Sempre escutei em funerais que os mortos vão para lugares melhores, ou que vão voltar em outra vida, mas eu não acredito nisso. Acho que é apenas uma história contada para os familiares para eles não terem que aceitar o fato de que aquela pessoa se foi, que não existe mais, que virou um cádaver sem alma, sem sentimentos ou emoções, um pedaço de carne inútil. Que quando você acordar no dia seguite vai se sentir sozinho, vai sentir falta de ter dito o tão esperado "eu te amo" ou de ter pedido a tão famosa "desculpa".
E foi assim que eu me senti quando eu atendi aquele telefone e escutei apenas os choros e soluços de Amy.
Me senti como se ouvesse perdido algo, como se estivesse...Sozinha.
— Amy... — foi a primeira coisa que eu disse ao chegar no hospital antes de desabar em lágrimas pela segunda vez. Amy me abraçou e chorou baixinho comigo.
— Eu não sei de muita coisa ainda — Amy se recompôs — nos pediram para aguardar. — assenti e nós duas nos sentamos naquelas caideiras desconfortáveis.
Sabe aquele silêncio que diz tudo? Que já diz como você se sente e não é constrangedor? Era aquele silêncio que se instalou ali. Cada vez que uma lágrima rolava através da minha pele gélida ela sabia que eu estava sofrendo. Cada vez que ela fungava eu sabia que ela tentava ser forte, mostrar para mim que tudo ficaria bem.
Amy e Hilary eram muito parecidas naquele quesito. Ambas queriam mostrar que eram fortes, que conseguiriam seguir em frente mesmo tento dúvidas disso.
— Ela iria te pedir em casamento. — resolvi dizer.
— Eu sei... — respondeu e eu a encarei surpresa.
— Como? — perguntei.
— Quando eu fui comprar as alianças, a vi saindo da loja e apenas liguei os fatos. Nós iriamos ser uma família.
Era isso que eu tinha perdido... A minha família. Hilary era a minha família, tudo o que eu tinha e eu a havia perdido.
— São da família da Hilary Arden Martin? — uma médica pergunto.
— Sim... — respondemos nos levantando.
— Alguma notícia? — Amy perguntou.
— Na verdade eu só queria que a família autorisasse a doação de órgãos após a morte encefálica.
— Morte encefálica? — perguntei, mas outro médico chegou.
— Já autorizaram a doação, Dra. Clarke. — ele disse.
— Obrigada por me informar, Dr. Harris. — eles se despediram com um sorriso — Bem, tenho que transplantar alguns órgãos. Com licença.
— Quem autorizou? — perguntei.
— Eu realmente tenho que ir, eles têm que serem removidos enquando o coração ainda está batendo.
— Ela ainda está viva? — perguntei, mas a Dra. Clarke já havia sumido entre outros médicos e pacientes. — Você escutou, Amy? — perguntei. — Ela pode viver.
— Carter...
— Vamos, Amy, temos que impedir. — a puxei pelo braço, mas ela não veio. — Amy... É a Hilary.
— Acho que você não sabe o que é morte encefálica, não é mesmo? — e então ela me explicou. Não havia jeito de salvar Hilary.
Mas eu me recusava a acreditar, ela ainda estaria aqui, ela ainda voltaria para casa sorridente por Amy ter dito sim. Ela voltaria.
Ela precisava voltar.
[NOTA]
A Morte encefálica, comumente conhecida como morte cerebral, representa a perda irreversível das funções vitais que mantêm a vida, como perda da consciência e da capacidade de respirar, o que significa que o individuo está morto. O coração permanece batendo por pouco tempo e é neste período que os
órgãos podem ser utilizados para transplante.
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Querida Hilary...
RomanceCom uma mãe alcoólatra, um pai que não aparece em casa a dias, e um irmão viciado, a justiça encaminha Carter para o seu parente mais próximo, sua prima, Hilary. A vida com Hilary era perfeita, na opinião de Carter, mas tudo que é bom dura pouco, nã...