Olho-me no espelho, examinando cada detalhe do meu jaleco. A textura, o caimento... eu mal podia acreditar que finalmente estava usando um. Era como se pudesse flutuar de tão leve que me sentia; parecia estar nas nuvens.
Depois da conversa com o Dr. Conner, ele me apresentou a Clara, uma interna. Latina e com um sorriso acolhedor, ela havia começado a trabalhar há menos de seis meses. Foi extremamente simpática e me mostrou os lugares mais importantes do hospital, incluindo a sala de descanso e o vestiário, onde estou agora.
– Pronta? – ouço a voz de Clara, que entra na sala com um sorriso. – Você ficou ótima nesse jaleco! – comenta, apontando para mim.
– Obrigada – agradeço, tentando esconder o rubor. – O que devo fazer agora?
– Vou te levar até a sala da Dra. Maya – responde Clara com firmeza. – Ela vai te passar as coordenadas de hoje. Ah, e uma coisa, ela é excelente no que faz, mas anda numa fase difícil... Se for um pouco dura, não leve para o lado pessoal.
Escuto atentamente suas palavras e, sem querer, sinto meu corpo ficando tenso. Meu nervosismo começa a transparecer, mas respiro fundo, tentando me preparar para o que está por vir.
– Não precisa ficar nervosa. Se precisar, estarei aqui para ajudar! – diz Clara com firmeza, segurando meus ombros com um toque de encorajamento e um pequeno sorriso que parece iluminar o ambiente.
– Vamos?
– Vamos.
Caminhamos juntas em direção à sala onde vou conhecer a mulher com quem trabalharei. No caminho, pensamentos insistem em dominar minha mente, e não consigo evitar a pergunta que lateja dentro de mim: Quando foi que tudo isso se tornou real? Será que vou conseguir fazer um bom trabalho aqui?
Há muito em jogo. Preciso desse dinheiro, então ser mandada embora simplesmente não é uma opção. Além disso, só o fato de ter uma experiência assim já é um passo imenso para a minha carreira. E, por último, talvez o mais importante de tudo: não posso decepcionar Amélia, nem manchar a confiança que ela depositou em mim com essa indicação.
Tento organizar meus pensamentos, forçando-me a pensar positivo. Trabalhei por anos com o público; nada aqui deveria ser tão diferente. Vou conseguir fazer um bom trabalho. Eu consigo.
Clara bate duas vezes na porta e, ao abri-la, pede licença. Quando entro na sala, noto que ela lembra um pouco a do diretor, embora menor e com tons mais claros. Apesar das diferenças, o espaço exala a mesma elegância e um cuidado minucioso na decoração.
– Bom dia, Dra. Maya. Trouxe sua nova assistente, Arabella – anuncia Clara à mulher que está de costas, parada em frente à janela, me impedindo de ver seu rosto. – Aqui está ela. Com licença.
Clara se despede, mas antes de sair, sussurra um "boa sorte" ao meu ouvido, com um sorriso de encorajamento, e desaparece pela porta. Fico ali, sozinha, enquanto o silêncio toma conta do ambiente, e um desconforto crescente começa a surgir.
A mulher continua imóvel, de costas para mim, observando a vista pela janela. Não sei se devo dizer algo ou me aproximar. Quero que ela faça algum movimento, qualquer coisa, para quebrar essa espera incômoda que pesa no ar.
– Com... – começo a falar, mas sou interrompida por um gesto da mulher.
Imediatamente encolho os ombros e volto ao silêncio, parada no meio da sala. A vejo respirar fundo, e posso jurar que ela conta até dez antes de se virar lentamente, revelando seu rosto. Para minha surpresa, é a mesma mulher que vi mais cedo.
Como imaginei, hoje definitivamente não é um bom dia para ela; a expressão de descontentamento em seu rosto deixa isso claro. Embora tente manter um ar neutro, há uma carranca evidente em sua face.
