CAP4| Crédula

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"Como uma trepadeira que se enrola em torno de um tronco, quanto mais se estende, mais difícil é se libertar."
- Rabbit.

°˖❀˖°

"Obrigado"

Com essa palavra singela, despedi-me de Koya, que me deixara à porta de casa, como nas recentes noites.

Quando o vi desaparecer ao longo da estrada, voltei a encarar a residência onde morava com os Yanagi. Era um local que já havia conhecido tempos melhores, mas, desde que ficou sob a propriedade de Yuhiko Yanagi, parecia ceder ao peso do abandono, como uma planta apassivada em um jardim negligenciado. A escuridão da noite envolvia o ambiente, evocando memórias de um Halloween distante, em que a linha entre a realidade e o imaginário se confundia. Disfarçada de zumbi no meu pensamento, sentia meu corpo exausto pelo turno de trabalho, drenado pelo esforço da rotina.

O que um dia foi um jardim vibrante agora se tornara um emaranhado de ervas daninhas e grama alta. As trepadeiras, como braços cansados, pendiam das paredes desgastadas, tentando envolver as janelas em um abraço de melancolia. Uma das janelas da frente exibia um vidro quebrado, coberta por tábuas que eu mesma preguei, uma tentativa surda de resistir à decadência. A varanda do andar superior, com suas grades de madeira, era um cemitério de folhas secas, caídas sem cerimônia enquanto eu estava fora. Era eu quem assumia a responsabilidade pelos afazeres domésticos, sempre lutando para manter os espaços limpos, apesar da falta de tempo que quase me impedia de alcançar essa meta.

A luz externa falhava, piscando no ritmo de um coração hesitante. A expectativa de que o senhor Yanagi consertasse o problema, como prometido pela manhã, desvanecera-se. Entretanto, mesmo diante da frustração, um lampejo de determinação iluminou meu espírito. Aprendi a consertar o que estava quebrado... "a vida nos ensina a buscar soluções para as nossas necessidades", mas esse problema teria que esperar até outra hora.

Suspirei profundamente ao abrir a porta, a chave deslizando na fechadura, enquanto o ranger das dobradiças enferrujadas ecoava na calma da noite.

Quando a porta se fechou novamente, um som inesperado de tosse quebrou o silêncio, surpreendendo-me. Voltei-me lentamente e encontrei Mya, o rosto coberto por uma máscara de creme de pepino verde, conferindo-lhe um ar etéreo, ainda que cômico. O inesperado fez meu coração disparar.

Através do arco que separava a sala do pequeno hall e da cozinha, a cena familiar se desenrolava: a televisão sussurrava as notícias da noite e uma caixa de cerveja repousava descuidadamente ao lado do sofá. O arroto que ouvi pertencia ao senhor Yanagi, um indício claro de que todos na casa ainda estavam acordados, imersos em suas rotinas disfuncionais.

- Oi, senhora... - tentei iniciar, mas fui abruptamente interrompida.

- Você sempre chega a essa hora em casa, Harelyn? - a voz de Mya Yanagi soou com curiosidade cortante. - Faltam poucos minutos para a madrugada.

Meu coração acelerou; não podia ignorar a estranheza de sua pergunta, sabendo que já esclareci meus horários para eles diversas vezes. O silêncio se instalou entre nós e meu olhar vagueou, inseguro.

- Sim, senhora - respondi, buscando firmeza nas palavras.

- Oh, é mesmo... - sua resposta ressoou como um eco de ironia, uma característica que parecia colar-se à sua essência.

Percebi os detalhes que saltavam à vista. A louça do jantar ainda estava acumulada na pia e os sapatos de Mya estavam espalhados pelo hall, evidenciando um estado de desordem que não deixei antes de ir ao colégio.

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⏰ Última atualização: Nov 10 ⏰

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