3. Uma conversa para maiores

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Novamente, eu me pergunto: será que estou no caminho certo para foder com a minha vida?

Por quê? Bem, vamos retroceder um pouquinho no tempo para quando saí do trabalho nessa noite de segunda-feira.

Meli e George — meu chefe — já haviam ido embora e eu estava prestes a fazer o mesmo enquanto ajudava a dona Odete a fechar a porta principal da cafeteria. Estava tudo na paz de Cristo, eu pretendia passar no McDonald's para comprar um lanche e voltar para casa, mas o destino resolveu agir bem quando eu me despedia da dona Odete.

— Dominique.

A voz mansa de Miguel surgiu de detrás de mim e eu levei um puta de um susto, porém logo depois, ao me deparar com aquele sorriso gentil, lembrei da promessa de sairmos depois do meu trabalho. E, como diria minha mãe: promessa é dívida.

Porém eu não fazia a menor puta ideia de que Miguel iria sugerir um bar indie para esse nosso "encontro" improvisado providenciado pelo destino.

O problema começou logo na entrada do bar, algo superdiscreto com luzes neon e um grande símbolo de uma cereja junto ao nome do lugar: Cherry Promise. O edifício em si era todo cinza com minúsculas pedrinhas que causavam um leve brilho sob a menor quantidade de luz, parecia ter dois andares e quando entramos na breve recepção que estava separada do resto do bar, pude sentir o indiscutível cheiro de álcool.

Até aí, tudo bem, já estive em locais piores, mas a coisa estranha foi que a atendente que estava aguardando na recepção apenas olhou para a cara do Miguel e depois nos fez sinal para segui-la, havia um sorriso jovial e soturno no rosto dela.

Agora, cá estamos: eu e Miguel sentados um de frente para o outro em sofás de couro preto, uma mesa de vidro nos separando, lustres de led pendurados entre nós. A parede à minha direita é composta por plantas artificiais, mas cheiram a capim fresco e mentolado. Dou uma olhada ao nosso redor, cada set de mesas parecem formar uma parte separada do ambiente, a iluminação é precária, e dá para ver que isso é proposital.

Os poucos clientes parecem se esconder na penumbra com seus drinks de aspecto caro e requintado. Todos vestem roupas chiques, só eu que estou mais simples com minha calça jeans de cintura alta, botas de cano curto, blusa social azul abaloada e jaqueta de camurça cinza por cima. Já Miguel está mais jeitoso com seu sobretudo preto, um lenço cor vinho no pescoço, calças marrons e uma camisa polo branca. E novamente noto que ele deve ter passado um perfume caro, pois o cheiro supera até o capim das plantas ao meu lado.

Vários minutos de silêncio se passam entre nós até que um garçom chega junto a um sorriso excessivamente simpático.

— Ah, senhor Miguel! — ele saúda, alargando ainda mais seu sorriso — O de sempre?

— Para mim, sim. — Em seguida, a atenção daqueles dois se volta para a idiota aqui que continua quieta como uma porta. — O que gostaria de pedir, Dominique?

Um Uber, se for possível...

É óbvio que não vou dizer isso, afinal, prometi que me encontraria com Miguel hoje depois do trabalho, então não tenho para onde correr.

Com um longo suspiro, viro preguiçosamente para o garçom que continua esperando com seu grande sorriso.

— Tem Itaipava aqui?

Imediatamente vejo o semblante animado do garçom decair para algo mais contido e posso sentir que ele está me julgando por minhas escolhas, mas eu não poderia me importar menos com o que um qualquerzinho pensa sobre mim.

— Vou trazer suas bebidas logo, logo — ele diz e então sai para nos deixar no silêncio novamente.

Um silêncio que eu não estava disposta a sustentar, não quando poderia estar voltando para casa ao invés de permanecer na presença de um cara qualquer que deveria ter sido apenas uma foda casual no meio da madrugada.

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