– Desculpe, precisava de alguns minutos em silêncio – ela começa, caminhando em minha direção. – Meu pai mencionou sua chegada. Estava esperando por você.
Ela se dirige até a mesa e se senta, apontando para a cadeira à sua frente com um leve gesto. Vou até o lugar indicado, sentando-me com cuidado e repousando as mãos sobre o colo, tentando manter a calma.
– Bom, eu sempre trabalhei sozinha, sem assistência direta além da minha equipe médica – explica ela, em tom sério. Assinto em silêncio. – Mas meu pai mencionou que você veio indicada pela Amélia e me pediu para considerar a proposta. Por sorte, tenho mais trabalho do que posso lidar sozinha; entre consultas e cirurgias, preciso me organizar melhor.
Continuo em silêncio, atenta ao que ela diz.
– Você ficará responsável por essa organização e me ajudará no que for necessário. Em troca, vou permitir que participe de algumas cirurgias, pelo menos, daquelas em que achar importante a sua presença.
Só de estar ali, eu já me sinto além do que poderia sonhar.
– Obrigada – agradeço, com a voz firme. – Garanto fazer um bom trabalho, senhora.
– Me chame pelo nome. Gosto de respeito, mas não quero ser chamada de senhora – adverte, lançando-me um olhar direto. – E espero realmente não me arrepender.
Faço um aceno com a cabeça, indicando que entendi.
– Talvez você já saiba, mas meu nome é Maya, sou filha do Dr. Conner – diz ela, estendendo a mão para mim. – Seja bem-vinda, Dupont.
Depois de tudo explicado, recebo a instrução de estudar a rotina de trabalho de Maya. Segundo ela, se eu realmente fosse assumir esse cargo, precisaria estar plenamente familiarizada com seu ritmo, que não é nada tranquilo.
Passo o resto do dia sozinha em sua sala, lendo e memorizando cada detalhe de sua agenda. Ela segue uma rotina rígida, pontuada apenas por saídas rápidas e almoços. Maya parece ser o tipo de pessoa extremamente controlada e organizada. Totalmente o oposto de mim.
Não que eu seja desorganizada, mas ainda luto para manter uma rotina consistente. É difícil manter tudo sob controle quando a vida sempre traz imprevistos. Mesmo assim, faço o possível.
Após horas de leitura e esforço, finalmente tenho tudo formulado em minha mente. Começo a organizar minhas coisas e, instintivamente, arrumo também a mesa da minha chefe. Como ainda não tenho um espaço próprio, Maya permitiu que eu usasse sua mesa até que providenciassem uma área de trabalho só para mim.
Depois de tudo organizado, recolho minha bolsa e saio da sala, deixando a chave na pequena recepção do andar, conforme Maya havia orientado.
Caminho calmamente até o elevador e, enquanto espero, deixo o cansaço me invadir, mas de uma maneira boa. No reflexo do espelho dentro da cabine, vejo um sorriso cansado, mas genuíno. Estou feliz. Realizada. Espero nunca parar de me sentir assim. Depois de tanto tempo, me sinto leve, com o peso das preocupações diminuído. Claro, elas ainda existem; preocupação sempre fará parte da minha vida. Mas agora sinto que posso dormir sem pensar tanto em "sobreviver."
Passo a mão pelos cabelos, ajeitando alguns fios fora do lugar. Solto o ar dos pulmões, aliviando o peso final do dia, e sigo meu caminho para casa. Ao chegar, sou recebida com o conforto e as palavras calorosas da minha avó.
Estou, enfim, me sentindo meio realizada.
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Love Reason - Billie Eilish
FanfictionTodos falam que o amor não é uma escolha, que não se pode escolher por quem se apaixonar e quando isso pode, ou não, acontecer. Mas e se você for obrigada a escolher entre o amor da sua vida, ou o seu futuro? Esse é o caso da Arabella. Garota subur...