Sin, two

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Sister Ellaeynor

Minha infância foi marcada por momentos de luz e sombra. Lembro-me dos dias ensolarados em que brincava no quintal, mas, nas profundezas da minha mente, as memórias dolorosas estão sempre presentes. Cresci em uma casa onde a fé era um pilar, mas também onde a escuridão se escondia nas sombras. Meu pai era um homem severo, exigente. Sua disciplina muitas vezes ultrapassava os limites, e os gritos ecoavam em nossa casa como um trovão.

Foi em uma noite fatídica que tudo mudou. Um desentendimento, um copo quebrado, e a raiva acumulada explodiu. Lembro-me de estar encolhida no canto da sala, os olhos arregalados de medo enquanto ele se aproximava, seus olhos escuros cheios de frustração. A dor daquela noite nunca se apagou; sua voz ressoando em minha cabeça, uma lembrança constante da fragilidade da vida.

Depois daquela noite, a ideia de escapar começou a germinar dentro de mim. A busca por um lugar seguro se tornou uma obsessão. Foi durante uma visita a uma paróquia próxima que conheci as freiras. Sua serenidade e compaixão eram como um bálsamo para minha alma ferida. Eu queria ser como elas, alguém que oferecesse amor e cuidado ao invés de medo e dor.

O momento decisivo veio durante uma missa, quando o padre falou sobre perdão e redenção. Enquanto ouvia suas palavras, uma luz se acendeu dentro de mim. Eu queria transformar minha dor em algo significativo, e a ideia de me tornar freira começou a crescer. Era mais do que uma decisão; era um chamado profundo que parecia ter sido plantado em meu coração por Deus.

Dias atuais.

Levanto-me da cama e coloco meu hábito com cuidado. O tecido é simples, mas cada dobra me lembra da vida que escolhi. O hábito, com seu véu que cobre meu cabelo, traz uma sensação de conforto e segurança. Dirijo-me à capela, onde a luz suave das velas ilumina o altar. Ajoelho-me em silêncio, deixando que a escuridão da noite se dissipe com a luz da manhã.

A oração é meu porto seguro. Aqui, posso falar com Deus sem medo, sem a dor do passado me cercando. As palavras saem como um sussurro, e enquanto rezo, sinto que a carga em meu coração começa a se aliviar. A cada dia, minha conexão com Ele se torna mais forte. Peço por força, por cura, e, acima de tudo, por paz.

Após a oração, sigo para o refeitório, onde as irmãs se reúnem para o café da manhã. O aroma do pão fresco é acolhedor. Sentamo-nos em uma longa mesa de madeira, e conversamos em murmúrios suaves, compartilhando nossas esperanças e medos. Este é o momento em que nos unimos, e cada sorriso trocado é um lembrete de que não estou sozinha.

Quando entrei na igreja, um calor acolhedor envolveu meu corpo, mas meu coração estava inquieto. As velas acesas lançavam sombras dançantes nas paredes de pedra, e o aroma de incenso preenchia o ar, quase como um manto que cobria todos os pensamentos perturbadores que tentavam me assombrar. Era domingo, e a missa começava em poucos minutos. Fui me sentar em um dos bancos de madeira, tentando me concentrar nas palavras do salmo que ecoavam na minha mente.

A música suave do órgão começou, e logo pude ouvir os murmúrios da congregação ao meu redor. O que eu não esperava era a presença dele: o padre Charlie. Quando ele entrou, a luz parecia segui-lo, como se o próprio céu quisesse iluminá-lo. Seus cabelos escuros, bem arrumados, destacavam seu rosto anguloso e a intensidade de seu olhar. Ele se movia com uma calma que me fez sentir um misto de admiração e confusão. Como alguém tão jovem e bonito poderia estar ali, dedicado a Deus, quando seus olhos carregavam uma profundidade que falava de desejos não ditos?

O Peso da BatinaOnde histórias criam vida. Descubra agora