Eu estava a 3 minutos de um ataque cardíaco.
Não 5, nem 10, porque, desta forma, pareceria muito cordial ou algo excessivamente planejado, fictício. Somente 3, como o compasso ternário, de três tempos, do metrônomo que ressoava no retorno posto em meus ouvidos, sinalizando a contagem certa da última música a ser apresentada naquela noite. Noite tão emblemática. Tão...esclarecedora.
As pessoas vieram, realmente. Os ingressos foram comprados, filas foram feitas nas portas de entrada do espaço. As pessoas se comprometeram a vir e a demonstrar tão calorosamente o amor que sentem por mim. Por meu trabalho. E a sensação é tão engrandecedora, cheia de si, que fica impossível distinguir onde o deslumbramento começa e a preocupação termina, como se ambas sensações fossem fundidas e trouxessem a esse estado mesquinho de nebulosidade pensante que faz ecoar, no final da cabeça, a formação: eu existo apesar dela. Dela, Faye. "Apesar", não, mas ainda que. Eu existo ainda que ela. Ainda que seu ser fosse de inenarrável inevitabilidade, as pessoas, aqui, vieram por conta de mim. Do meu trabalho, que também existia ainda que ela fosse ela.
Esse simples axioma não foi em vão, também. Foi o que ela me disse ontem à tarde, previamente a uma negação auto depreciativa de descrença destilada por minha parte. Não, Faye, eu não conseguiria. Mesmo assim, fiz a promessa, porque queria alimentar nossa confiança uma na outra e exercitar os laços de companheirismo à vontade de p'wan.Agora, no entanto, é outra coisa. Outro cenário, outra constatação que remete a uma sensação de êxtase de ter conseguido, de fato. Eu estive aqui, eu vivi tudo isso. Com eles. Recebendo amores e lágrimas de incredulidade. Da minha mãe, inclusive, que sorriu orgulhosa do outro lado da plateia quando, por nítida franqueza, decidi cortar uma das músicas ao meio só para compartilhar a promessa que tínhamos feito na noite de ontem. Faye e eu. Ela, dizendo em sussurros e afagos tão doces que eu seria motivo de orgulho. Eu, jurando promessas vazias e implorando, religiosamente, para que ela se encontrasse além do luto. O choro, naquele momento, narrou, em letras garrafais, o quanto eu sentia. Sentia medo, sentia angústia, sentia sua falta, por mais que nem 24 horas ainda tivessem nos distanciado. Sei apontar esses fatos não por integra consciência, mas porque, ao voltar ao camarim após o vídeo, p'wan me fitou com olhos distantes e apertou os lábios em empatia.
Pensando, agora, é tão estranho como circunstâncias alheias alteraram a dinâmica do nosso relacionamento. Os acontecimentos, em sequência, fizeram florescer um lado obscurado de nossas personas que, por tanto tempo, foram forçadas a conviver a ponto de saber distinguir um suspiro, ao final do dia, de cansaço de um satisfatório, de dever cumprido. Eu sei cada traço etereamente desejado em seu rosto, e, enquanto assistia ao vídeo passado de supetão numa tentativa falha de suprir a lacuna de sua ausência onipresente, caí na realização de que não queria mais ser essa Yoko de coração tão leviano.
Por isso, a 3 minutos de um ataque cardíaco interrompido pelo excesso de palmas e gritos de euforia.
Eu consegui.
O abraço inesperado de p'wan me faz cambalear, ameaçando nossa queda, quando retorno definitivamente ao camarim, agora. Ela não é de contato, então esboço surpresa quando me devolve ao quarto agora alvoroçado por staff, vozes e produtores.
- você foi incrível - diz e, quando diz, é sempre ouvido, porque, bem, é ela. Nem ao menos estaria aqui se não fosse.
Alguém, nesse intervalo, coloca um copo d'água servido com canudo em minhas mãos, após um aperto de ombro como congratulação. Minha mãos, em volta, tremem. Yoko, também, é falado daqui e dali, a todo tempo. Não consigo distinguir muitas outras coisas, porque o fluxo é rápido de movimentos, pessoas, conversas. Tenho de piscar os olhos forçosamente a fim de retomar a consciência de estado naquele local, o corpo respingando o exílio de uma adrenalina hiper estimulada. Por um mísero momento, acredito p'wan ter percebido o sobrecarregamento, porque os dedos ameaçam me alcançar quando calça uma feição mais interrogativa do que realizada. No entanto, qualquer movimento idealizado de fuga, por ela ou por mim, foi interrompido por outra voz alvoroçada e tão acolhedora.
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Amáveis.
FanfictionHistória com uma abordagem diferente do que aconteceu após o evento de aniversário da Yoko. - está tudo bem querê-la - Neko diz, agora em palavras tão simplificadas. Está tudo bem querê-la. Ecoa incessantemente na beirada da minha mente. Yoko...