o Barão, com sua vaidade e orgulho botara a perder o legado de que tanto se vangloriava.
O som de passos no corredor trouxe Alexander de volta ao presente. Ele piscou, afastando as memórias dolorosas.
— Milorde? — A voz de Jennings, o mordomo da família há mais de três décadas, interrompeu seus pensamentos. — A carruagem está pronta, senhor. Lady Cecília e a senhorita Elizabeth o aguardam.
Alexander assentiu, incapaz de confiar em sua voz naquele momento. Ele deu uma última olhada no escritório, os olhos pousando no retrato de seu avô sobre a lareira. O falecido Barão parecia olhar para ele, como se compartilhasse sua tristeza ante a situação de sua família.
— Sinto muito, vovô — Alexander murmurou. — Eu falhei com você, com nossa família.
As dívidas, os empréstimos mal-sucedidos, as colheitas fracassadas – tudo havia se acumulado até que não houvesse outra escolha senão vender Renfield Park. A propriedade que havia sido o orgulho dos Sinclair por séculos agora passaria para as mãos de um estranho.
— Milorde — Jennings falou novamente, sua voz gentil. — O Sr. Bings deixou este envelope para o senhor. Disse que contém os detalhes finais da transação.
Alexander pegou o envelope com relutância.
— Obrigado, Jennings. Por tudo.
O velho mordomo fez uma reverência, seus olhos brilhando com lágrimas não derramadas. — Foi uma honra servir a sua família, Milorde. Se me permite dizer, seu avô ficaria orgulhoso da dignidade com que o senhor enfrentou esta situação.
Alexander sentiu um nó na garganta.
— Obrigado. Suas Palavras significam mais do que posso expressar.
O velho mordomo sorriu, fez uma última mesura e partiu, ele ficaria em Renfield para servir ao novo dono, afinal aquele era seu lar também, e já estava velho demais para recomeçar do zero.
Sozinho novamente, Alexander abriu o envelope. A maioria dos documentos era o que ele esperava – registros de transferência, detalhes financeiros. Mas uma nota em particular chamou sua atenção.

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