T H E W A R R I O R

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A noite que seguiu a chegada do exército ao Monte de Aslam foi tranquila, pois de certa forma todos ainda permaneciam anestesiados pela longa caminhada e principalmente pela magia quase palpável que pairava o ar.

O lugar era, como aparentava pela entrada baixa e escondida, um amontoado de túneis subterrâneos sustentados por algumas colunas e paredes de pedras batidas – algumas delas repletas de desenhos e figuras desgastadas pelo tempo.

Grupos se dissipavam pelo labirinto de corredores a procura de um bom local para descanso, portanto tochas e pequenas lamparinas de barro ou ferro antigo nas mãos. Aurora mesmo carregava uma delas, apontando para todas as direções e iluminando cada pequeno detalhe que fosse minimamente interessante. Até que ela chegou no final do corredor pelo qual caminhava e se deparou com um espaço mais aberto do que as paredes e colunas de pedra formavam. Não conseguiu ver muito com a pequena lamparina, mas pode sentir seus pelos se arrepiarem.

Foi então que tudo se iluminou, com uma longa chama horizontal que percorria a circunferência da sala e revelava paredes esculpidas com as imagens das mais diversas criaturas de Nárnia. No centro delas, havia um grande e bonito Leão e mais a frente, fora da parede limite do lugar, um arco de pedra quebrado, restos do que um dia deveriam ser colunas altas e uma pedra enorme e retangular, partida ao meio e gravada com alguns símbolos na lateral.

Aurora passou os olhos pela sala maravilhada com a riqueza de detalhes de cada pedaço e, enquanto rodava a cabeça para todos os sentidos, encontrou Príncipe Caspian com uma tocha ainda acesa em mãos tão encantado quanto ela.

- Que lugar é esse? – soltou piscando algumas vezes apenas para ter certeza que tudo ali era real e caminhou até a pedra retangular, tentando sem sucesso decifrar o que estava gravado nela.

- A mesa do sacrifício, como contam as histórias antigas. – Caspian respondeu juntando-se a Aurora próximo ao bloco partido. – Um dos lugares mais sagrados de Nárnia. É o local que os antigos afirmam ser onde Ele morreu para salvar o pequeno Edmundo, há milhares de anos.

Aurora, que já havia ouvido a história de Susana e Lúcia, suspirou entendendo completamente o que Caspian dizia e principalmente como dizia, pois, ao estar onde estava, se sentia completamente pequena em relação ao vasto mundo.

- Aslam. – sussurrou deixando que seus dedos tocassem a pedra e depois que espalmasse a palma sobre ela, percebendo o quão lisa e diferente das outras era. Caspian a observou tocar a superfície, seguindo os movimentos lentos de seus dedos até a rachadura. Quando Aurora parou, ele passou a olhar para o rosto alvo da garota, esperando que dissesse algo – Sua Majestade acredita? Que Nárnia foi criada com um sopro e que o filho do Imperador-Além-Mar o fez? Acredita em Aslam?

Houve um momento em que Caspian e Aurora fitaram-se intensamente e com a maior autenticidade até então. Os olhos escuros do Príncipe contra os olhos claros da garota. Porém, ele desviou o olhar para o Grande Leão, iluminado pelas labaredas do fogo, e sentiu seu coração encher-se de certeza.

- Sim. – respondeu – Eu acredito em Aslam, como acreditei nas criaturas que nos seguem agora antes mesmo de tê-las visto. – Aurora sorriu e Caspian voltou a olhá-la.

- Fico feliz que os narnianos tenham a quem seguir e que você tenha sido aquele que lhes deu essa oportunidade. – disse Aurora – Foi muito nobre da sua parte, Alteza.

- Dar-lhes o seu reino de volta, depois dos meus ancestrais terem o tirado, é o mínimo que qualquer um poderia fazer. Além disso, eles têm me ajudado mais do que eu a eles. – completou o Príncipe – Não acho que eu teria muita sorte na floresta sozinho e talvez, meu tio já teria conseguido o que queria a essa altura. 

A conversa séria havia acabado ali, depois disso aconteceram apenas alguns diálogos a respeito de onde dormiriam, mas Aurora carregava consigo a vontade de ter sido capaz de reconforta-lo de alguma maneira. Eles decidiram que dormiriam ali e se ajeitaram como dera, perto da figura de Aslam, da pedra quebrada e há uma distância suficientemente segura do fogo, mas de modo que ainda os aquecessem.

