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"Em algumas situações, teremos que perder quem amamos, para nos tornarmos mais fortes."
Era meados de abril. A lua estava brilhando no céu e minha mãe me contava sobre as histórias de sua infância. Sentadas na varanda, em uma pequena cidadezinha do interior. Não se via ninguém nas estradas de terra, apenas era possível escutar o som dos grilos e do vento entre as árvores.
- Está vendo aquela pilha de pedras bem ali, perto da mata? - mamãe apontava para um ponto, no meio do escuro.
- Acho que sim.
- Foi eu e meus irmãos que fizemos isso. Toda vez que aprontamos uma juntos, colocávamos umas pedras empilhadas. - ela sorriu. - Nem lembro mais como iniciamos aquilo, mas posso ter certeza que seus avós nem desconfiavam na época.
- E vocês aprontaram tanto assim? - questionei
- Oh, querida! Isso deve ser nem metade. Faz tanto tempo, que nem sei mais se ali tem a contagem certa - ela tossiu um pouco - Antes da mamãe partir, ela tinha sentado do meu lado, bem aqui nesta varanda. Ela apontou para aquelas pedras e perguntou o que significava. Quando descobriu, começou a rir. E disse "Ah, se eu soubesse! Toda semana vocês tacavam uma pedra ali e eu entendendo nada."
Ela olhou para o céu, com um sorriso nos lábios e lágrimas nos olhos. Nunca imaginei como seria viver um mundo sem minha mãe. E, não conheci vovó direito, ela partiu quando eu tinha apenas alguns meses de vida, mas, baseando-me nas histórias de mamãe, posso ter certeza que ela era uma mulher incrível.
- Mamãe, como a senhora se sentiu com a partida da vovó?
- Minha querida - ela suspirou e olhou para mim - foi uma das coisas mais difíceis que aconteceu na minha vida. Eu não conseguia olhar para ela na cama do hospital e não querer tirar ela dali. Queria dizer que estava tudo bem, que ela iria sobreviver, mas eu mal conseguia acreditar nisso. - ela fungou com o nariz - Sua avó era muito forte. Lutou bravamente contra o câncer e as longas sessões de quimioterapia. Até hoje, tenho grande admiração naquela mulher. Sabe, em algumas situações, precisamos perder alguém que amamos para nos tornarmos mais fortes.
- É uma pena ela ter ido tão cedo. Apesar de nunca ter conhecido a vovó, sei que ela era alguém incrível! Isso graças a senhora. - Eu chego mais perto dela e a abraço. - Eu amo você, mamãe. Você é a pessoa mais incrível desse mundo! Não posso imaginar um mundo sem você. Amo-te. - ela beija o topo da minha cabeça e me abraça de volta.
Abro os olhos. Vejo o caixão na minha frente, com a mulher que mais admirei a minha vida inteira. Aquela conversa foi a última que tivemos. O velório iria iniciar a qualquer momento, mas eu não queria me despedir. Não queria ter que dar adeus para minha mamãe.
As lágrimas invadiram meus olhos e senti um frio como nunca antes. Meu coração parecia tentar me sufocar. As lembranças, pareciam uma tortura. Eu não consigo me imaginar sem minha mãe. Não quero continuar vivendo sem ela.
Aproximo-me do corpo e toco seu rosto pela última vez. Frio, igual o que estou sentindo. Seu rosto antes tão cheio de vida, agora se encontra tão pálido.
- Mamãe. - As lágrimas rolam pelo meu rosto - Você é a pessoa mais incrível do mundo. Do meu mundo. Amo-te tanto! Por favor, cuida de mim lá de cima, tá bom?
O padre começa a falar, mas já não o escuto mais. Sinto meu coração pesar como chumbo. Perco-me em memórias daquela mulher. Daquela pessoa que me ensinou a viver, que me ensinou a valorizar os mais simples momentos. Fecho os olhos e por um instante posso vê-la e ouvi-la, pela última vez: "Agora, é hora de voar, meu passarinho. Não se esqueça, em alguns momentos vamos perder algo ou alguém para nos tornarmos mais fortes. E, não se esqueça que você é a garotinha que mais me orgulho. Também amo-te, meu amor!". E com isso, ela partiu de vez, para nunca mais voltar.
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Ecos de um silêncio
PoetryEm meio a um mundo repleto de vozes, você se encontra perdida em um labirinto de expectativas e silêncios, numa jornada de uma alma que, por muito tempo, viveu buscando incessantemente a aceitação. A narrativa se desenrola como uma dança delicada e...