A noite na Califórnia estava mais fria do que o normal, e o ar pesado dentro do quarto de Sadie era quase sufocante. Yn estava de pé, encostada na moldura da janela, olhando para fora, as mãos enfiadas nos bolsos da calça de linho escura.
Ela tentava se manter composta, mas seus olhos pesavam com lembranças que nem o vento noturno conseguia dispersar. Sadie estava sentada na cama, o cabelo ruivo solto, caindo em ondas suaves sobre os ombros.
O silêncio entre elas era espesso, carregado de uma história que ainda estava sendo escrita, mesmo que nenhuma das duas soubesse ao certo como terminar.
-- Você já está em outra, não está? - a voz de Yn quebrou o silêncio. Era mais uma afirmação do que uma pergunta. Seus olhos não deixaram a janela, mas cada palavra saía carregada de algo que ela estava tentando esconder. --
Sadie suspirou, hesitando antes de responder.
-- O que você quer que eu diga, Yn? Eu não... Eu não sei mais o que somos. --
Ela se remexeu na cama, o lençol ainda amassado do sono interrompido. Yn se virou lentamente para encará-la, seus olhos escuros encontrando os de Sadie.
Uma peça de lingerie caída no chão prendeu o olhar de Yn por um breve segundo, uma lembrança concreta de momentos que pertenciam a outro tempo.
-- Hoje... revirando as coisas, eu me deparei com algo. Uma peça íntima que me lembrou da gente. - Yn deu um sorriso amargo, a respiração falha - Foi um gatilho. Não consegui evitar. --
Sadie sentiu um nó se formar na garganta, as memórias das noites que passaram juntas inundando sua mente, fazendo seus sentidos formigarem com a lembrança da pele quente de Yn contra a sua.
-- Yn, isso foi... há tanto tempo. --
-- Foi? - Yn deu um passo à frente, o chão rangendo levemente sob seu peso - Parece que foi ontem, Sadie. Cada toque, cada suspiro. O jeito que você ficava por cima, como se o mundo fosse nosso e nada mais importasse. --
Sadie baixou o olhar, os dedos brincando nervosamente com a bainha da camiseta. Yn estava tão próxima agora, o perfume familiar misturado ao leve cheiro de álcool flutuando no ar. Ela sabia que Yn tinha bebido um pouco, mas isso só tornava suas palavras mais cruas, mais sinceras.
-- Você quer que eu finja que esqueci? - Yn continuou, sua voz um sussurro rouco, quase implorando - Tira ele e bota eu de volta na sua vida, Sadie. --
A menção de Iran trouxe uma pontada de culpa no peito de Sadie. Ela sabia que Iran nunca a tocou da mesma maneira que Yn. Nunca a fez sentir-se tão viva. Mas a vida havia seguido em frente, certo?
-- Eu... eu não posso fazer isso, Yn. - as palavras saíram baixas, quase inaudíveis --
Yn fechou os olhos por um momento, tentando reunir a força que lhe faltava.
-- E por quê? Porque é mais fácil seguir com o que é seguro? O que é esperado? --
Sadie se levantou da cama, aproximando-se de Yn, sua presença sempre magnetizante. As palavras estavam ali, à beira de seus lábios, mas o medo de machucar, de reviver tudo, a paralisava.
Yn deu um passo para trás, os ombros caídos.
-- Talvez eu esteja pedindo o impossível. Mas se tem uma coisa que eu sei, é que essa saudade nunca vai embora, não importa o quanto a gente tente. --
O silêncio voltou a preenchê-las, mas desta vez, não era tão opressor. Era um eco das noites que passaram juntas, da intensidade que compartilhavam. Sadie sabia que o que tinha com Iran era apenas uma sombra pálida em comparação. Mas, naquele momento, não tinha mais forças para dar a Yn a resposta que ela procurava.
Antes de sair, Yn se virou uma última vez, seus olhos escuros fixos nos de Sadie.
-- Você sempre teve a escolha, Sadie. Só você pode decidir. --
E com essas palavras, Yn desapareceu pela porta, deixando Sadie sozinha no quarto, cercada por memórias que ela tentava, desesperadamente, enterrar.
Yn caminhava pelo corredor do prédio, os passos ecoando em meio ao silêncio da noite. Seu coração pesava com cada batida, carregando as palavras não ditas e os sentimentos mal resolvidos que ficaram para trás. Mas, no fundo, ela sabia que havia algo que não estava terminado. Algo que Sadie também sentia, mesmo que tentasse esconder.
O som de uma porta sendo aberta atrás de si a fez parar imediatamente. Yn virou a cabeça lentamente, e lá estava Sadie, parada no batente da porta. Seus olhos azuis estavam cheios de algo que Yn conhecia bem: saudade.
Os lábios de Sadie tremeram levemente antes de ela dizer, quase em um sussurro:
-- Yn... --
Yn sentiu o peito apertar. Ela suspirou, como se fosse se virar e continuar andando, mas o olhar de Sadie a prendeu. Num gesto silencioso, Sadie fez um leve movimento com a cabeça, chamando-a de volta, antes de desaparecer para dentro do apartamento.
Embriagada pela súbita reviravolta, Yn ficou alguns segundos parada no meio do corredor, sem acreditar no que havia acabado de acontecer. O convite silencioso de Sadie era algo que ela jamais esperou, mas que sempre desejou. E, sem pensar duas vezes, Yn se apressou em seguir de volta para o apartamento.
Ela entrou e fechou a porta atrás de si, mas antes que pudesse reagir, a respiração ofegante de Sadie se misturou com a dela, e Sadie a puxou com força pela camisa, seus lábios encontrando os de Yn de forma intensa e desesperada.
O impacto fez o corpo de Yn bater contra a porta com um baque, mas ela não se importou. O beijo era cheio de urgência, de tudo o que elas haviam reprimido durante tanto tempo.
Yn sorriu em meio ao beijo, e aquele pequeno gesto aqueceu o coração de Sadie de uma forma que ela não conseguia explicar. Uma faísca que fez com que ela retribuísse com a mesma intensidade, puxando a blusa de Yn mais ainda e quase a rasgando na pressa de senti-la por completo.
Quando a peça de roupa finalmente caiu ao chão, Sadie parou por um segundo, os olhos devorando cada centímetro do corpo de Yn sem blusa. O quarto parecia girar ao redor delas, mas no centro do universo, só existiam as duas.
Ela se afastou um pouco, encarando Yn com os olhos brilhando, uma mistura de paixão e verdade crua.
-- Eu... Eu te amo, Yn. Sempre te amei, mesmo quando tentei fugir disso. --
O silêncio entre elas agora era elétrico. Yn se aproximou devagar, sem dizer nada, seus olhos escuros encontrando os de Sadie com uma intensidade avassaladora. As mãos de Yn deslizaram pela cintura de Sadie com uma suavidade que contrastava com o turbilhão de emoções ao redor delas.
Então, com um beijo suave, profundo e apaixonado, Yn sussurrou contra os lábios de Sadie:
-- Meu coração e eu te amamos desde o momento em que coloquei os olhos em você. --
Aquele momento foi a certeza que ambas precisavam. As palavras que antes não eram ditas agora estavam cravadas entre beijos e olhares. As barreiras que existiam entre elas haviam sido quebradas, e naquela noite, tudo o que existia era o amor que sempre as cercou.
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