O resto do dia passa rápido, não existe interação entre os olhos verdes e eu, apenas olhares e sorrisos de quanto. Não me dou o trabalho de falar com ele, consegui em uma luta infeliz fazer o monstro ficar quieto. Mas só de pensar no garoto, eu sinto as garras dele no fundo da minha mente. Ótimo eu achei algo que o monstro gosta e eu não sei se deveria tentar e me condenar a mais um mês do veneno que ele solta em mim. Mas alguma coisa naqueles olhos dizem que vale a pena.
Eu e as meninas conversamos sobre tudo enquanto o tempo passa, fazemos nossos trabalho e rimos o tempo todo. Quando meu horário acaba, eu não sigo meu caminho para casa, na verdade eu me sento na escada e fico ali. Nenhuma das duas fala sobre isso, todo mundo sabe que meu horário acabou e o motivo do por que fiquei, pelo menos uma parte.
Su e Lu estão atendendo quando decido encher o saco do Vitor, eu gosto dele. Foi um bom amigo quando precisei e também ele tá tão ocupado na vida dele que não passa tempo me julgando, não nas minhas costas, geralmente ele faz na minha cara.
Jogo meus braços no bancão aonde Vitor e Guilherme estão e os dois me encaram principalmente Vitor que sabe o que eu to fazendo ali, mais ou menos. Uma parte está ali por que flertar com os olhos verdes, já passou do tempo.
- Entediada é? - Vitor diz
- Os dois não tem horário de saída não? - digo olhando para ambos
-A gente não tem vida e você não deveria estar em casa já? - Guilherme continua quieto, é Vitor quem fala.
- Eu já vou, só esperando o horário que Amanda se tranca no quarto.
-Sai logo desse apartamento. - Ninguém mais me aguenta reclamar e bem, eu não aguento mais.
- Acha um para mim e eu me mudo. - Digo erguendo os braços.
-Não preciso, você está quase fazendo o camelo sua casa.
- Hum, seria uma péssima ideia. Tem muita gente.
- A desculpa ai antissocial, você e o Gui combinariam, ambos não tem vida social direito. - Vitor diz e eu e Guilherme o encaramos. - Dois donos de gatos que vivem em casa.
- Eu não sou dona de gatos, não agora na verdade. Nossa tirar Amanda da minha vida só me acrescentaria coisas boas.
-Daaaam. - As vezes eu esqueço que Vítor tem dezessete anos.
- Qual o sentido do vinte e seis no seu dedo? - É a primeira vez que Guilherme puxa assunto e eu encaro minha tatuagem.
O dois no mindinho e o seis no anelar. O dedo do meio tem a cabeça da cobra que rodeia a minha mão até o pulso. Mas ele perguntou sobre o numero não sobre as outras tatuagens.
- É uma musica do Paramore, dedicatória ao meu pai. - Digo dando de ombro.
- Dedicatória? Alguém aqui tem um pai descente.- É Vitor quem diz e eu reviro os olhos.
- Pesquisa a letra da musica e você vai entender que a ultima coisa é que eu tenho um pai descente. - Meus olhos passam pela sua mão que tem uma tatuagem, eu queria ser capaz de descrever ela, mas na minha cabeça é um monte de traço, eu deveria perguntar, eu iria parecer burra? Foda-se
- Qual o sentido da tatuagem na sua mão? - digo enquanto meu olhos encaram os seus.
- É uma placa de circuito - diz ele estendendo a mão.
Certo agora eu pareço uma completa leiga, uma placa de circuito, eu nunca nem vi uma na minha vida e se vi eu não sei como é uma.
-Posso? -Digo estendendo minha mão para tocar a dele. Ele não responde só coloca a mão em cima da minha.
Deuses como eu queria o toque dele em qualquer outro lugar do meu corpo, sua mão não é o que eu chamaria de macia, mas não é áspera. Eu passo meu dedo por cada linha tatuada, como se fosse a única vezes que eu fosse fazer isso, sai como um carinho. Se ele está desconfortável não demonstra, se está gostando também não. A isso vai deixar uma marca eu meu ser. Antes que fique estranho eu largo a mão dele, ele não puxa ela de volta. Apenas me encara.
