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Acho que o pior não foi de ter perdido o emprego.
O pior foi de eu ter perdido a Sally.
Mas não chegamos lá ainda, vamos prosseguir.

Depois que eu saí do restaurante, meia hora depois começou a chover. Eu ainda estava no ponto de ônibus, então tive que sentar na calçada e tentei me concentrar na chuva.
Ela caía serenamente, gota por gota. Eu sabia que tinha gente que a odiava, que preferia o sol e a brisa morna do verão, mas eu ficava com os 2% que preferiam a chuva e a brisa fria do inverno. Ainda tinha neve derretendo, transformando-se em lama, saíndo de sua coloração tão branca e pura para uma coloração amarga e fria.

Fiquei sentado por mais dez minutos encarando a lama que um dia já fora neve, até o ônibus chegar.
Eu entrei e paguei o ônibus, com o meu salário do mês passado.
"E daí?" - Eu pensava - "Já vou embora daqui mesmo, esse emprego estava era me atrasando..."
Pensei em ligar para Sally, só para dizer o quanto ela significava para mim, pois tirando meus pais, ela era tudo o que eu tinha.
Fiquei encarando o banco, me perguntando a mesma coisa há cada dez minutos:
E agora?

Decidi que ligaria para Sally quando chegasse em casa, então apenas encostei a cabeça no ônibus e fechei os olhos, na esperança de dormir.
Se eu dormi? É óbvio que não.
Cara, eu fui demitido. Estava prestes a contar sobre a decisão de largar tudo para que eu pudesse me mudar com Sally...
Quem dormiria nessas circunstâncias?
Tudo bem, eu é quem havia sido demitido, mas de uma forma ou de outra eu também tinha sido demitido. Acho que o Sr. Burns não tinha falado para que eu fosse para a sala dele para comer biscoitos e beber champanhe.

Quando desci do ônibus, fui encarando o chão, ainda tentando me concentrar nas gotas de chuva.
Me surpreendi quando vi Sally na porta da minha casa, no único banco do meu jardim que não estava encharcado.
"Enfim algo bom nesse dia" - Pensei dando meu melhor sorriso (Um sorriso grande e estranho, dando a impressão de ser o palhaço de algum circo)
Mas ela não sorriu de volta.
Ela apenas fez um sinal para que eu me aproximasse.
Ela usava um vestido branco e macio, sem mangas. Seu cabelo estava solto, caíndo sobre os ombros. Ela usava lente de contatos agora, então não usava os óculos na maioria das situações.
Ela tinha uma cara meio estranha, tipo uma mistura de raiva, mas também de nojo.
Eu reconheci: Essa era sua expressão de culpa.

Quando fui abraçá-la, ela me afastou com uma de suas mãos.
- Precisamos conversar - Ela disse. Engoli em seco.
- Eu fiz algo errado?
- Não Jenny - Ela disse suspirando com os olhos fechados - Eu fiz. Olhe... durante um bom tempo, sim, eu te amei, mas durante esses últimos anos, eu... não senti mais nada.
Encarei meus pés, mordendo o lábio inferior para não chorar. Tanta coisa aconteceu comigo e eu só tinha ela para abraçar nos meus piores momentos. Então ela simplesmente diz que não me ama mais?
Não - Eu pensei - Eu não acredito.
- Não acredito em você. - Ela riu.
- O que eu posso fazer? Achou que isso ia durar para sempre?
- Mas que droga, Sally, você tem noção do que eu passei hoje? Tem noção de todas as vezes em que eu me sacrifiquei por você?! Sally, você...
- Jenny, já era! Eu não sinto mais nada por você, amo outra pessoa.
- Eu... o que?
- Nesses últimos dias eu conheci alguém... e eu o amo.
- Então deixa eu ver se eu entendi direito - Eu disse enxugando as lágrimas do meu rosto - Você me traiu?
- Jenny, eu sinto muito... Na verdade não sinto. Nós já não tínhamos nada. - Arregalei os olhos. Chutei um vaso de flores do jardim da minha mãe.
- JÁ NÃO TÍNHAMOS NADA? E QUANTO AS COISAS QUE EU SINTO E FIZ POR VOCÊ?
- Não fez nem faz diferença pra mim. - Ela deu de ombros e depois respirou fundo.
- Adeus, Jenny. - Ela saiu da minha frente, saíndo do meu quintal e do meu destino.
Ainda chovia.
Sentei em um dos bancos do jardim, não me importando se chovia ou não.
Uns poderiam dizer que eu era um maluco aproveitando a chuva, querendo pegar um resfriado.
Mas outros sabiam que eu sentei ali pra esquecer e me livrar das minhas lembranças, usando a chuva para esconder e afastar minhas lágrimas.

Small - Uma história de melhores amigosOnde histórias criam vida. Descubra agora