01

143 12 11
                                    

Convento de Nossa Senhora do Desterro, Monchique, Distrito de Faro, Portugal, Janeiro de 1750.

Na capela do convento, era celebrado o casamento da jovem senhorita Sara de Sá com o aldeão Salomão Melo.

Juliette assistia a celebração do casamento de sua amiga e irmã de orfanato com lágrimas nos olhos, enquanto a madre lhe recriminava com o olhar.

No convento funcionava também um orfanato, onde meninas que não eram aceitas por suas famílias, ali iam parar. Geralmente as freiras as convenciam de se tornarem parte da igreja, mas as jovens ainda tinham poder de escolha.

As escolhas seriam: a vida religiosa ou a vida num casamento cristão. Sara, era filha de um homem viúvo que se vendo sozinho não quis ficar com a filha. Ela tinha então 16 anos e casava-se com um humilde aldeão por que não queria seguir a vida religiosa.

Assim como sua amiga, Juliette já tinha demostrado a sua vontade perante a madre superiora de não seguir a vida religiosa, mas seu desejo estava chegando a data limite. Todas as jovens que não fossem escolhidas até os 18 anos seguiriam a vida religiosa.

Sara não era a noiva mais feliz, mas Juliette a confortou. Toda a vida presa nas paredes de um convento não era o sonho de ambas. Apesar de amar a Deus sobre todas as coisas, sentiam que sua missão ia além daquelas paredes.

Quando o casamento foi finalizado, Sara buscou a amiga e se abraçaram chorando.

- Te adoro Juli. És a minha irmã do coração. Fique bem e vou rezar muito por ti.

- Se eu não for escolhido dentro de poucos meses, vou a Lisboa fazer os votos de castidade. Promete que vem me visitar?

- Não pense assim. Vai ser escolhida.

- Eu não vim para cá como tu. Infelizmente não tenho origem conhecida e é tanto que meu sobrenome é Juliette de Jesus. Os cavalheiros acreditam que sou filha de uma prostituta. A madre já me disse que ninguém vai me escolher. Estou me conformando. Peço a Deus todos os dias que me leve para os seus caminhos Sara.

- Vai sair daqui e viverá um bom casamento minha irmã. Terá seus filhos e a família que tanto deseja. Até qualquer dia linda rapariga.

Deram um último abraço e Juliette voltou as suas funções dentro do convento. Ali fazia de tudo um pouco, limpava, cozinhava, mas hoje cuidaria das plantas que davam alimentos a todas que ali viviam.

Homens não eram permitidos ali. Quem desejasse um contato com as irmãs buscava o padre Estevão e ele permitia ou não a entrada de algum distinto cavalheiro.

A madre superiora surpreendeu Juliette com uma atitude estúpida naquela manhã.

Vendo Juliette abaixada a semear umas sementes, ela empurrou a jovem e ainda lhe fez engolir terra.

Juliette chorou pelo sufoco e a madre sorriu em zombaria.

- Está vendo isso? Será assim que sofrerá a Sara. Quem segue a Deus não sofre. Quem segue com os homens só chora. Aceite o hábito Juliette.

- Deus não quer o sofrer de ninguém e desde que cheguei aqui e me entendo por gente sou maltratada. Por que não me deixaram morrer? Eu teria morrido. Tinha pouco tempo de vida e iria partir sem ter o pecado de odiar a senhora com todas as minhas forças.

- Ingrata! Desgraçada! Infeliz!

Todas essas palavras levaram Juliette a levar a maior surra dos últimos anos. Ela se levantou com dificuldade muitos minutos depois e a madre saiu a chamando de preguiçosa. Em meio as lágrimas, Juliette clamava aos céus por uma salvação nessa vida.

Seu corpo ficou lesionado e cheio de hematomas. Seria um homem pior que a madre superiora?

...

Dois dias depois...

Padre Estevão bate a porta do convento e ao seu lado tem um senhor e cabelos já bem grisalhos.

- Madre precisamos conversar com a senhora.

- Qual é o assunto? Estou demasiada envolvida com afazeres e as pestinhas do orfanato estão a tirar a minha paz de espírito.

- Aqui junto a mim está o distinto senhor desembargador Juarez Alcântara. Temos que visitar uma jovem que aqui habita.

- Quem?

- A Juliette de Jesus.

- Ela está enferma. - mentiu a madre.

- Ôh meu Deus. Padre o senhor disse que ela era saudável.

- Calma. Ela está adoentada de quê?

- Sofreu uma queda. Está cheia de hematomas. De tão desastrada que é.

- Queda não é contagioso. Senhora, vim aqui por que o padre garantiu que essa jovem quer se unir em matrimônio com um cavalheiro.

A madre olhou bem para o desembargador e estranhou.

- O senhor é um homem muito distinto para querer casar com essa moça sem sobrenome. Ela não tem a origem conhecida, mas com certeza não é de boa linhagem...

- Madre... Contenha-se. - a interrompeu o padre. - Desembargador Juliette é uma boa moça. Quer realmente conhecê-la?

- Sim.

Entraram os dois no convento.

...

Bem-aventuradosOnde histórias criam vida. Descubra agora