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Lívia Turgueniev

• DIAS ATUAIS •

Meu corpo lutava contra o cansaço de uma viagem de mais de dezenove horas. É estranho estar de volta depois de tanto tempo. Se dependesse de mim, nunca teríamos saído de Moscou. Lá é nosso verdadeiro lar, não aqui. Aqui, não temos nada, ninguém... apenas a falsidade daqueles que fingem estar próximos.

Quando eu era mais nova, acreditava que pelo menos tinha essas pessoas. Mas hoje percebo o quanto estava enganada. Eu nunca tive ninguém além da minha mãe.

As promessas deles foram tão falsas quanto os sentimentos que alegavam ter por mim. No final, me deixaram sozinha... e ferida. A dor que causaram ainda vive em mim, mesmo depois de tantos anos.

Eu só voltei por causa da minha família. Já aceitei a verdade, mas antes de tudo, quero deixar claro que ninguém poderia impedir isso.

— Tem certeza que ficará bem, моя любовь? — A voz da minha mãe me puxou de volta dos meus pensamentos. Era a milésima vez que ela perguntava isso.

— Tenho, мать. Pode ficar tranquila. Eu vou ficar bem. — Ela me lançou um olhar desconfiado. — Prometo que, se eu não estiver bem, te ligo na hora, ok?

— Tudo bem. Mas se eu descobrir que você não está se cuidando ou seguindo o tratamento como deve, você volta para casa! — Concordei com um sorriso, selando sua bochecha e arrancando dela outro sorriso em resposta.

Yelena Turgueniev, a mulher mais forte que eu conheço. Sempre me incentivou a correr atrás dos meus sonhos e me ensinou a não depender de ninguém. Quando meu pai, Ivan Turgueniev, morreu, todos pensaram que ela se fecharia para o mundo, afinal, quem perde o marido aos vinte e dois anos e continua de pé?

Mas minha mãe provou que estavam errados.

Ela é a pessoa que mais me ama no mundo, e devo tudo a ela. Ela me ensinou tudo o que sei, e quero que saiba que fiz o possível para provar que foi a melhor mãe que eu poderia ter. Nada disso é culpa dela. Quero que ela viva a vida intensamente, como sempre me pediu, que encontre sua felicidade de novo.

— Bom, preciso descansar. Amanhã tenho que resolver as pendências da faculdade — disse, levantando-me do sofá. Havíamos chegado em casa há poucos minutos.

— Já passou da hora mesmo. Quando chegar ao Delcour, me manda uma mensagem, ok? — respondeu, me acompanhando até a porta. — Ah, e qualquer coisa, me liga ou vai até o apartamento do Andrei. Fica no bloco abaixo do seu. — Fiquei surpresa ao saber que Andrei também moraria lá.

— Мать, você prometeu que confiaria em mim! — cruzei os braços, emburrada. Ela havia prometido!

— Sim, eu prometi dar seu espaço, mas não prometi te deixar desprotegida! — rebateu, com a seriedade que não durava muito. — Sabe como as coisas são, Lívia. Não posso te deixar sem alguém de confiança por perto. Eu confio em você, mas quero ter certeza de que estará segura. — Fechei os olhos, sentindo o carinho de sua mão em meu rosto. — Eu te amo, моя любовь. Vou ficar mais tranquila sabendo que Andrei estará com você.

Suspirei, desistindo da discussão.

— Я тоже тебя люблю, мама — respondi, enquanto ela me abraçava apertado e beijava meus cabelos.

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Depois de uma longa conversa com o senhor Patterson, ele me deixou sozinha no novo apartamento. Pelo que entendi, ninguém mais mora no mesmo andar, já que o apartamento ao lado está desocupado.

Como eu esperava, o lugar já está todo arrumado, igual à nossa casa, então só me resta desfazer as malas. O apartamento é grande, até me surpreende minha mãe não ter pego a cobertura. A decoração é em tons escuros, com algumas poucas fotos espalhadas pelas paredes.

Conectei os fones no celular e coloquei minha playlist para tocar. Peguei a mala e a coloquei em cima da cama. Não estou com sono e, sinceramente, não tenho nada melhor para fazer.

Enquanto organizava minhas roupas, pensamentos começaram a inundar minha mente. Talvez seja um alívio estar longe de Moscou, longe dos olhares de pena, especialmente daqueles que me amam. Aqueles olhares estavam me afogando, puxando-me mais fundo no oceano de angústia, culpa e dor. Mas, ao mesmo tempo, estar aqui me deixa ansiosa, com uma sensação constante de que algo ruim pode acontecer a qualquer momento.

Minha mente vem me pregando peças, destruindo-me aos poucos.

Ao mexer nos meus colares, encontrei o crucifixo de ouro branco, um presente de muitos anos atrás.

Anos atrás

— Não vou pegar leve com você — o moreno disse, afastando-se para ir até o carro.

— Não espero que pegue — respondi, entrando no meu carro. Vi um sorriso discreto em seus lábios enquanto ele se preparava no carro ao lado.

— Pronta? — A adrenalina corria pelas minhas veias, antecipando o que viria a seguir.

— Да — respondi, e logo ouvi o som do acelerador.

Nós corríamos pela cidade, sempre lado a lado. Poucos momentos nos separavam. Eventualmente, paramos em frente à igreja abandonada, estacionando os carros. Meu coração ainda batia forte no peito.

Não demorou muito para que eu sentisse seus braços me puxando para perto.

— Você foi incrível, senhorita Torrance — ele sussurrou no meu ouvido, beijando meu pescoço.

— Obrigada, senhor Torrance, mas acho que errou o sobrenome. É Turgueniev, não Torrance — brinquei. Ele riu e me puxou para um beijo.

— E quanto a isso? — Ele passou o dedo pelo meu colar, quase idêntico ao dele.

• • •

Voltei para o presente, enxugando a única lágrima que escorreu pelo meu rosto. Coloquei o crucifixo no porta-joias, fechando-o cuidadosamente.

 Coloquei o crucifixo no porta-joias, fechando-o cuidadosamente

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Tradução

моя любовь = Meu amor
• мать = Mamãe/ mãe
• Я тоже тебя люблю, мама = Eu também te amo mamãe
• Да = Sim

⤞ 𝐌𝐨𝐲 𝐚𝐧𝐠𝐞𝐥𝐨𝐜𝐡𝐞𝐤 ────── 𝐃𝐚𝐦𝐨𝐧 𝐓𝐨𝐫𝐫𝐚𝐧𝐜𝐞 ⤟Onde histórias criam vida. Descubra agora