- Que foda, é interessante. - Digo meio como um murmuro.
- Você também tem uma, é uma cobra certo? - Seu olhar prende o meu como se o mundo dependesse disso. O ar no meu pulmão falta e eu sinto as garras me perfurando. - Posso?
Eu faço o mesmo movimento deixando que ele toque minha mão e ele deveria saber as consequências de me tocar. Deuses como eu odeio não ter ele para mim. Seus dedos passam pela cobra como um carinho, não é desconfortável é gostoso para porra. E eu sinto a eletricidade passar pelo meu corpo inteiro.
- Tem algum significado? - Ele pergunta ainda tocando minha mão.
- Tirando que eu acho sexy tatuagem na mão. - Digo puxando um sorriso de canto. - Cobras são o que eu chamo de justiceiras, se você encontrar uma cobra no mato o certo é ficar parado e deixar ela ir embora. Se você se move ela se sente atacada e assim ataca. Só tem dois motivos para uma cobra atacar, fome ou pelo que eu acabei de dizer. E digamos eu sou assim, me ataque e eu farei de volta.
Seu olhos me fitam, como se tentasse me decifrar, malditos olhos verdes, eu não teria problemas em nadar neles e acabar me afogando.
Sua mão ainda está tocando a minha, seus dedos chegam ate a frase "Lose your self" que fica uns três dedos abaixo da minha mão.
- E essa? - Ele diz me encarando e eu sinto as garras cravando cada vez mais em minha mente, uma risada obscura trava minha mente.
- Eminem, minha musica favorita. É clichê eu sei. - A mentira foge dos meus lábios, é meia verdade na verdade. Mas a realidade é que quanto mais eu luto pelo meu sonho, mais eu me perco e enlouqueço, esse é o significado.
- Nenhum significado a mais? - ele continua com a mão ali e algo nos olhos dele que parece me decifrar.
- É delicado, mas tenho a impressão de tudo que o Eminem passou para ter o que ele queria, o enlouqueceu aos pouco. E eu não duvido estar no mesmo caminho que ele.
E é nesse momento que os sinos na minha cabeça soam, é nesse momento que eu sei que o monstro vai atacar. Espero ele soltar minha mão, mas não acontece, ele continua com seus olhos focados nos meus, ele deveria saber das consequências de seu campo magnético, deveria saber que quando mais seus olhos me encaram. Mais eu o quero e isso vai causar um dano permanente, se vai ser em mim ou nele eu sinceramente não me importo. Ele é bonito de mais para não ser meu e eu odeio muito não conseguir o que eu quero. O monstro se alastra um pouco mais sussurrando mentiras em minha mente. Mas eu não escuto, meus olhos estão focados nele e no movimento das suas mãos nas minhas tatuagens. No momento ele faz tudo desaparecer, eu tirei a mascara por um segundo e ele não pediu explicação ou foi contra. Ele apenas ouviu, se eu tirar a mascara por completo, se todas as peças cairem, você vai fugir ou encarar o monstro que vive em mim?
Um assobio me traz de volta a realidade, Guilherme solta minha mão e nosso olhos viram para quem assobiou, Vitor nos encara com um sorriso no rosto e eu reviro meus olhos, e como sempre não dou tempo para ninguém falar nada e viro as costas, sorrindo pelos ombros. Escuto uma risada de fundo e sei que é de Vitor, ele vai me encher durante um bom tempo.
Volto para a loja, as meninas já tinham acabado de atender e estavam olhando em minha direção. Ou seja tivemos plateia. E essa aqui é uma plateia que vai me lembrar de você pelo resto da vida.
- Agora tem certeza dos olhos dele? - Su diz rindo
-Com certeza são verdes, e a mão dele causa eletricidade por onde passa. - Digo com um sorriso no rosto.
- Eu acho que só em você ele tem esse efeito. - Lu ri
- É inevitável não me queimar né?
