Caça as corujas*

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Pela primeira vez tinha recebido um soco de uma mulher. E teria sido engraçado se não tivesse doído tanto. Mas logo a dor passou e ele seguiu seu caminho indo para sua própria casa. A garota fugira dele, e ele a deixara ir

− Dessa vez. Ele prometeu para si mesmo.

Ele a deixaria fugir apenas essa vez. Finalmente uma mulher não o tentara seduzir, e talvez por isso tenha se sentido impelido a beija−la. E o fizera, e não se arrependera, pelo contrário, fora divertido e excitante. Ele parou de pensar nela, não era um adolescente apaixonado. Nem sequer estava apaixonado.

Seguiu para sua casa sem pressa, recolhendo algumas ervas aromáticas no caminho para temperar sua sopa de legumes. Ele sorriu lentamente recordando porque comeria uma maldita sopa de legumes naquela noite em vez de carne assada, e pela primeira vez estava disposto a ter sopa no jantar.

Chegou a casa meia hora depois que começara a andar, e encontrou na sua porta uma carta com um selo em formato de rosa, sabia que só podia ser uma coisa: a Rainha queria vê−lo. Sabia disso porque seu pai tinha recebido inúmeras cartas idênticas a essa. Todos na aldeia sabiam que ao receber uma carta dessa era obrigatória a presença diante da Rainha, e também sabiam que a morte era a punição para quem desobedecesse.

Abriu a carta e comprovou sua suposição, em letras floreadas estava escrito a seguinte mensagem:

Sua presença está sendo requisitada no Castelo das Rosas amanhã à hora nona.

Essa mensagem lhe dará acesso para além dos portões do castelo.

Rainha Morgana, a dama das Rosas.

Ele deixou a carta em cima da mesa e foi fazer sua sopa, depois de ter adicionado todos os ingredientes deixou apurar no fogo e foi amolar sua já muito amolada, faca de caça, era um hábito que adquirira desde que ganhou sua primeira faca de caça e sempre o fazia enquanto esperava algo.

Duas longas horas depois ele já estava alimentado, e como não tinha mais nada para fazer decidiu dar uma volta, a floresta à noite era sempre uma aventura. Assim ele pegou uma capa para se aquecer e se esconder e entrou floresta à dentro.

A lua estava cheia no céu, mas ainda não estava na sua plenitude, ela iluminava toda a floresta o que tornava desnecessário para ele o uso de tochas, primeiro por que ele conhecia muito bem a floresta e segundo porque não queria chamar a atenção de nenhum animal.

Assim ao ver uma luz ao longe na floresta ele se aproximou devagar e silencioso para ver o que acontecia. Ouviu alguns gritos, mas a distância em que estava não permitiu entender o que eles diziam. Ele se aproximou o suficiente para não ser visto e poder escutar o que diziam.

− morte às corujas - uma mulher havia gritado e ele entendeu tudo.
Aquele era o primeiro mês do ano maldito. E aquelas pessoas caçavam corujas.

− Façam silêncio seus idiotas, assim vocês vão assustar as aves. - falou um homem para quem gritava. Pelo visto o único que parecia entender um pouco de caça.

− Vejam, ali no céu! É uma coruja, matem−na. Peguem ela. − disse um jovem que estava no grupo.

E rapidamente os homens colocaram seus arcos na mão e começaram a atirar. Ele já tinha percebido que ali só tinha amadores, caçadores não andavam e grupo, com tochas ou saiam gritando floresta a dentro.

Ele olhou para onde os homens apontavam seus arcos e ficou pensando se ia caçar ou não. Ele não sentia sono e uma caçada a noite não ia fazer mal. Então ele decidiu seguir a coruja que estava quase sumindo na noite.

Os aldeões também o fizeram, porém de forma tão desordenada e barulhenta que ele não se assustaria caso toda a floresta acordasse.

Ele seguiu seu curso tentando se manter afastado do barulho das pessoas e da claridade concedida pelas tochas. Aquilo só atrapalhava a caçada, e ainda chamava a atenção de outros animais da floresta, além de afastar a presa pra longe. Seguiu seu caminho silenciosamente.

Depois de um tempo perdeu a coruja de vista e decidiu continuar seguindo para onde a tinha visto por último. Mais um pouco de tempo e ele desistiu. Não a encontrava em lugar nenhum.

Observando a sua volta reconheceu que devia estar no lado norte da floresta. Lembrou que por aquelas bandas havia uma cabana abandonada, seria o local perfeito para passar a noite. O bom de ser caçador era isso a floresta era sua casa e qualquer lugar servia de lar. Ele então seguiu naquela direção.

A casa estava onde lembrava. Ela não iria criar pernas e sair dali, obvio - ele se repreendeu em pensamento. A cabana estava da mesma forma como ele havia visto anos atrás. Ele se aproximou da porta, não sabia o que podia encontrar lá dentro, pois já fazia dez anos que tinha ido ali, ele empurrou a porta e ela cedeu, e qual sua surpresa ao encontrar dentro da casa sinais de que ela era habitada.

Ele continuou a explorar a casa, o chão estava limpo, tinha comida armazenada na cozinha e a lareira ainda estava acesa. Ele foi pra sala onde encontrou algumas roupas jogadas no chão, e ao pegá−las reconheceu como as roupas da mulher que encontrará essa tarde.

−Então é aqui que ela mora? − ele perguntou pra si mesmo.

Ela não estava na casa, isso ele já tinha notado. Onde ela estaria? - ele pensava consigo. - Ela teria que voltar em algum momento.
Ele então decidiu esperar pela garota.

As horas passaram e nada da jovem voltar para casa. Ele decidiu dar mais uma volta e ver se a encontrava, já se afastava da casa quando viu um ponto branco no céu vindo em sua direção, era a coruja.

Com habilidade tirou seu arco das costas e mirou na coruja. Puxou a corda com a flecha, mirando e esperando ela se aproximar um pouco mais. E assim que ela chegou onde ele queria soltou a flecha que cortou o ar rapidamente e acertou em cheio a Coruja.

Ela caiu rodopiando a uns vinte metros de onde ele se encontrava. Ele foi então buscar sua caça. Ele a viu caída em cima de uma rocha, era uma coruja branca, com manchas marrons nas extremidades das penas, era muito bonita, e grande também.

A flecha tinha acertado a asa da ave e a atravessado. Ela agonizava no chão.

Ele olhou nos olhos da coruja enquanto procurava sua faca, olhos azuis o fizeram paralisar em choque, ele já tinha visto aqueles olhos em algum lugar, e que tipo de coruja tem olhos tão expressivos? Nele ele viu a dor, o medo e... Raiva? Como poderia a coruja o estar encarando com raiva?

Procurou sua faca na bota, mas não a encontrou.

− Droga! Devo ter deixado na casa - ele disse pra si e olhou pra coruja - não posso levar você lá, se a dona voltar ela com certeza vai querer minha cabeça empalhada.

Ele então pegou um barbante fino de seu bolso, amarrou as pernas da coruja e a deixou amarrada em cima de um galho para que nenhum animal pudesse pegá-la. E saiu pra buscar sua faca.

Cinco minutos depois ele estava de volta, mas a coruja havia sumido.

***

OOOi. Obrigado por ler mais um capitulo do Canto da coruja, se gostou deixe um voto, pois isso nos incentiva a continuar escrevendo. Caso tenha duvidas, ideias, críticas ou queira apenas dizer o que esta achando do livro, deixe um comentário que eu ficarei feliz em responder.

O canto da Coruja  (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora