Segunda-Feira, 23/02 - Parte 2

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Maria pega três ônibus para chegar até seu trabalho. O primeiro deixa ela em um terminal, onde ela pega o segundo ônibus, que a leva a outro terminal, e lá ela adentra o último ônibus que a deixa a duas quadras de seu trabalho. Durante a ida para o segundo terminal, ela ouve dois jovens conversando e acaba lentamente prestando atenção no que eles falam, por cima da música em seus fones.
— Mas você ouviu que tem rolado mais casos de assassinato? — um deles diz. — Então, você viu que tão falando que a polícia tem tentado ocultar o caso? Do que já vi sendo dito em umas páginas de fofoca, todas as vítimas perderam a cabeça.

— Tu tá ficcionado nisso, mané. E tá chato, todo dia o mesmo papo — seu colega comenta, incomodado.

Há algumas semanas, esses casos começaram a surgir, estourando na mídia e repercutindo cada vez mais até finalmente virar "o caso do mês". O grande mistério que a mídia cobre com cada vez com mais afinco e sensacionalismo, tendo seções inteiras do jornal da noite dedicadas aos casos, sem falar dos portais não-oficiais de notícias. Maria não pode negar: são mortes estranhas e um "evento" daqueles era incomum e gerava um burburinho. Pessoas encontradas decapitadas e um potencial serial killer.

O conflito entre a polícia estar parecer cobrir mais o caso e a imprensa querendo saber mais começou a virar uma fofoca por si só, ambos especulando sobre quem é o assassino. Sem uma preferência clara por gênero ou algum detalhe que as conecte, ainda se entende pouco do que poderia estar motivando essas mortes ou ajudar a compreender e encontrar o serial killer.

Na noite passada, no domingo, Maria só foi dormir depois de ver, ler e assistir coisa demais sobre essa situação na cidade e agora teoriza se não foi isso a chave do pesadelo, de como essas mortes a fazem lembrar do passado. De Will.

"Sim, deve ter sido por isso," ela pondera, convicta. "Preciso parar de ver essas coisas antes de dormir."

Ansiosa, ela puxa seu celular, passando a focar somente em si e não na conversa de estranhos. Ela vê um anúncio de um restaurante que está com promoções no fim de semana e que prometem super descontos para aniversariantes. Ainda parece que vai ter um evento importante no sábado, dia 28. Automaticamente pensa no seu aniversário. Tem desconto, algo que ela precisa. Se pergunta se seria uma boa ir nesse tal restaurante, para aproveitar a promoção e economizar seu dinheirinho. Já tinha ouvido falar dele, inclusive. Serve comida italiana e passou a ser bastante elogiado e bem frequentado, possivelmente seria do agrado de Carol. A única desvantagem são os relatos do dono do lugar dando piti ou discutindo com clientes. Um de seus amigos do grupo com Carol, Juan, já tentou chamar ela e os demais para irem nesse tal restaurante italiano, mas Maria sempre desviava o convite.

Alternativamente, Maria pondera uma comemoração de aniversário o mais pequena e barata possível. Em casa, um bolinho, um cento de salgado. Seu aniversário era complicado desde pequena, seja com os pais insistindo em fazer coisas temáticas e querendo chamar muita gente (muita família que Maria só via nessas datas) em prol das aparências. Seu pai sempre correndo risco de beber demais sem querer e a festa virar uma situação assustadora. E como no começo de Fevereiro normalmente eram férias, os coleguinha da escola nunca iam para sua festa.

"Não que eu tivesse muitos amiguinhos", ela pondera. "Feminina demais para ser amiga dos meninos e arteira e, logo, masculina demais para ser amiga das meninas."

E nisso sempre lhe vem Will, seu vizinho. Um garoto que não somente tinha sua idade, mas nasceu no mesmo dia que ela. Ele adorava as festas de aniversário, e sempre arrastava Maria para as dele, geralmente fazendo as duas famílias comemorarem juntos. E assim, as festas de Maria ficavam menos piores, alegres e animadas.

"Seus amigos que nem sabem sobre o Will", sua mente a provoca. "Não sabem sobre a porta. Sobre você."

Distraída e com a cabeça tão cheia, Maria esbarra em alguém após descer do ônibus já no terminal, rumo ao outro ônibus. O coitado do rapaz que Maria esbarra parecia mais assustado que ela.
— Ah, meu deus, perdão! — o rapaz exclama. — Eu machuquei você? Céus, meu Deus do céu, mil desculpas.

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