2. Alma quebrada

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Mesmo desacordada, o cérebro de Lily ainda estava ativo. Quando Lily se tornou consciente novamente, notou-se em um espaço escuro e frio. A única fonte de iluminação era uma luz acima de sua cabeça. Ela olhou para cima, apenas para ver uma imensidão assustadora. Um sentimento desconfortável começou a surgir em seu âmago, como se diversos olhos estivessem a observando.

Como um show de uma pessoa só.

“Alguém está aí?” Ela falou com cautela.

Ninguém respondeu.

“Por favor, alguém está aí?” Sua voz começou a ficar chorosa.

O silêncio ensurdecedor parecia estar brincando com sua psique já fragilizada.

Um pensamento passou por sua cabeça. A última coisa de que lembrava era de ter seu coração arrancado por aquele homem demoníaco. Quando olhou para baixo, sua respiração, mesmo que inexistente, estagnou.

Havia um buraco enorme em seu peito. Além disso, suas mãos pareciam menores, e sua voz estava mais jovial.

“O que… o que está acontecendo…?” Lily começou a hiperventilar. Logo, sua respiração instável se tornou soluços, e esses soluços se tornaram berros.

“Ah… Ah…. Ah….” Por que isso estava acontecendo com ela? O que ela fez para merecer isso?

A garota, que parecia ter 17 ou 18 anos, acordou ao som de gritos, que pareciam abafados, mas, ao mesmo tempo, próximos. Ela olhou para cima, mas seus longos cabelos brancos atrapalhavam sua visão. Balançando sua cabeça para tirá-los do caminho, vislumbrou um ponto focal de luz. Nele estava uma menina, a dona dos gritos.

Seus pensamentos mal tinham se formado, e sua identidade ainda era um borrão, entretanto, desde o momento em que veio à consciência, sabia que seu único objetivo estava lá — a chorosa menina.

Proteger, proteger, proteger.

Uma voz não parava de se repetir em sua cabeça. Sem saber, começou a caminhar em direção à garotinha, passo a passo. Quando chegou, sabia o que fazer de forma instintiva. Agachando-se, ela abraçou Lily. A garota que acabara de vir à existência começou a cantarolar uma cantiga de ninar extremamente familiar para Lily.

Era a cantiga que sua mãe cantava. De maneira instantânea, Lily relaxou sua guarda e se deixou levar.

Tac, tac, tac.

O som de passo assustou as duas.

A garota se virou e perguntou: “Quem é?!”

O homem a olhou com indiferença e não respondeu, continuando a se aproximar. Ele pegou seu rosto com força e indagou: “Eu me pergunto o mesmo. Você não é ela.” Ele olhou para Lily, abraçada pela garota.

Seu rosto se iluminou: “Oh! A mente dessa menina se quebrou em várias partes!”

“Inclusive, eu sou uma delas?” Ele continuou falando consigo mesmo, parecendo entretido com sua condição atual.

Logo, sua expressão voltou à apatia extrema, e suas pupilas vermelhas entregaram todas as emoções que passaram pelo rosto da garota. “É uma pena… porque eu só preciso de uma.”

A garota estava extremamente confusa com tudo isso. Quem era esse homem? O que ele queria? No entanto, ela não tinha tempo de pensar nisso. Assim como um reflexo, segurou a mão de Lily e começou a correr.

O mar de escuridão a afogava, mas ela não desistiu de fugir. Finalmente, ao longe, viu uma porta. Chegando lá, ela fechou a porta e percebeu que se encontrava em um pequeno quarto.

“Vai ficar tudo bem…” Ela sussurrou para Lily e beijou sua cabeça. Lily continuou chorando.

Então, olhou ao redor. Mesmo na escuridão, ela era capaz de ver a cama, uma mesa e fotos de família penduradas na parede.

Parecia… ser a família da garotinha em seus braços. E ela não estava em nenhuma das fotos dela.

O rosto da menina perdeu toda a expressão.

Então, quem era ela?

BAM!

A porta foi destruída com um simples chute. Jogadas no chão, ambas olharam para o culpado.

Ele estava sussurrando, não parecendo ter a menor pressa: “Celestine, Celestine… Então esse é o meu nome.”

Apontou para Lily, dizendo: “E você se chama Lily…”

Em seguida, para a garota: “Quanto a você, não passa de um fragmento de alma desconhecido.”

A garota estava ofegante de raiva, amaldiçoando-se por ser fraca e só ser capaz de fugir diante de Celestine.

Celestine, por sua vez, parecia bem feliz com a situação. Ele se aproximou e puxou Lily indelicadamente, prendendo, em seguida, a garota na parede com um piche negro. “Fique aí enquanto eu descubro o que fazer com você.”

Lily ficou chocada ao ponto das lágrimas pararem de escorrer. Quando olhou para as pupilas escarlates de Celestine, seu corpo congelou.

“Lembre-se, não deixe ninguém descobrir que sua mente está estilhaçada.”

Em seguida, sem nem poder responder, ela desmaiou.

Caelus já estava decidido a abandonar seu corpo em troca da salvação. Para ele, este, no estado atual, não passava de um fardo. Por isso, mesmo que tivesse que se submeter a um feitiço perigoso e viver num corpo jovem e humano, mesmo que temporariamente, tal coisa não abalava sua determinação.

Sem hesitar, começou a recitar um feitiço de possessão antigo. Tal feitiço tinha o objetivo de subjugar a consciência no corpo e apagá-la, para que a consciência do conjurador pudesse assumir o corpo. Entretanto, ao contrário das suas expectativas, não bastou se preparar mentalmente. Algo estava dando errado.

“Cough, cough, até nisso essa garota burra me dá trabalho.”

Caelus tinha passado anos afundado em esquemas e não se assustou quando uma coisa deu errado. Ele sabia que a melhor solução era continuar persistindo.

Quando se tornou ainda mais decidido, seu instinto o alertou do perigo. Haviam o descoberto!

O espaço se partiu na sua frente, quando um homem de máscara saiu andando lentamente. Sua veste intocada e máscara de raposa lhe deram uma majestade invejável, mas tudo que Caelus conseguiu sentir foram chamas de ódio.

“Você! Como você me encontrou?!”

“Não me vejo obrigado a dizer meus métodos para você.” Sua voz parecia a de um adolescente, exalando juventude. Mesmo assim, sua aura rivalizava com a do demônio — não, a superava.

Ele franziu a testa, dizendo: “Você realmente é ingênuo o suficiente para pensar que isso daria certo? Possessão é uma magia perdida, como seria possível replicá-la!”

“Humanos como você obviamente não têm os meios…” Caelus ainda encontrou forças para rir, mesmo estando a um passo da morte.

O jovem não caiu nessa, levantando a mão para impedir a adaga escondida que estava mirada para sua cabeça.

“Você sabe que não é páreo para mim.” Ele disse com confiança, expressando uma arrogância com um embasamento — sua força.

“Isso não me impede de tentar!” Dito isso, Caelus correu em direção a ele, tirando e arremessando várias adagas.

O adolescente nem sequer se moveu, apenas defendendo os ataques. Assim que Caelus se aproximou, ele fez sua primeira ação.

Crec.

O pescoço de Caelus se entortou em nível inumano. Entretanto, ele ainda não estava morto. O jovem ficou surpreso, mas antes que pudesse finalizar o trabalho, apressadamente armou uma barreira para ele, Lily e seus pais.

BOOM!

A Beleza da Vida e da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora