Capítulo 1 - O Rei

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O reino de Calthor era uma terra de contrastes. Dos altos picos nevados que se erguiam no norte até as vastas planícies verdes onde os camponeses cultivavam trigo, cada canto do território refletia as três classes que dividiam o reino. Acima de todos, como deuses distantes, estavam a Realeza, intocáveis e venerados. Logo abaixo, a Nobreza, sustentada por privilégios herdados e um senso de superioridade. E no fundo da hierarquia, os Camponeses, que labutavam dia após dia, invisíveis e descartáveis aos olhos daqueles que viviam nos palácios.

No coração desse reino grandioso, em uma imensa fortaleza que parecia feita de mármore e ouro, vivia Jungkook, o rei de Calthor. Seu trono, esculpido em pedra negra, contrastava com as tapeçarias douradas e os arcos altos do salão principal. Ali, ele se sentava em silêncio, observando, seu olhar afiado como uma lâmina, sua postura tão rígida quanto a própria pedra. À primeira vista, ele parecia intocável, invencível, mas aqueles que ousavam encará-lo por mais de alguns instantes notariam o brilho frio em seus olhos, um vazio que nem todas as riquezas de seu reino poderiam preencher.

Jungkook sempre fora conhecido como um rei severo, até mesmo arrogante. Sua ascensão ao trono não havia sido fácil, e o peso das responsabilidades que agora carregava o transformou em alguém distante e temido. Quando seu pai, o antigo rei, morrera repentinamente, Jungkook, então apenas um jovem príncipe, foi forçado a se tornar o governante de um reino em crise. Ele aprendera rapidamente que confiar nos outros era um luxo que um rei não podia se permitir. A traição estava sempre à espreita, oculta atrás de sorrisos educados e reverências profundas.

No salão principal, as tochas iluminavam as paredes adornadas com retratos de antigos reis, todos com expressões severas, como se exigissem de seus descendentes a mesma força implacável. Jungkook cresceu à sombra desses homens, moldado para acreditar que o poder se media pela distância que mantinha de seus súditos e da própria humanidade.

Era início de outono, e o frio começava a se infiltrar pelos corredores da fortaleza, mas Jungkook não sentia. Não porque estivesse confortável, mas porque há muito tempo ele havia aprendido a ignorar as necessidades triviais do corpo. A dor, o frio, a fome – tudo isso era insignificante quando comparado às preocupações que atormentavam sua mente. Os nobres estavam inquietos. Havia rumores de conspirações, de facções que desejavam derrubar sua coroa. Os camponeses, por sua vez, começavam a se revoltar devido aos impostos exorbitantes que os mantinham presos à miséria.

Jungkook cerrava os punhos, escondidos sob as mangas do manto real. Ele sabia que a força era a única moeda que realmente importava. Mostrar qualquer fraqueza seria fatal, especialmente agora, quando o reino parecia estar à beira de uma guerra civil. Mas havia algo mais que o incomodava profundamente. Um vazio que se instalara em seu peito, crescendo a cada dia, uma sensação que ele não conseguia nomear.

Enquanto se perdia nesses pensamentos, a porta maciça do salão se abriu com um ranger pesado. Seokjin, o conselheiro real, entrou com sua postura ereta e feições impecáveis. Ao contrário de Jungkook, que sempre se vestia com trajes sombrios, Seokjin trazia uma leveza nos olhos e nas roupas, sua túnica azul contrastando com a seriedade do ambiente. Ele era um dos poucos em quem Jungkook confiava parcialmente, pois o conselheiro fora amigo de seu pai e servira ao reino por muitos anos.

— Majestade — disse Seokjin, curvando-se levemente. Sua voz era calma, mas carregava um tom de urgência que não passou despercebido.

— Fale, Seokjin — a voz de Jungkook era firme, mas contida. Ele não era um rei que demonstrava emoções com facilidade.

