POSLÚDIO

10 2 0
                                    

ANTES

— Yann também matou meu avô, Stephen.

Isaac pisca repetidamente, estarrecido. Seu olhar é de pura incredulidade enquanto processa a informação que Nim acabou de fornecer.

O silêncio entre eles é quase palpável, carregado de tensão e surpresa.

— Eu já devia imaginar — murmura Isaac depois de alguns instantes, a voz quase inaudível, como se estivesse falando com seus botões.

— É, devia — confirma Nim com um tom sombrio e resignado, seus olhos agora fixos nas estrelas distantes.

Os dois compartilham mais alguns minutos de silêncio. De soslaio, Nim percebe que as mãos de Isaac estão inquietas no colo, os movimentos suaves de seus dedos lembrando muito os de um pianista. Ele se pergunta que música Isaac pode estar "tocando".

O quarto é grande demais e faz Nim se sentir muito pequeno. Ele não gosta de se sentir assim. Muito menos esta noite — com a conversa que teve com Joshua mais cedo se repetindo sem parar em sua cabeça, o pedido que ele lhe fez parecendo esmagá-lo com a força de uma bala de canhão.

— É verdade que sua família morou no Bosque de Verão por um tempo? — pergunta Isaac de repente, quebrando o silêncio com uma voz que tenta disfarçar a curiosidade e a apreensão. Nim assente devagar, seus olhos ainda perdidos nas reflexões e nas estrelas. — E foi de lá que o Encantador sequestrou Brian? Da mesma clareira onde ele me encontrou?

— Brian? — Nim franze a testa. — Como assim?

Isaac se endireita no banco, seu corpo tenso como uma corda prestes a se partir. Ele olha para a noite enluarada do outro lado da janela e diz:

— Na clareira, Yann disse "foi aqui que conheci o menino Jansen". Disse que sua família morava no Bosque de Verão. — Ele ri levemente. — Claro, isso foi muito antes de você nascer, mas estava me perguntando se você sabe se isso é verdade.

Nim encara Isaac em silêncio, ainda sem relaxar a testa.

— Hã, sim, minha família residiu na Cidade do Solário no passado, mas, er... — Ele pigarreia uma vez. — Isaac, estou achando que Hearley não lhe contou a história toda, ou que você não prestou muita atenção ao que ele contou — diz ele, sua voz transmitindo frustração.

Isaac o encara imediatamente.

— O que está dizendo?

— Estou dizendo que você entendeu errado.

Agora ele tem a total atenção de Isaac. Ele diz:

— O Encantador não levou Brian para a Ilha dos Letíferos. Brian foi porque quis.

— Porque quis? — a voz de Isaac se eleva em um tom de incredulidade. — Que história é essa?

Nim tomba o corpo para frente, o olhar penetrante.

— O garoto na clareira não era Brian, era meu pai.

O rosto de Isaac se petrifica numa máscara vazia.

Ele continua:

— Brian era o primogênito, o irmão mais velho. E meu pai, Bruce, era o caçula. Foi o meu pai — ele adiciona ênfase à fala — quem o Encantador encontrou na clareira e levou para a ilha.

A revelação faz o ar parecer ainda mais denso, e Isaac fica sem palavras enquanto seu cérebro conecta as novas peças do quebra-cabeça. Abre a boca para falar, mas as palavras não vêm com facilidade.

— Então... o que ele... como ele... — é só o que consegue articular.

Nim dá um suspiro vacilante, como quem se prepara para mergulhar em águas profundas e turbulentas.

— Ouça — começa ele. — Meu avô formou uma equipe de busca. Brian, determinado a ajudar a salvar o irmãozinho, fez questão de se juntar à missão. Eles desobedeceram às ordens de Elim e navegaram pelo traiçoeiro Mar do Crepúsculo. Com muita dificuldade, chegaram até a Ilha dos Letíferos, onde vagaram por dias, enfrentando perigos inimagináveis, até que conseguiram se infiltrar no covil de Fidis, oculto nos recônditos mais profundos da ilha. Não sei os detalhes exatos do que aconteceu lá dentro, mas é fato que tanto Stephen quanto Brian foram mortos pelo Encantador. Da equipe inicial de oito homens, apenas dois escaparam. Eles conseguiram resgatar meu pai do covil e o trouxeram de volta ao continente. Mas o custo foi alto demais.

Ao concluir o relato, Nim observa o rosto de Isaac vigilantemente, já à espera de uma explosão. Porque Isaac é assim. Ele elimina uma vontade de sorrir, pensando em como aprendeu tanto sobre Isaac em tão pouco tempo de convivência.

O rosto de Isaac não esboça terror, somente surpresa.

— Ah — ele diz. E isso é tudo.

Nim relaxa um pouco, feliz em ver que o cérebro do amigo não fritou.

Ambos viram a cabeça para a janela. A vista é linda, mas Nim não consegue achar conforto nela. Não esta noite. Nesse momento, a noite apenas o angustia.

Ele pensa no pai e no que ele viu enquanto esteve na ilha.

Isaac, por outro lado, mal enxerga mais as estrelas que povoam o negror. Seus olhos não dão mais atenção à lua prateada ao longe. Está com a consciência cheia, os pensamentos vagando por veredas confusas. Ele sabe que, ao sair deste quarto, irá até o salão do trono falar com Joshua para tentar descobrir uma forma mais fácil de resolver as coisas — por Nim, por Mei e Chen, por si mesmo. Mas, por enquanto, ele se recosta na parede, estica as pernas sobre o banco e finge apreciar o céu noturno.

Em meio a todos os diferentes pensamentos que lhe ocorrem, um em particular consegue se sobressair mais do que os outros.

Ele pensa no garoto na clareira, o garoto que foi levado e conseguiu voltar.

. . . . . . . . . . . . . . . .

Gostou da história? Por favor, não deixe de curtir e comentar.

NeblinaOnde histórias criam vida. Descubra agora