-Emocionada de mais. - é Su quem fala e eu rio
- Você não pode falar nada, sua história com seu marido não é muito diferente. - Encaro ela com um sorriso no rosto. - Preciso ir para casa, meu corpo pede por um banho e pela minha cama.
- Vai lá, a gente se vê amanhã coisinha. - Su diz rindo.
As duas me dão tchau quando eu começo meu caminho, Denise já foi embora e eu não me dou bem com o Alemão que é o outro cara que fica na banca no período da noite. A mulher dele tem mais chifre que eu, por deus. Me viro para dar tchau para Vitor fazendo o mesmo com o Guilherme. Meu monstro está quieto e isso me assusta, faço meu caminho para casa de fone, ouvir o mundo existindo ao meu redor não me faz feliz. No meio do caminho mudo a rota e vou para a praia, eu gosto de sentir o vento gelado na minha pele, ver as ondas da praia. É nesse momento que eu acredito que mereço paz, que um dia eu terei paz mental, sem meu lado cruel existindo. Não sei se ser uma pessoa boa combina comigo, eu perdi isso aos quinze anos quando me rebelei contra o mundo ao meu redor. Empatia é uma parte de mim, mas só quando quero. Em alguns momentos eu quero ser a pessoa que finjo ser, quero ser a garota com sorriso no rosto, a que segura a barra a que faz piada e está sempre feliz. Que encontra felicidade no meio de tanta bagunça. Infelizmente existe uma abominação dentro de mim, que odeia tudo a minha volta, que gosta de reclamar e que está sempre com raiva e ódio. Eu não duvido que eu tenha capacidade de matar alguém, não mataria um inocente, mas um estuprador ou pedófilo. Eu não teria nem pena fazer a pessoa sofrer enquanto morre. É doentio pensar assim, eu sou uma pessoa doente.
Caminhar sempre me leva aos meus pensamentos mais profanos, me leva a lembrar corações que eu quebrei quando me mudei, Hiago é meu melhor amigo e claramente não se contenta com isso, o que não é problema meu, meu ex namorado se juntou com uma garota que eu não suporto e eu fui filha da puta de avisar que ela traiu ele com meu melhor amigo. Não avisei por gostar dele, avisei por não gostar dela. Eu e minha melhor amiga perdemos o contato um pouco antes de eu vir para ca, já que ela decidiu que era interessante pegar alguém que não só me traiu, mas abusou de mim. Então bem eu não fui boa quando briguei com ela. Eu não sou boa quando o assunto é expulsar alguém da minha vida. Eu sei aonde fica seu ego, sei o que o alimenta e é exatamente ali que eu cravo a lamina. E temos meu amigo de infância o único que eu cultivei a amizade e que viu todos os meus lados, digamos que Davi me conheceu na época em que eu era uma boa garota e viu toda a rebeldia que eu criei com o tempo. Ele era quem me ajudava com as drogas, ele quem me apresentou muitas pessoas. Pessoas que eu fui amiga, garotos que eu levava para cama e fingia que não existiam depois de um tempo. O único cara que realmente marcou minha vida foi o Gabriel, ele viu meus demônios e não teve medo o problema foi que os dele os assustava. Então ele foi embora e eu continuei sozinha. Já tive relacionamentos, na verdade eu tive até de mais. Mas era sempre a mesma coisa, eu lutava para te-los e quando conseguia o monstro enjoava e eu começava a me tornar alguém horrível. Minha lógica era que o monstro os ama e eu só sigo a deixa. Quando ele não quer mais, ele sai do escuro e me manipula a machuca-los. É puro eufemismo criar uma segunda personalidade para não carregar a culpa, mas foi o jeito que eu encontrei para justificar a falta dela. Já vi gente de mais chorando por minha causa e eu não ligava. Meu carma me segue por todo lugar, tudo que eu faço de ruim volta.
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Nosso reencontro
RomanceEsse livro é para aqueles que precisaram assim como a Taylor ressegnificar Reputation. É para aqueles que tiveram seu quase ultimo amor. É uma história minha, que eu vive na pele, sobre uma menina adulta encarando a vida real, mudando de cidade e co...