Susana, Lúcia, Edmundo e Pedro se juntaram a eles minutos depois de Aurora e Caspian deitarem no piso batido – um de costas para o outro, encolhidos e cansados dos dias que passaram apenas caminhado pela floresta densa. Os irmãos também ficaram maravilhados com a sala e exploraram cada cantinho dela antes de deitarem próximos aos outros dois, com Lúcia mais próxima da mesa de Aslam do que os demais.

Assim que o dia amanheceu, as crianças se sentiam mais dispostas do que nunca e não demoraram muito para levantar, esticar as pernas e tentar desamassar as roupas com as mãos. Elas compartilharam maças como café da manhã e partiram para os corredores, notando a movimentação apressada do exército no Monte.

Cada um seguiu um caminho diferente assim que eles chegaram a uma outra sala circular, lotada com criaturas, em sua maioria anões, aprimorando e forjando armas e portanto, o lugar tinha pilhas e pilhas de martelos, ferros, madeiras, espadas, escudos e arcos. Não demorou muito para Aurora descobrisse que na manhã anterior, Caspian havia organizado e liderado um saque a um pequeno acampamento de soldados Telmarinos e que, a maioria dos armamentos que eles tinham agora, vinham do sucesso dessa missão.

Aurora também não demorou muito para se sentir deslocada na movimentação pré batalha, já que todos ali pareciam saber exatamente o que deveriam fazer, enquanto ela caminhava de um lado para o outro, desejando bom dia e oferecendo ajuda – sempre recusada.

- Bom dia, Caça-Trufas. – disse com um sorriso assim que avistou o amigo – Precisa de ajuda com essa escavação? Parece algo meio cansativo para fazer sozinho.

- Aurora! Bom dia. – o texugo desenterrou o focinho do buraco que havia acabado de começar a fazer e riu – Pode deixar, querida, mas esse aqui é um trabalho para animais, não humanos. Além do mais, não estou sozinho, todos nós estamos seguindo os primeiros planos do Príncipe Caspian e o Grande Rei Pedro. – a garota viu vários castores, texugos, coelhos e toupeiras levantarem as cabeças e fazerem um coro de saudações para a humana, que sorriu e lhes desejou um bom trabalho antes de sair.

Tentou a sorte de se sentir útil com alguns anões, mas esses eram deveras mal-humorados pelas manhãs e o alto bater dos martelos contra as lâminas não ajudava Aurora com o desenvolvimento de um diálogo com eles. Ela até passou por alguns leopardos, mas eles eram rápidos demais para que ela conseguisse ao menos os dirigir a palavra. Então, Aurora esbarrou em Ciclone, o centauro chefe que havia discursado algumas noites atrás.

- Me desculpe, senhor. – disse erguendo a cabeça para enxergar os olhos do centauro, o qual lentamente curvou-se para a garota, segurando papéis amarelados firmemente – O que é isso? Será que eu poderia ajudá-lo ou um de seus filhos a fazer algo? Talvez eu possa levar o que carrega para alguém, o que acha?

- Filha de Eva, agradeço pela gentileza, mas esse não é um trabalho reservado a você. – respondeu com a voz grave e o tom sério e sábio – Muito menos seria útil a qualquer um aqui se ocupasse seu tempo como mensageira. Talvez, sua Alteza devesse primeiro lembrar a si mesma o que está destinada a fazer.

Assim, Ciclone saiu, caminhando sobre os cascos e abrindo caminhos entre os outros. Aurora não havia parado para pensar sobre o que tinha escutado do Centauro, apenas suspirou frustrada.
Resolveu sair dos caminhos subterrâneos do Monte. Afastou-se um pouco do lugar, terminou de rasgar um pedaço já arruinado da saia do uniforme que ainda vestia, dobrou as mangas sujas da camisa, desabotoou o primeiro botão e retirou os cabelos loiros do pescoço por um breve momento, deixando que a atmosfera de Nárnia inflasse seus pulmões e lhe trouxesse paz absoluta.

Então, seus olhos encontraram outros mais a frente. Susana atirava flechas em frutas e ensinava um grupo a fazer o mesmo. Alguns erravam, outros tinham uma boa pontaria e Susana atirava perfeitamente. Aurora sorriu e depois encontrou algo que chamou ainda mais sua atenção, Ripchip e seu exército de ratos, portando mini espadas, praticando sob o sol quente. Em poucos instantes, Aurora já estava caminhando até eles.

