O despertar de Raul, naquela manhã, foi diferente de qualquer outro. Ele abriu os olhos devagar, mas algo no ar parecia errado. O quarto estava mergulhado em uma penumbra anormal, mesmo com a luz do sol entrando pelas frestas das cortinas. A sensação de peso em seu peito havia desaparecido, mas uma inquietação tomava conta de seu corpo, como se estivesse à beira de algo terrível.
Ele se levantou devagar, com os músculos ainda tensos, e olhou ao redor. Tudo parecia normal à primeira vista, mas ao pisar no chão frio, um calafrio percorreu sua espinha. Raul caminhou até a janela e a abriu, deixando o vento matinal invadir o quarto. O ar fresco tocou seu rosto, mas não trouxe a calma que ele esperava. Pelo contrário, um desconforto crescia dentro dele.
Ao olhar para fora, algo estranho chamou sua atenção. A rua, sempre movimentada pela manhã, estava silenciosa. Carros parados, nenhum som de passos ou conversas. Era como se o mundo tivesse congelado em uma fração de segundo. Ele esfregou os olhos, tentando afastar a sensação de que algo estava muito errado, mas quando olhou novamente, a cena havia mudado. Pessoas caminhavam pela calçada, um carro passava lentamente, e o som do cotidiano retornava como se nada tivesse acontecido.
Raul recuou da janela, com o coração acelerado. "Estou ficando louco?", pensou. Mas no fundo, ele sabia que a resposta não era tão simples. Os eventos da noite anterior estavam frescos em sua memória. A entidade, o pesadelo... a sensação de que ele nunca tinha realmente acordado.
Tentando afastar essas sensações, ele seguiu para o banheiro. Ao encarar seu reflexo no espelho, algo o incomodou. Seus olhos estavam fundos, a pele mais pálida do que o normal, como se ele tivesse passado dias sem dormir. Ele piscou algumas vezes, tentando clarear a visão. Mas quando olhou novamente, o reflexo não o seguiu. Por uma fração de segundo, ele viu algo que não deveria estar ali — sua imagem havia sorrido.
Raul deu um passo para trás, o coração disparando no peito. "Não, isso é impossível", murmurou. Ele olhou novamente para o espelho, e agora seu reflexo estava normal, inexpressivo, o mesmo de sempre. A mão tremia ao passar pela face. Ele precisava sair daquele banheiro. Precisava respirar, sentir que estava no controle.
Desceu as escadas em direção à cozinha, e foi quando começou a notar os primeiros sinais de que o mundo ao seu redor não era mais o mesmo. As paredes da casa, antes claras e acolhedoras, agora pareciam mais escuras, como se uma sombra invisível tivesse se infiltrado nos cômodos. O ar estava pesado, denso. Cada passo que dava parecia afundá-lo mais no chão, como se estivesse sendo puxado por algo.
Ao passar pela sala de estar, notou algo fora do lugar: a velha poltrona ao lado da janela parecia estar em um ângulo estranho, como se alguém a tivesse empurrado. Raul franziu o cenho. Ele sabia que a poltrona sempre estava virada para a TV. Aproximou-se, sentindo o estômago revirar de leve. A cada passo, a sensação de estar sendo observado retornava com força.
Quando finalmente chegou à poltrona, Raul notou um detalhe que não havia percebido antes. Sobre o encosto, havia marcas de dedos, como se alguém tivesse se segurado ali com força. Ele tocou a superfície fria, sentindo a textura. Quem esteve ali? Por que ele não lembrava? Mas antes que pudesse processar, um som suave ecoou pela casa.
– Raul...
O chamado foi baixo, quase um sussurro, mas alto o suficiente para fazê-lo congelar no lugar. O coração disparou, a respiração ficou pesada. Ele conhecia aquela voz. Era como um eco do pesadelo da noite anterior, mas... não, ele estava acordado. Estava acordado, não estava?
Raul virou-se lentamente, os olhos arregalados, a respiração presa. A sala estava vazia, exceto pela luz fraca que atravessava a janela. O sussurro havia se dissipado, mas a sensação de que ele não estava sozinho permanecia. Ele fechou os olhos por um segundo, tentando controlar o tremor que se espalhava por seu corpo. "Não estou sonhando", repetiu para si mesmo, quase como um mantra. "Não estou sonhando."
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Entre o Sonho e a Escuridão
HorrorRaul sempre encontrou refúgio nos seus sonhos. Nos dias cinzentos da vida, eles eram o único escape para um mundo onde ele podia ser livre. Mas tudo muda quando ele encontra uma entidade sombria, uma divindade que carrega o próprio cosmos em seu ser...