Capítulo 4

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Capítulo 04

Lydia suspirou, percebendo que mais uma música chegava ao fim. Apoiou os cotovelos sobre a mesa e ficou vendo os casais deslizarem na pista de dança, não conseguindo, assim, reprimir um leve sorriso. Lembrava-se de maneira saudosa do quanto costumava gostar de dançar. Mas já era a segunda música e ainda não recebera um convite sequer. Nem o do conde, nem o de nenhum outro. Um novo suspiro para ganhar fôlego. O corpete lhe apertava tanto, que estava difícil de respirar.

Balançou os pés inquietos no sapatinho azul ocultos sob a mesa. O vestido era no mesmo tom: azul celeste. Seu cabelo castanho estava preso num penteado elegante, ornado com diminutas flores brancas. Por cima, um xale ainda cobria o decote indiscreto. Mediante a alegria de Lizzy, Lydia não pode se negar a usar o traje. Mas ao se olhar no espelho, ela se considerou indecente: o vestido mostrava uma imagem que não mais condizia com ela. O corpete comprimia seus peitos, que se insinuavam, mais fartos pelo aperto, e que subiam (brancos, arredondados e provocantemente sedutores) pelo decote. Inquieta, ela se mexeu ao perceber que alguém a chamava pelas costas.

Podia ser o conde, que afinal a tiraria para dançar! Esperançosa, ela se virou bruscamente para trás. Mas sua ilusão era doce... e ela bem sabia que era inútil.

O jeito que ele a fitara ao se apresentaram... Um rosto duro e inexpressível. Nenhum sorriso fora dirigido a ela. Nenhum olhar de reconhecimento. Nada. Era como se ela não fosse nada. Como se fosse uma desconhecida. E ela agora se perguntava se não preferia ter recebido um olhar de desprezo, ao invés dessa fria indiferença. Era como se ele não se lembrasse. Como se ela não tivesse significado nada para ele. E isso doía. E ela agora estava consciente: a indiferença doía mais do que o desprezo.

Afinal, Lydia aceitou o convite para dançar de Mr. Leopold Langbert. Embora ele já tivesse seus 21 anos, parecia recém saído da adolescência. Era tímido, sem nenhum atrativo: magro com uma vara de trigo, com as pernas finas que mal conseguiam sustentar o próprio peso do corpo. Provavelmente ele não saberia dirigir uma conversa, provavelmente erraria quase todos os passos de dança e certamente pisaria nos sapatinhos azuis que ela usava, mas Lydia não se importou.

Dançar seria um alento. Seria uma distração para não pensar na indiferença do conde. Aquele que um dia fora o seu James. Aquele com quem fora imprudente, ao esquecer de todas as normas e regras de conduta. Mas com quem fora extremamente feliz por quase uma hora.

Ela tirou o xale nos ombros e, de costas, tentou puxar o corpete para cima para cobrir o decote. Quando a música começou, ela se concentrou nos passos. Deixou-se levar totalmente pela música. E Lydia bailou com leveza, com passos graciosos, com uma elegância que ela mesma desconhecia que possuía. E quando dirigia um sorriso contido para o seu par, expressando todo o seu contentamento, ela reparou que uma pessoa estava parada, de braços cruzados, e com a sua atenção rígida fixa nela. Lydia gelou e se desconcentrou ao ver o conde olhando-a daquela maneira. Teve que baixar o rosto, e esqueceu de cuidar do seu corpete, que livre, deslizou para baixo, expondo seu colo e a parte superior de seus seios.

O conde de Randoff, vendo o decote ousado de Lydia Wickham, vendo o seu par de dança percebendo aquele belos seios quase a mostra no mesmo instante em que ele, não pode reprimir a raiva, que ficou estampada em seus traços. E ele saiu do salão, com passos largos e pesados, dando as costas para uma Lydia que o observava completamente estupefata.

Então ele, afinal de contas, a reconhecera! Não havia mais dúvidas. E ela não pôde concluir se achava isso bom ou ruim. Só o que sabia era que precisava esclarecer as coisas. Por que ele a desprezava antes e agora a encarava com essa fúria? Por que ele parecia ter demonstrado um sentimento de posse, como se ela pertencesse a ele?

A volta de Lydia (completa)Onde histórias criam vida. Descubra agora