Setembro de 1807 -
Bordeaux, França – Yvone
– Léon, o que pensa sobre mim? – indaguei ainda com aquelas perguntas de dois dias atrás na cabeça. Estávamos caminhando pelos jardins da propriedade de meu pai, lado a lado. A chuva havia parado ontem e agora o tempo mudara para ensolarado. O verão não demoraria passar para adentrar o outono, mas ainda assim o calor se mantinha.
– O que quer dizer, querida Yvone? – Sua voz estava doce, seu olhar, iluminado.
– Exatamente o que perguntei.
Paramos de andar debaixo de um enorme carvalho e nos sentamos num banco de pedra que havia ali. Ele tomou minhas mãos entre as dele e se inclinou para frente, aproximando. Senti seu perfume de onde estava.
– A senhorita é linda. É engraçada e espontânea, educada... Mademoiselle Deveux, és a mulher que todo homem direito gostaria de ter para si. Meus pensamentos sobre ti são apenas os melhores. Aquele beijo que aconteceu entre nós em nosso primeiro encontro foi apenas fruto dos sentimentos que a senhorita despertou em mim. – Ele sorriu com tanta perfeição que corei. – Sim, estou apaixonado, Yvone.
...
San Sebastián, Espanha - Enrique
– Boa tarde, senhor trabalhador. – Era a terceira vez que ela ia me ver. Ia sempre de tarde desde que conversamos pela primeira vez. Vera estava vestida com um vestido comprido que quase arrastava no chão, mas parecia leve e não muito quente, trazia pendurado no braço uma cesta trançada coberta por um pano. – Como vai o senhor nesta tarde tão abrasadora?
– Bem cansado, querida desconhecida. – Ela me apelidara de "senhor trabalhador" quando lhe contei sobre meu segundo emprego nas docas e eu a apelidara de "querida desconhecida" quando recebi uma resposta mal-educada por perguntar sobre sua vida. – Como sempre bem cansado.
Ela sorri e se aproxima. Pouco tempo nos conhecíamos, mas parecia que era muito. Por algum motivo eu recebia aquelas visitas vespertinas agora, onde conversávamos fluentemente, e depois ela me acompanhava ao cais, então partia para sua casa, sozinha. Ficava a observá-la até que virasse a esquina e sumisse de vista para então ir ao trabalho. Vera estava se tornando o mais próximo que eu tinha de uma amiga. Era a primeira em alguns anos...
– Lhe trouxe algo. – Ela coloca a mão por debaixo do pano da cesta e tira dali um pedaço de pão com queijo que me deu água na boca. – Você nunca come nada antes de ir trabalhar no cais então decidi fazer uma boa ação.
Sorri e me entrega o lanche.
– Obrigado – respondo também sorrindo. – Não precisava.
– Não precisava é agradecer. – Eu aceno com a cabeça e começo a comer. Ela me espera em silêncio. Seus olhos me diziam que era proposital, que estava me aguardando para não atrapalhar. Dei a última mordida e a olhei mais uma vez, apoiada nos cotovelos do outro lado do balcão. Vera Álvarez, a incógnita que surgira em minha vida. Ficamos naquela troca de olhares sem dizer nada, mas falando muito ao mesmo tempo. – Seu olhar me deixa constrangida.
Desvio.
– Desculpe, estava apenas pensando.
– Em quê?
– Você. – Ela arqueia as sobrancelhas e dá um leve sorriso. – Que é diferente das outras mulheres.
– Diferente como?
– Não sei. Você fala o que pensa, faz o que deseja, não tem medo do que os outros te consideram. Mas ao mesmo tempo é fechada e parece temerosa que algo aconteça de errado. Como se carregasse uma concha onde pudesse sempre se esconder.
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Cariad
RomanceEnrique Lopez é um rapaz de San Sebastián - Espanha - que trabalha muito para manter a si mesmo e a mãe. Yvone Deveux é uma nobre de Bordeaux - França - que deseja ter um bom casamento por amor. Quando o suspeito e sedutor Léon Chevalier surge com p...