Segundo Primeiro Dia

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O café ficou esfriando na mesa, me lembro bem, estava em uma mesa redonda que pendia para a minha esquerda, esfriou e eu tomei mesmo assim. Senti o amargo de uma forma tão profunda, acho que havia esquecido de colocar açúcar, porém não havia acontecido o mesmo com o leite.
Estava sozinha, e observava a neblina ao longe, escolherá essa padaria por conta da vista, porque o atendimento em sí era precário, não precário, era ruim mesmo, mas também, quem consegue ser gentil as cinco da manhã?

Passavam naquele momento em minha mente as lembranças de quantas vezes eu senti saudades suas, saudades dos nossos momentos, em que eu pensei em te ligar, mas acabei te achando em outros corpos.
E sabe, devo admitir naquele momento, quanto tantos outros, sem você, eu me perdi. Pois lembrava: tá tão longe de mim. E meu coração gritava: mas ta aqui dentro.
Ta aqui desde daquele dia em que eu gritei que você era um inútil e que eu iria acabar com a suas bolas, da mesma forma que você havia quebrado o coração da minha amiga da época...

Lembro que fechei os olhos para não chorar, lembranças aquela hora do dia me causariam uma ressaca enorme se alguma lágrima escorresse. Enquanto tentava acabar com o amargo da minha boca com meu próprio cuspe, cheguei a uma conclusão que, querendo ou não, é de seu interesse...

Ao decorrer dos meses e erros, das felicidades e dos machucados dessa caminhada (muitas vezes sem rumo), nos perdemos. Mas, talvez, seja muito adequado dizer que você se perdeu de mim por escolha própria. No fim de tudo você me mostrou que foi difícil escolher, não espero que você entenda, mas o mais difícil é você ficar contemplando as escolhas da pessoa que você ama, te afastando.
Quando me dei conta do estrago entre nós, do assunto mal resolvido, sem data pra terminar, eu já estava sozinha naquela mesa com um café amargo, pensando que existe distanciar pior do que a geográfica. E ainda não me conformo que de várias escolhas, você tenha escolhido não ficar.

Eu tinha a consciência de que sua falta sempre me causou dor. No momento em que eu descobri tudo, no momento em que tudo dentro de mim eram meros cacos, tomei uma decisão, deixaria doer, deixaria sangrar. Te conto isso, e te peço que por favor, não foi um ato de desistência da minha parte, eu só me conformei.
E naquele dia quando abri os olhos novamente, percebi que, eventualmente de tanto sangrar uma hora estanca.

Paguei a conta, e dei meu sorriso quase perfeito, para todos que tive contato na rua. Afinal, depois te tempos, estava realmente bem.

E como era de rotina, encontrei com você. E foi bom te ver, te abraçar, conseguir olhar nos seus olhos e não ter vontade de vomitar todos os meus órgãos. Eu não chorei, eu não desviei o olhar, eu não me forcei para parecer feliz. O vazio que você sempre deixou, estava ali comigo, e era tão infinito quanto o universo, mas tão belo quanto.

Os papeis estavam trocado, quando ficamos sozinhos na saída da escola, naquele jardim descuidado que acabavam tomando o espaço destinado à humanos, você mostrou todo aquele seu estado lastimável. O céu sem lua, sem estrelas, sem aviões, sem nada... Em um aparente vazio, me fez entender como seus sorrisos estavam.

Você me fez ir em sua casa. Eu fui, era sexta-feira mesmo, aparentemente faríamos um trabalho. Assim que entrei em sua residência fiquei corada, sempre fui extremamente tímida.
Em seu quarto, sentei em sua cama minuciosamente arrumada:
- Deita aqui, -e você deitou em meu colo- me deixe explicar algumas coisas... - expliquei enquanto você ficou aninhando meus cachos.
- Eu te amo, a ponto de não saber oque fazer. - você disse com um rosto todo avermelhado - Um dia vai me perdoar?
- Já perdoei...
O silêncio pairou, e as nossas lágrimas quebraram ele. Eu te ouvi como nunca tinha ouvido antes, e no fim disse que você havia feito o seu máximo em relação a situação, e que isso foi muito e foi tudo.

Como naquele dia, saiba que ainda estou aqui caso precise lavar a alma, meu eu estará pronto para enxugar cada uma dos seus efeitos colaterais.
E a minha promessa continuará: Ninguém saberá a cor da sua fragilidade.

Digo isso pois sei que seu momento não é o melhor, sempre tive meus contatos - contatos que você odiava, e sempre os tratava com uma falsidade digna de ir para a Rede Globo.

Você sabe onde me encontrar.
Deixa a tristeza sair, deixa tudo sair.
Eu divido minha felicidade em duas.
Leva.

mar para sí (RASCUNHO)Onde histórias criam vida. Descubra agora