— As revoltas ao sul estão se intensificando. Parece que os camponeses estão sendo incitados por alguns nobres dissidentes. — Seokjin avançou até o centro do salão, suas mãos unidas nas costas, enquanto mantinha a cabeça baixa em sinal de respeito.

Jungkook apertou os dentes. Já suspeitava que algo estava errado. Sua própria nobreza estava conspirando contra ele, minando sua autoridade nas sombras. Era sempre assim: quanto mais poder alguém acumulava, mais inimigos surgiam, como vermes atraídos por um banquete.

— E o que sugere que façamos? — Jungkook indagou, embora já soubesse a resposta. Havia poucas soluções quando o reino estava à beira da revolta.

— Eu sugiro enviar reforços ao sul, mas também... considerar uma abordagem mais... diplomática. — Seokjin escolhia suas palavras com cautela. Ele sabia que o rei preferia resolver seus problemas com força, mas também sabia que o uso excessivo de violência poderia acabar com a pouca lealdade que ainda restava.

Jungkook soltou um riso seco, uma reação que pegou Seokjin de surpresa. Diplomacia. Era fácil falar de negociações quando se estava atrás de um manto de títulos e privilégios. Mas Jungkook crescera nas trincheiras da luta política. Ele aprendera que, no fim, as palavras eram tão cortantes quanto uma espada, mas o fio de uma lâmina não mentia.

— Diplomacia, Seokjin? O que esses camponeses poderiam oferecer em troca? Mais revoltas? Mais insubordinação? — Seus olhos faiscaram. — A última coisa que precisamos agora é parecer fracos.

Seokjin inclinou a cabeça em compreensão, mas não recuou completamente de sua sugestão.

— Majestade, não sugiro fraqueza. Apenas que pensemos em estratégias a longo prazo. A guerra, seja ela de espadas ou de palavras, sempre tem um preço.

Havia verdade nas palavras do conselheiro, mas Jungkook não gostava de admitir. Cada decisão que ele tomava parecia corroer um pouco mais de sua alma, como se o peso da coroa estivesse se tornando insuportável. Ele se levantou do trono, a capa pesada deslizando pelo chão de mármore enquanto caminhava até a janela.

Lá fora, o sol estava se pondo, tingindo o céu de tons vermelhos e dourados. A fortaleza de Calthor era grandiosa, uma joia entre as montanhas, mas, para Jungkook, aquilo mais parecia uma prisão. Ele se perguntou, pela primeira vez em muito tempo, se seria diferente caso sua vida tivesse tomado outro rumo, caso não fosse o rei.

Mas isso era apenas uma fantasia tola.

— Envie reforços para o sul — ele disse finalmente, virando-se para Seokjin. — E aumente a vigilância nas fronteiras. Não quero que mais nenhum nobre tente agir pelas minhas costas.

Seokjin assentiu e se retirou do salão, deixando Jungkook sozinho novamente. Mas antes de partir, o conselheiro hesitou na porta e disse em tom baixo:

— Majestade, há um último assunto. **Jimin**, o filho do general Park, chegou ao castelo. Ele deseja sua audiência. Parece que deseja discutir algo importante.

Jungkook não respondeu de imediato. Já havia ouvido falar de Jimin, o filho do grande general Park. Diziam que sua beleza era incomparável, mas também que ele era frágil, quase inofensivo. Um rapaz bonito, mas de pouco valor em assuntos militares. No entanto, a chegada de Jimin o intrigou. Por que o filho de seu general estaria aqui?

— Mande-o entrar amanhã ao meio-dia. — A voz de Jungkook soou fria, mas sua curiosidade foi despertada. Ele estava curioso para saber que tipo de pessoa era Jimin, e mais ainda, o que ele queria de um rei.

Quando Seokjin deixou o salão, Jungkook voltou-se para a janela. O reino que ele governava parecia vasto, poderoso, mas cada dia que passava, ele se sentia mais distante.

***

Corações em Chamas •Jikook•Onde histórias criam vida. Descubra agora