Capítulo 03

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João Campos me guia até o carro, segurando as minhas mãos com firmeza. Eu estava nervosa, era a primeira vez que saia com um garoto em toda a minha vida. Sempre priorizei os estudos e os meus objetivos de vida, mas precisava relaxar um pouco e começar a viver a vida de outra forma. Ele abre a porta do carro, entro devagar notando o painel brilhante ao meu lado.

— Fique tranquila, eu sei dirigir bem. — ele brinca, me arrancando uma gargalhada.

Observo-o fechar a porta do veículo, o contornando em seguida para sentar ao meu lado. 

— Está pronta para ter a melhor noite da sua vida? — ele pergunta, visivelmente animado.

— Um pouco assustada, talvez. — admito, olhando para as minhas mãos — Nunca saí para festas ou até mesmo casamentos, não sei muito bem como me comportar nestas situações.

Ele dá a partida, me impressionando por ser tão atencioso ao dirigir. Adolescentes do meu bairro costumavam correr nas ruas com suas motos, o que me deixava bastante assustada. Mas eu sabia, lá no fundo, que João era diferente. Ele vinha de uma família nobre, a mais rica da cidade. Sempre estudou em boas escolas e possui uma lista invejável de cursos de idiomas.

— Fique tranquila, estarei ao seu lado o tempo todo. — ele me dá uma piscadela — Você só precisa se soltar, conversar com o pessoal e dançar um pouco.

— Dançar? — rio alto — Nem pensar, sempre fui péssima nisso. 

Ele sorri, enquanto vira uma curva sinuosa. Reparo em suas mãos firmes no volante, suas veias saltadas realçando o relógio Rolex em seu pulso. Um frio percorre pela minha espinha, me fazendo estremecer. João nota o meu olhar, dando um sorriso amarelo e orgulhoso, provavelmente convencido de que eu estava me apaixonando por ele.

Eu não poderia mentir mesmo se quisesse, mas eu não estava apixonada. Mesmo tentando me forçar a sentir algo e enxergar coisas que eu nunca vi antes, meu coração parecia construir uma barreira para ele. Mesmo estando ali em seu carro, centímetros de distância, minha mente pensava em Pablo. 

— Eu sei que não está fazendo isso por mim, você não precisa tentar sentir algo que não queira. 

Meu coração erra uma batida. Meus olhos se arregalam, encontrando os dele.

— Você sempre foi uma garota muito transparente, Tábata. — sua voz era calma, despreocupada — Sempre percebi que gostava do Pablo Marçal, seus olhares não enganam a ninguém.

— Nin-ninguém? — gaguejo.

— A forma como você sorri quando ele fala, como o analisa enquanto ele apenas está existindo... até um cego perceberia a tensão que sai de você.

Ele sorri, desconfortável. O que ele estaria pensando agora, que estava tentando enganar-lo ou algo parecido? Que o estava usando de tapa buraco?

— Olha, me desculpe se... — tento me desculpar.

— Não é por isso que te convidei para vir comigo a festa, Tábata. 

Escutar o meu nome em sua boca me fez sentir estranha. Ele parecia nervoso e ao mesmo tempo calmo demais. Me apertei contra o banco, tentando abafar minha respiração acelerada.

— Por muito tempo eu tive o mesmo pensamento que você. O pensamento de dor por não ser correspondido, de tentar superar a qualquer custo, mas este custo ser caro demais. Gastando minhas noites sem dormir, minha má concentração e meu ciúmes exagerado. Você tem noção o quanto eu me culpei? — ele me encara, seus olhos enxendo de lágrimas.

— Desculpe, eu não estou entendendo. 

Os seus pés pisam fundo no acelerador, me fazendo estremecer.

— João, por...

— Eu não vou ficar mais parado enquanto eu vejo você... definhar por esse otário. — ele cospe as palavras, nervoso. — A partir de agora eu irei tomar a decisão que sempre fui um covarde em não ter tomado antes. 

Minha cabeçava girava, tentando processar todas as informações. Eu estava sonhando ou aquilo era um jogo? Estavam tentando pregar uma peça em mim?

— Irei lutar por você, como aquele desgraçado nunca teve coragem. Talvez não seja hoje ou amanhã, mas eu prometo que irei te fazer feliz até o último segundo da minha vida.

João estaciona o carro a dois metros da entrada da festa, o som de alguma música pop preenchiam o ambiente. Minhas mãos estavam trêmulas, meu sistema havia entrado em pane. O que estava acontecendo? Ontem eu era a garota rejeitada por todos e hoje eu sou o tipo ideal de alguém que nunca havia demonstrado isso antes?

— Eu sempre amei você, desde o primeiro dia em que a vi. — ele confessa, soltando cinto de segurança e segurando o meu rosto delicadamente — Quando você entrou pela porta daquela sala no jardim de infância, os olhos vermelhos de tanto chorar e as bochechas coradas. Quando se sentou ao meu lado, não encarando ninguém além do quadro a nossa frente. Eu sabia que era você, desde o início de tudo. Eu sabia que era por você que o meu coração sempre iria bater, respirar, amar, se dedicar.

Ele retira uma mecha de cabelo do meu rosto, sorrindo.

— Pode me culpar por ter sido um babaca com você por todos estes anos. — continua — Por não ter te dado a atenção que merecia e por não ter demonstrado todo o meu amor por você. Eu estava sendo um tolo, um covarde. Eu tinha medo de ser rejeitado. Porque, assim como eu havia encontrado a razão da minha existência naquele dia, eu soube que você havia também encontrado a sua. Mas não irei repetir os mesmos erros, estou disposto a  mudar este quadro mesmo que meu coração se parta um bilhão de vezes tentando.

João Campos se aproxima, seus lábios macios encontram a minha bochecha. Sinto o calor do seu corpo contra a minha pele, seu beijo demorado acariciar o meu rosto. Eu não sabia como reagir ou o que responder, estava em choque demais tentando assimiliar algo que estava a minha frente todos estes anos e nunca fora capaz de perceber. 

— Eu não irei desistir de você, Tábata Amaral. Eu amo cada detalhe seu e sempre irei amar.

Seus braços encontram o meu corpo em um abraço apertado. Antes de fechar os olhos e me entregar naquela sensação, vejo a silhueta de Pablo Marçal nos encarando, seus punhos cerrados ao lado do corpo. 

Todas as Cartas Que Eu Nunca Enviei | Pablo Marçal e Tábata AmaralOnde histórias criam vida. Descubra agora