Capítulo 3

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O dia tinha sido uma tempestade de caos. A equipe do governo deixara a casa de Vance em um estado de confusão e tensão. As roupas, os acessórios e até uma mala nova estavam todos espalhados pela sala, como se sua vida inteira tivesse sido desmontada e reorganizada por estranhos. A mente de Vance ainda girava com a quantidade de perguntas não respondidas, e ele ainda não sabia como enfrentaria tudo aquilo.

Enquanto ele tentava encontrar um momento de paz no seu quarto, a porta da frente bateu com um som que fez o coração dele parar por um segundo. Uma visita inesperada, tão logo depois de toda a confusão do dia anterior, não era algo que ele estava pronto para lidar.

— Vance! — Sua mãe chamou do corredor, a voz alta e apressada. — Tem alguém aqui para ver você.

Suspirando, ele desceu as escadas. Quando virou o corredor, a visão que o esperava o fez congelar.

Parado na entrada da casa, com uma postura confiante, mas com uma expressão gentil, estava ninguém menos que o príncipe Maxon Schreave.

Os olhos de Vance se arregalaram. Não havia como confundir aquele rosto. Ele já o vira em incontáveis transmissões do Palácio, entrevistas e anúncios oficiais. Mas vê-lo ali, de pé, em sua sala de estar, era surreal.

— P-príncipe Maxon — Vance gaguejou, a voz mais alta do que pretendia.

Maxon, com seu típico sorriso sereno, acenou com a cabeça, os cabelos loiros impecavelmente arrumados. Ele estava vestido com uma camisa azul clara e uma jaqueta formal, mas sem toda a pompa que Vance esperava. Parecia quase... acessível.

— Oi,  você deve ser o Vance. — A voz de Maxon era calma, quase como se ele estivesse acostumado a entrar na casa de pessoas desconhecidas o tempo todo. — Eu espero que não esteja incomodando.

Vance sentiu um nó na garganta. Incomodando? Era o príncipe Maxon em sua casa. Isso era mais do que incômodo. Era completamente inesperado.

— N-não, claro que não. — Ele finalmente conseguiu responder, tentando se recompor. — Eu só... não sabia que você... bem, por que está aqui?

Maxon soltou uma leve risada, como se apreciasse o nervosismo de Vance.

— Eu entendo que isso seja uma surpresa — disse ele, com um brilho de diversão nos olhos. — Um dos agentes me contou sobre... a sua situação. E eu achei que seria melhor vir pessoalmente conversar com você. — Ele fez uma pausa, como se estivesse escolhendo as palavras cuidadosamente. — Quero resolver isso de forma justa.

O coração de Vance pulou no peito. Ele sabia que os agentes do governo tinham falado com Maxon, mas nunca imaginou que o príncipe em pessoa viria até sua casa.

— Você quer... resolver? — Vance repetiu, a voz hesitante. Ele não sabia o que pensar disso. O príncipe estava ali para o quê? Mandá-lo embora da Seleção? Fazer alguma decisão oficial?

Maxon olhou diretamente para ele, os olhos castanhos suaves, mas intensos. 

— Eu sei que você não sabia sobre a inscrição. E também entendo que essa situação é delicada. — O príncipe fez uma pausa antes de continuar. — Mas eu quero que você saiba que não precisa se preocupar com... seu passado. Não importa como foi feita a inscrição ou quem você era antes disso. Eu não estou interessado em quem você foi. Eu estou interessado em quem você é agora.

O choque percorreu o corpo de Vance como uma onda. Ele esperava ser tratado com desdém, talvez até ser expulso sem uma palavra, mas a abordagem de Maxon era completamente diferente. O príncipe estava ali, falando com ele de igual para igual, como se Vance tivesse voz nessa situação.

Maxon deu um passo mais próximo, sem tirar os olhos de Vance.

— Eu não vou fingir que entendo completamente o que você passou, mas sei o quanto isso deve ser difícil. — O tom de sua voz era sério, como se ele realmente estivesse fazendo um esforço para entender. — E, por isso, quero que você decida o que deseja fazer daqui em diante. Não vou obrigá-lo a nada. Se você quiser desistir da Seleção, basta me dizer, e eu farei com que isso seja tratado da maneira mais discreta possível.

Vance piscou, atônito. Ele não esperava aquilo. Maxon estava oferecendo uma saída, mas de uma forma que o fazia se sentir visto, respeitado. Não era uma ordem, não era uma imposição. Era uma escolha.

— E se eu decidir... ficar? — Vance perguntou, quase sem acreditar que estava considerando essa possibilidade.

Maxon sorriu de leve. 

— Então você será bem-vindo no palácio como qualquer outra Selecionada. — Ele deu de ombros, como se fosse a coisa mais simples do mundo. — Não importa o que aconteceu antes. Se você decidir ficar, será tratado como Vance Carter, o Selecionado da Casta Cinco. E será avaliado pelo que é, assim como as outras. Nada mais.

Por um momento, o silêncio pairou entre eles. Vance não sabia o que pensar. A oferta era tentadora e assustadora ao mesmo tempo. Ele havia passado tanto tempo fugindo de quem as pessoas achavam que ele era, que a ideia de alguém — especialmente o príncipe — tratá-lo como ele realmente se via era quase difícil de acreditar.

— Eu não esperava isso... de você. — Vance finalmente admitiu, sentindo-se um pouco vulnerável demais para estar falando com o futuro rei de Illéa.

Maxon riu baixinho, inclinando a cabeça. 

— Acredite, Vance, eu não sou tão assustador quanto pareço. — Ele olhou ao redor da sala, notando as pinturas que estavam empilhadas perto da parede. — E eu vi algumas de suas pinturas no arquivo que me enviaram. Você é muito talentoso.

Vance ficou sem palavras por um momento. O príncipe tinha visto suas pinturas? E ainda por cima, elogiou? Seu coração batia acelerado, não de nervosismo, mas de algo mais. Talvez esperança.

— Então, o que me diz? — Maxon perguntou, agora com um sorriso leve no rosto. — Você quer continuar na Seleção, ou prefere que eu resolva isso de outra forma?

Vance olhou para Maxon, sentindo o peso da decisão pairando sobre ele. Aquela poderia ser a única chance que teria de fazer algo por si mesmo. De ser reconhecido não como alguém que precisava se esconder, mas como Vance, o verdadeiro ele. Por outro lado, sabia que as complicações poderiam ser inúmeras.

Ele respirou fundo, e, pela primeira vez em muito tempo, sentiu uma centelha de confiança crescer dentro de si.

— Eu vou ficar.

Maxon sorriu, um brilho de aprovação nos olhos.

— Ótimo. Acho que vai ser interessante te ver no palácio.

Com essas palavras, o príncipe deu um último aceno, se despedindo antes de sair pela porta. Vance ficou parado ali por alguns momentos, o eco da conversa reverberando na mente.

Ele havia decidido ficar. E, pela primeira vez, sentiu que talvez, só talvez, fosse capaz de enfrentar o que vinha pela frente.

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