10. Excesso de informação - Lado B

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Sinto um toque leve no meu ombro. Abro os olhos lentamente e vejo uma mulher de cabelos castanhos e usando um uniforme privativo azul claro. Ela me encara, sem piscar, como se tivesse algo importante para dizer. Olho em volta e percebo que estou sozinho. O casal de idosos sentados algumas cadeiras à frente sumiu, assim como Alicia e Isadora.

Eu deixei as meninas sozinhas? Para onde elas foram? Tateio os bolsos, mas não acho o meu telefone. Matheus passou para pegá-las?

— Ela pediu para te chamar — diz a mulher. Pisco sem entender e tento ler o crachá preso no ombro. Está gasto e apagado exatamente onde deveria estar o nome dela. — Ela acabou de acordar.

Amanda acordou?

— Ela acordou? — Pisco, sem acreditar. Não sei o que pensar sobre a primeira parte, mas ela acordou. Porra! — Como está a...

— Me acompanhe, por favor — A técnica de enfermagem arrasta os sapatos devagar, esperando que eu a acompanhe — Ela perguntou por você.

Perguntou? Amanda costumava ter apagões depois de beber muito.

— Tinha duas meninas aqui comigo, sabe se elas foram embora? Se alguém passou para pegá-las?

E se elas saíram sozinhas, quando cochilei? Elas estavam sob minha responsabilidade. Eu devia ligar para Elisa.

— Não se preocupe, as meninas estão bem.

— Como...

— Achei que ia querer vê-la primeiro — Ela me interrompe com um sorriso gentil.

Ela não é a diarista, não me lembro de tê-la visto mais cedo, enquanto estava com Alicia e Isadora.

— Eu quero — Me apresso. — Na verdade, eu só preciso saber se ela está bem.

Quanto ao resto, não sei.

O posto de enfermagem também parece completamente vazio quando passamos.

Atravessamos as portas da unidade de internação percebo que alguma coisa parece errada. Sigo a enfermeira que agora anda rápido demais. Esse não é o Hospital Escola. As paredes são brancas e há quadros com paisagens naturais e uma única porta sem identificação à esquerda. Os boxes da neuro UTI deveriam estar aqui, mas tudo está diferente. A sala no final do corredor é uma enfermaria, com apenas um leito ocupado. A sala é enorme e no leito de número dois Amanda está mesmo acordada, em posição de noventa graus, com os lençóis azuis cobrindo até a barriga.

Meu pulso vacila e estou ritmo taquicárdico de novo, mas dessa vez é por uma causa muito específica. O sorriso dela é tão grande que alcança e aperta os olhos. Um daqueles sorrisos que me desarmavam no passado. Eu faria qualquer coisa que ela quisesse.

Isso é um sonho.

Só pode ser.

Provavelmente cochilei junto com as meninas. Talvez eu devesse voltar para casa e descansar de verdade.

— Oi.

É a única coisa que consigo dizer.

— Você está liberado para brigar comigo, se me levar para casa.

O som da risada dela soa como música e me atinge com um arrepio. O reflexo pilomotor é a prova de que isso pode ser um sonho lúcido. Confusão, taquicardia. Além da cefaleia e da confusão mental. E midríase, segundo Mel. Talvez eu realmente precise repetir a TC.

— Eu tenho certeza de que a queda não foi tão feia assim.

Olho em volta e tudo o que vejo são as paredes brancas do quarto enorme. No meio da parede uma imagem de uma montanha-russa que parece tirada de um daqueles sites de imagens livre de direitos autorais. Parece completamente fora do lugar, como eu. Assim como nós. A enfermeira sem nome sumiu e tudo o que tenho aqui é ela.

Com tequila e com amor [Concluído] [VENCEDOR DO WATTYS 2017]Onde histórias criam vida. Descubra agora