- Ora, vamos, mais rápido, pule! Vire! Ha! Seja ágil meu amigo rato! Isso! Vamos! – Ripchip dizia enquanto travava uma pequena disputa com um dos seus companheiros, parecendo fácil fazer o que fazia com aquela rapidez e de fato, deveria ser extremamente fácil para ele, que havia acabado de desarmar o colega – Ha! Viu? Um golpe de direita e já era, mas foi uma bela esgrima amigo. Muito boa mesmo. Já consegui sentir o sangue ferver em minhas veias e o mais alto dos inimigos não pod...

Ripchip caminhava de costas, sem notar que Aurora estava parada em seu caminho e assim, ele interrompeu sua própria fala ao bater contra as pernas da garota.

- Ah! Aurora, desculpe, não havia notado que tínhamos plateia no treino de hoje. – disse fazendo Aurora rir – Teve uma boa noite de sono?

- Boa o suficiente. – respondeu assentindo e então olhou para os demais ratos, os quais continuavam a travar pequenas batalhas uns contra os outros, e mordeu o lábio – Ripchip, eu estava... eu estava pensando e... bom, eu precisava fazer alguma coisa e ser... sabe, ser útil para o exército e...

- Não, eu não vou te ensinar a usar a espada, se é isso que está sugerindo. – o rato a cortou imediatamente e a cara de decepção que ela fez revelou seus planos – Não ensino crianças e muito menos quem nunca se quer pegou em uma espada, minhas aulas são para seres altamente treinados, donzela.

- Sim, eu sei disso, mas veja bem, eu preciso ser útil para o exército de alguma maneira e não teria algo de melhor que eu pudesse fazer em uma guerra senão saber portar uma espada. – Ripchip revirou os olhos e começou a caminhar entre aqueles que lutavam, afim de avalia-los no processo e Aurora o seguiu – Se eu não souber fazer isso, bom, alguém precisará fazer por mim e então você terá uma grande perda de desempenho cada vez que tiver que me salvar de algum soldado telmarino.

- Simples. Fique com as crianças. – respondeu o rato.

- Para que exatamente? Vê-las morrer caso formos atacados e não poder fazer nada? – retrucou fazendo com que ele parasse e a encarrasse – Vamos lá, Ripchip, você sabe que eu estou certa. E não haveria um professor melhor do que esse nobre rato que está em minha frente, campeão de inúmeras batalhas, venceu na terra, no mar. Por favor, Ripchip, não há mais nada agora que eu gostaria mais do que aprender como lutar.

Ripchip ponderou por alguns instantes, sem desviar o olhar de Aurora e então bufou, chacoalhando a pequena cabeça. Ali, Aurora abriu um gigantesco sorriso.

- Está bem, está bem. – disse com a voz arrastada e Aurora bateu palmas animadas para si mesma – Você venceu. Ei, vocês três, busquem alguma coisa boa para a humana. – fitou a garota e apontou – Só para deixar claro, eu percebi o que fez, senhorita.

E saiu, tomando um pouco de distância dos demais. Aurora o seguiu em meio a pulinhos alegres e a partir daquele momento incontáveis lições começaram a ser passadas pelo rato. Posições, como segurar uma espada, o que fazer, o que não fazer, Ripchip explicou que a luta funcionava basicamente como uma dança e que tudo o que Aurora deveria fazer era seguir os passos.

Horas se passaram, o sol cada vez mais quente sobre seus ombros, mas Aurora não poderia estar mais feliz, segurando uma espada comprida, com detalhes brancos no punho, inesperadamente leve e que se encaixava perfeitamente na sua mão.

Foi em um pequeno intervalo para descanso que Ripchip avançou na garota, soltando um grito e saltando até ela com a espada pronta para o ataque. Aurora, que recuperava o fôlego, tomou um baita susto e respondeu a ofensiva segurando sua espada em frente ao corpo, escutando o alto barulho do encontro das lâminas.

- Ripchip! – arregalou os olhos ainda assustada com o movimento – Eu não estava preparada!

- E você acha que o inimigo esperaria até que esteja? – o rato retrucou avançando novamente e Aurora se defendeu, dando alguns passos para trás – Falamos e falamos demais, Filha de Eva. Está na hora de um aprendizado prático. – e continuou a avançar, provocando e cercando Aurora – Vamos lá! Não queria aprender? Veja, está é a sua chance. Ataque. Vamos. Ataque.

Aurora cerrou os olhos para o rato, esperou até o momento que julgou como o mais adequado e atacou, pisando firme em direção ao animal ao invés de recuar. Isso fez Ripchip soltar uma gargalhada alta e empolgada, mas é claro, ele desviou facilmente do golpe.

