12. Aflição - Lado B

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Eu decidi ficar.

Não foi tão fácil tomar essa decisão quanto pareceu à princípio. Espasmos musculares nunca me deixaram confuso desse jeito. Eu estava pronto para ir, finalmente deixar toda essa confusão para trás, até vê-la mexer os dedos. Então, não tive escolha a não ser tocar a campainha da enfermagem. Não, eu tive escolha sim e quis ficar.

O simples mover de dedos poderia significar uma melhora no nível de consciência ou indicar convulsões, o que seria um indicativo muito ruim considerando a atual situação de Amanda, mas existia a possibilidade de o meu nível de consciência estar alterado e eu ter simplesmente imaginado ela se mexendo.

Por isso, ficar foi a atitude mais prudente que eu poderia tomar. Mais do que nunca, eu precisava ter certeza de que Amanda ia ficar bem. Como médico e como alguém que sempre se preocupou com ela. Além disso, alguém precisava explicar a Elisa que poderíamos ficar esperançosos se os resultados dos exames fossem bons.

Aqueles espasmos musculares foram mais convincentes do que as dez ligações perdidas no meu celular. Foi a última coisa que vi antes de decidir desligá-lo. Percebi que queria ir embora na mesma medida em que ficar era a melhor decisão que eu poderia tomar naqueles poucos segundos depois de tocar a campainha da enfermagem. Cada segundo é importante quando se trata de um paciente com um quadro como o de Amanda e todos os segundos são importantes para tomar uma decisão que eu provavelmente me arrependeria. A questão é que, naquele breve momento em que a mão dela se moveu, os mesmos dedos que eu estava segurando, enquanto implorava para que ela acordasse, tudo mudou.

Elisa estava do outro lado e quando ela levantou os olhos do celular viu a luz piscando no alto da porta. Ela viu a luz piscando às minhas costas e me encarou com os olhos arregalados.

Fiquei com ela até o médico aparecer. Ela me agradeceu por ter ficado e pelo tempo que a conheço, ou melhor, a conhecia, sei o quanto foi importante estar lá para dar esse suporte para ela. Nelson também está grato por isso, onde quer que ele esteja agora. Continuei por lá até Amanda ser levada para a ressonância e aguardei o laudo do radiologista de plantão, que era um velho conhecido do meu avô e me reconheceu antes mesmo que eu fizesse qualquer pedido.

Conversamos sobre novas abordagens, com o resultado do ECG e avaliação do estresse cardíaco e a estabilidade hemodinâmica.

Eu não me lembrei de ver o celular, até a culpa me atingir, com ajuda do relógio no alto da parede.

Acho que você está muito ocupado. Estou indo para casa.

Ligue para Cora, ela está preocupada com você

Primeira mensagem. Carol.

Quatro ligações perdidas de Cora.

Não, não, não. Carol ficou me esperando para conversar e eu não fui. Estou fazendo tudo errado de novo.

Certo, uma coisa de cada vez. Primeiro, meus avós.

Desbloqueei o telefone, mas Elisa estava diante de mim antes mesmo que eu conseguisse levar o celular ao ouvido.

— Cora acabou de me ligar — Elisa arqueou as sobrancelhas — Preciso me preocupar?

Eu é que deveria me preocupar com o que vai acontecer quando eu voltar para casa. Porra. Não era para isso estar acontecendo agora. Não agora...

— Desculpa, eu me esqueci do celular — respondi sem jeito. — Eu vou ligar para ela.

Elisa me encara e confirma com um movimento de cabeça. Ela pisca e balança a cabeça como se tivesse desistido do que ia dizer.

Ter entrado naquele quarto e dito todas aquelas coisas para Amanda, talvez tenha me colocado nessa posição em que eu não tenho certeza de que consigo voltar. Pelo menos, não sou mais aquele Henrique que bateu o carro no poste. Mais uma coisa na minha longa lista de pendências das quais preciso resolver: o carro, o ventilador de teto do meu quarto, a minha quase improvável mudança para a casa de Carolina, meu relacionamento com ela...

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⏰ Última atualização: Nov 19 ⏰

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Com tequila e com amor [Concluído] [VENCEDOR DO WATTYS 2017]Onde histórias criam vida. Descubra agora