◇ Capitulo 2 ◇

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Havia passado a noite no quarto de hóspedes, não queria ter uma discussão com N no nosso quarto. Levantei cedo para me arrumar e ir pro trabalho, queria ficar concentrado em alguma coisa e nada me distrairia mais que um dia cheio na empresa pra me desligar dos problemas pessoais.

Já estava saindo de casa quando N apareceu.

- Vai trabalhar?

- Uhum - respondi seco.

- Okay... - suspirou e foi para a cozinha me deixando para trás.

Estava triste mas precisava ser um pouco duro com ele. Saí de casa e fui até meu carro, liguei o motor e por um momemto lembrei de quando viajei com Hakyeon para o litoral. Havíamos ido naquele carro. Lembro da alegria dele, passou as oito horas de viagem ansioso, sorria abobado enquanto ouvia as músicas que tocava na rádio local, lembro de sorrir com ele e cantarolar algumas músicas. Passamos todas as tardes na praia, na chuva ou no sol, corriamos e nos jogavamos na areia, rimos muito e eu amava roubar beijos desprevenidos dele, foram bons tempos...

Saí da garagem com os olhos marejados por ter tido tais lembranças, passei o caminho inteiro até a empresa tentando me recompor. Estacionei numa das vagas e saí do carro, o trancando. Entrei na recepção e sorri fraco para a recepcionista, estava esperando o elevador quando Ravi parou ao meu lado.

- Bom dia. - ele me cumprimentou.

- Bom dia.

- Como foi com o N?

- Ah... bem - respondi um pouco cabisbaixo, N me afetava muito quando discutiamos e eu não trazia problemas de casa para a empresa então tentava me portar, mesmo isso sendo extremamente difícil algumas vezes.

- Vi ele aquele dia no restaurante, estava numa mesa sozinho em um canto perto da cozinha.

- Oi? - falei supreso - Por que não me falou antes?

- Não falei antes porque não queria te deixar mais triste - o elevador chegou e ambos entramos - Desculpa...

- Aish ele tá passando dos limites - fechei os olhos contendo as lágrimas para não chorar ali.

- Espero que melhorem essa fase - tocou meu ombro me fazendo abrir os olhos - Desculpa novamente por não ter te contado antes eu só... - o elevador deu un tranco e abriu a porta.

- Tudo bem Ravi, não é culpa sua.

- Eu desço aqui - sorriu fraco e saiu do pequeno compartimento metálico -, melhoras e se precisar sabe onde me encontrar.

- Obrigado - devolvi o sorriso antes das portas se fecharem novamente.

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O dia no escritório havia me distaído bastante, por algumas horas esqueci dos meus problemas com N e ocupei a mente com outras coisas.

Saí da empresa e fui para o centro, estava animado então comprei uma caixa de bombons e um buquê de rosas brancas. Passei numa padaria e comprei algumas besteiras para comer, queria um recomeço.

Cheguei em casa um pouco mais tarde que de costume, abri a porta e vi N sentado na escada com uma expressão fria.

- Cheguei... - fechei a porta.

- Atrasado.

- É que passei no centro para...

- Tava com ele né? - me interrompeu enquanto me fitava cheio de raiva.

- Não, eu só...

- E ainda teve a cara de pau de trazer os presentinhos que ele te deu?!

- Isso? - gesticulei para as sacolas que eu segurava - Não são pres...

- Pensei que me amasse, depois da nossa conversa de ontem sabe, mas pelo jeito não significou nada para você.

Ouvir aquilo foi como uma facada nas costas, um balde de água fria ou qualquer coisa que te pegasse realmente de surpresa. Deixei as sacolas no chão e, com raiva, tirei um cartão do buquê o jogando no chão em seguida.

- "Amor..." - comecei a ler com a voz trêmula de raiva - "...apesar da nossa situação complicada vou continuar te amando, quero que de hoje em diante confiemos mais um no outro para podermos ter um futuro melhor e promissor..." - o olhei com lágrimas nos olhos e joguei o cartão na direção dele - termine!

Ele pegou o cartão e então leu:

- "... te amo..." - e sem terminar me olhou arrependido.

O fitei por mais um segundo e então me virei voltando a sair de casa. Corri pela rua com a visão embaçada e totalmente sem destino. Ouvi os gritos de N atrás de mim mas não dei atenção, corri o mais rápido que eu pude sem olhar para onde eu estava indo. Quando percebi que já não tinha ninguém atrás de mim parei para tomar folêgo. Conforme o tempo passava pude sentir algumas gotas tocarem minha pele que aos poucos se tornou uma chuva pesada e grossa. Andei sem me preocupar com a dor do impacto das gotas, que mais pareciam pedras, em minha pele branca. Provavelmente teria marcas vermelhas depois.

Achei uma árvore na frente de uma casa abandonada, sentei embaixo dela e me abracei numa tentativa inútil de diminuir o frio. Acho que aquela dor não poderia ser comparada com uma facada, um tiro no peito ou algo parecido. Aquela dor era a pior que alguém poderia sentir, era uma dor invísivel que não poderia ser curada com remédios e repouso. Senti minhas lágrimas se misturarem com as gotas de chuvas e já não conseguia controlar os soluços que o choro causava, me apoiei pelos joelhos e fechei os olhos com força, instantaneamente levei minhas mãos ao peito numa tentativa fútil de fazer aquela dor parar. Gritei o mais alto que pude. Gritei de raiva, de tristeza... gritei por amor.

Flashs do sorriso de N vieram e se foram repetidas vezes em minha mente. Eu realmente merecia aquele sofrimento? Eu havia errado em algum lugar? Eu havia o amado demais? Essas perguntas me torturavam a cada minuto que se passava. Minhas roupas encharcadas grudavam no meu corpo e fui conseguindo parar os soluços aos poucos. Olhei ao redor e a rua deserta não me motivava à voltar para casa, eu não queria voltar para casa.

Com muito esforço me levantei e me apoiei na árvore, meus sapatos ensopados me incomodavam então os retirei e os deixei ali mesmo. Descalço, caminhei me apoiando nos postes e árvores que via pela frente para não tropeçar. Estava fraco demais para simplesmente caminhar.

Minha visão embaçada me permitiu ver uma luz no fim da rua. Faróis.

O carro parou do meu lado e fez sinal para eu entrar, reconheci Ravi com seu olhar preocupado. O mesmo olhar de quando ele me pegava encima das macieiras quando tinhámos cerca de 12 anos e me mandava descer cautelosamente. Um olhar que não me lembro ter recebido muitas vezes de N.

- Vem logo! - senti alguém puxar meu braço e abrir a porta do carro me fazendo entrar. - Cadê seus sapatos? - olhei para Ravi e dei de ombros encostando a cabeça na janela do carro - Tanto faz, vamos para casa.

O carro disparou e então a chuva do lado de fora me fez lembrar a discussão de poucas horas atrás. Eu acabara de decidir o que faria, aquilo com certeza foi a gota d'água.

Dois [Hiatus]Onde histórias criam vida. Descubra agora