- Vamos, Aurora. Movimente sua cintura, seu quadril, dobre os joelhos, um pouco mais, para frente e para trás. – orientava enquanto eles batiam e voltavam as espadas, um calculando os próximos movimentos do outro – É como uma dança, ataque, conduza. Isso garota, vamos!

Aurora atacou duas vezes seguidas, fazendo Ripchip pular e mudar de direção para desviar. De qualquer modo, isso já era um avanço e ela rapidamente entendeu como deveria fazer para prever o que o rato faria a seguir, e isso a ajudou não somente a escapar das investidas, mas a atacar com mais força.

A gargalhada alta de Ripchip se arrastava por todo o campo, começando a atrair a atenção dos que por ali passavam – a maioria parou para observar a disputa que ficava cada vez mais interessante e alguns se aproximaram para ver melhor. Aurora se sentiu confortável com a espada e os movimentos que seu corpo realizava pareciam estar cada vez mais involuntários. A naturalidade com que ela lutava, prendendo os dedos firmemente no punho da arma branca, a divertia de tal maneira que qualquer um perceberia o brilho que ela tinha nos olhos.

Então, a batalha havia ficado mais séria, com os dois se mexendo rapidamente, girando, pulando, atacando e defendendo com destreza absoluta. Susana e seus aprendizes também pararam para observar, Lúcia, Trumpkin e Edmundo se aproximaram e Pedro e Caspian pararam o planejamento de guerra apenas para assistir ao duelo, até que Ripchip, em um golpe rápido, conseguiu esticar a pequena espada até o rosto de Aurora e ela se deu por vencida, iniciando uma série de aplausos por parte dos espectadores.

- Te peguei. – Ripchip disse lentamente enquanto tentava recuperar o fôlego – A senhorita... a senhorita nunca tinha segurado uma dessas antes? – apoiou-se sobre os joelhos fazendo Aurora rir e negar, enquanto essa também se recuperava fisicamente.

- Aurora! Isso foi incrível! – Lúcia disse animadamente correndo até eles – Eu não fazia ideia de que era boa com espadas.

- Nem eu. – ambas as garotas riram com a resposta de Aurora e ela pode ver Susana acenar empolgadamente de longe – Obrigada, Ripchip, você é mesmo um nobre e valente rato.

- Tenho que admitir criança – disse Trumpkin com a voz grave – Você me parece como uma dessas naturais. – Aurora sorriu fazendo uma breve reverência como agradecimento e Ripchip concordou com o anão, começando a apontar possíveis melhoras no desempenho da garota.

- Nada mal para uma primeira vez. – Edmundo elogiou – Nada comparado com as habilidades de alguém que reinou durante anos, mas é um começo. – riu da própria piada e Aurora revirou os olhos permitindo que um riso nasal escapasse.

- Bom, talvez eu precise de algumas aulas extras. – Aurora disse encarando o rato que ainda falava sozinho até ouvir o que ela havia dito, então ele parou e forçou um sorriso.

- Claro, eu nunca recusaria uma boa esgrima, mas soldados telmarinos não possuem a minha altura e com certeza não possuem minhas habilidades com a espada, seria cansativo demais para a Filha de Eva, seria sim. – Ripchip disse retirando o pequeno anel que usava na orelha por um momento - Acho que precisa de um oponente do seu tamanho, talvez o Príncipe seja adequado. No tempo livre.

- Príncipe Caspian? – Aurora franziu o cenho – Acho difícil termos tempo livre ao estarmos nos preparando para uma guerra, Ripchip. E o príncipe...

- Deveríamos fazer. – Aurora virou a cabeça em direção o som e encontrou Caspian, o qual carregava variados papéis e agora a encarava – Que tipo de Príncipe eu seria se recusasse um duelo justo com uma bela donzela? Certo que não seria o melhor deles. Quando a senhorita quiser, será um prazer. Mas agora, preciso que todos compareçam na Mesa de Aslam. Nós temos um plano.

- Finalmente. – Trumpkin disse se dirigindo para a construção acompanhado de Ripchip e Caspian fitou cada um presente mais uma vez antes de sair ao chamado de outros, concentrado demais no que segurava em mãos. 

Aurora encarrou a pequena Lúcia com as bochechas quentes. Lúcia também a encarrou, prendendo um riso contra os lábios. Talvez, se elas estivessem longe de Nárnia, sem uma guerra para travar, conversariam muito mais sobre cada pequeno acontecimento do dia.

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⏰ Última atualização: Nov 03 ⏰

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