Visão de Manjiro sano
O Eclipse era o mesmo de sempre. Uma selva de luzes, sons e pessoas tentando desesperadamente esconder seus segredos sob um véu de ruídos e apostas. Eu me movia pelo salão com a confiança de alguém que sabia onde estava pisando, como um predador que conhece cada sombra do seu território.
Hana deveria estar em algum lugar por ali, mantendo um perfil discreto, mas eu sabia que ela não conseguiria evitar chamar atenção. Ela tinha um jeito de se destacar, mesmo quando tentava se esconder. A missão era arriscada, e eu não gostava da ideia de deixar uma novata lidar com isso sozinha, mas não tive escolha. Ela precisava aprender.
Enquanto eu observava as mesas de longe, procurando sinais de Katsuo, meus olhos captaram um movimento ao longe. No canto do bar, entre sombras e luzes oscilantes, eu a vi. Ela parecia nervosa, mas tentava disfarçar. Pedindo uma bebida, observando o ambiente com olhos ávidos, como um animal encurralado tentando se convencer de que estava no controle. Era quase... adorável.
Minha atenção foi desviada quando notei um homem se aproximar dela. Alto, pesado, bêbado o suficiente para achar que podia fazer o que quisesse. Eu vi o momento em que ele agarrou o braço dela, e o modo como Hana endureceu, sua postura rígida tentando ocultar o medo. Minha mandíbula se contraiu.
Eu deveria deixá-la se virar sozinha. Ela precisava aprender a se defender, a lidar com o inesperado. Mas quando ele a puxou contra o corpo, e suas mãos começaram a se mover de forma possessiva, eu senti algo sombrio ferver em meu peito. Um toque que não lhe pertencia. Uma transgressão que eu não podia ignorar.
Os segundos pareceram se arrastar, enquanto eu observava, esperando que ela reagisse, que desse algum sinal de resistência. Mas a dor nos olhos dela, o modo como a frustração e a humilhação passaram por seu rosto, me atingiu de uma forma inesperada. Não podia permitir aquilo. Não com ela.
Cruzei o espaço entre nós antes mesmo de perceber o que estava fazendo. E quando minha mão tocou o ombro do homem, foi como se o mundo tivesse parado. Ele me encarou por um momento, e eu não hesitei. Meu corpo agiu por instinto, empurrando-o com força suficiente para derrubá-lo. O som do impacto ecoou pelo salão, e tudo ao redor pareceu ficar em silêncio. A raiva no meu peito queimava como fogo, mas eu mantive o controle.
— Não toque no que me pertence. Ou vai se arrepender amargamente.
Minhas palavras saíram afiadas, carregadas de uma ameaça que ele, finalmente, entendeu. O olhar do homem vacilou, ele sabia que não valia a pena desafiar a morte estampada nos meus olhos. Quando ele se afastou, humilhado, minha atenção voltou-se para Hana. Ela parecia menor agora, vulnerável, tentando esconder a fraqueza que eu havia testemunhado. Uma parte de mim queria repreendê-la pela fraqueza, mas outra parte... queria segurá-la, protegê-la.
Ela cambaleou, e antes que pudesse cair, meus braços já estavam ao redor de sua cintura, sustentando-a. Seus olhos subiram lentamente para encontrar os meus, e naquele momento, senti algo que não deveria sentir. Eu deveria me afastar, manter a distância. Ela era uma peça no tabuleiro, uma ferramenta para um propósito maior, mas quando a vi ali, tão perdida, algo dentro de mim se suavizou.
— Está tudo bem? — perguntei, tentando manter a voz firme, como deveria ser.
Ela assentiu, mas estava claramente abalada. Desajeitada, tentava recuperar a compostura, a fachada de força que se desfez com o toque de um desconhecido. Ela murmurou algo sobre a missão, e eu apenas ouvi. Era mais do que claro que ela não tinha ideia do perigo que enfrentava, e isso me irritava e fascinava ao mesmo tempo.
— Você se colocou em risco. — Minhas palavras foram duras, mas era a verdade. Ela precisava entender as regras deste mundo, ou não sobreviveria.
Ela reagiu de forma defensiva, e eu vi a faísca de raiva em seus olhos. A mesma faísca que eu havia notado desde o início. Hana era teimosa, obstinada, mas ao mesmo tempo frágil. Não conseguia admitir que precisava de ajuda, mesmo quando isso estava estampado em seu rosto.
Quando ela tentou argumentar, apenas sorri. Um sorriso leve, irônico, mas também havia um toque de algo mais — algo que eu me recusava a nomear.
— Claro que sabe. — Deixei a frase pairar no ar, e sua resposta foi exatamente o que eu esperava: um silêncio de ressentimento e compreensão. Ela ainda não sabia jogar esse jogo, e precisava de mim mais do que queria admitir.
Olhei ao redor, certificando-me de que estávamos fora de perigo, e indiquei que ela me seguisse. A tensão entre nós era palpável, mas eu sabia que ela viria. Guiá-la até a mesa foi uma forma de mostrar que eu estava no controle, que, de alguma forma, ela ainda estava segura comigo, mesmo que não admitisse isso.
Enquanto eu a instruía, explicando cada detalhe da missão, percebi que ela ouvia com atenção, absorvendo tudo. A expressão determinada havia voltado, e por um momento, quase admirei sua persistência. Ela tinha potencial, uma força que ainda não compreendia completamente.
Quando terminei, nossos olhares se encontraram, e eu vi algo diferente nela. Uma dúvida, uma incerteza que não deveria estar ali, e que, de alguma forma, eu havia causado.
— Você vai conseguir, Hana. — Minha voz era firme, quase um comando. Eu precisava que ela confiasse, que entendesse que, se falhasse, as consequências seriam severas. — Mas lembre-se: nada de erros. E se precisar de ajuda, venha até mim. Só a mim.
Ela hesitou, e por um breve instante, eu vi a luta interna em seus olhos. Ela estava dividida, entre o orgulho e a necessidade. A escolha estava feita, mas sabia que eu tinha plantado algo nela, algo que a faria pensar duas vezes antes de se afastar.
Enquanto ela se virava, voltando para sua observação, fiquei ali, a observando de longe, sabendo que algo havia mudado. Talvez fosse perigoso, talvez eu estivesse me envolvendo mais do que deveria, mas naquele momento, não importava. Hana estava sob minha proteção, e ninguém a tocaria sem que pagasse o preço.
E, talvez, eu também pagasse por isso.
𝓡𝓪𝓲𝓷𝓱𝓪 𝓭𝓮 𝓒𝓸𝓹𝓪𝓼 – Manjiro sano
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𝓡𝓪𝓲𝓷𝓱𝓪 𝓭𝓮 𝓒𝓸𝓹𝓪𝓼 - Manjiro sano
Fanfiction"Se o meu coração não puder ser teu, então deixe que o sangue dos sonhos desfeitos corra, e que todos os obstáculos sejam arrancados, como cabeças que caem ao chão."