Passeio

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O carro andava enquanto a ansiedade e a agitação insistia em me atormentar.

Bernard não disse uma palavra até chegarmos onde ele queria me levar. E então finalmente paramos. Ele abriu a porta do carro, me ajudou a sair e tirou a venda de meus olhos para que eu pudesse ver onde trouxera-me.

A principio senti medo, esperando ver a mansão de seu pai, ou sei lá, um prostíbulo talvez? Mas após ver o lugar... Sinceramente, acho que eu julgava Bernard do jeito errado.

Era lindo. Havia um lago e nele encontrava-se muitas flores de lótus em tons brancos e violetas, além dele estendia-se campos verdes. Um quiosque branco de madeira estilo vitoriano, ficava no centro do lago. As colunas hexagonais espessas sustentavam a abóbada. As grades de proteção que circundavam o quiosque eram de ferro intrincado formando folhagens. No interior do quiosque havia um banco de dois lugares feito de ferro. Lâmpadas japonesas iluminavam o quiosque.

Era uma noite perfeita. As luzes das estrelas refletiam no lago como se houvesse mil luzes dentro da água.

- Ok, você conseguiu me surpreender. – Falei observando tudo fascinada, lembrava-me algum cenário saído das obras de Jane Austen.

- Viu? Posso ser cavalheiro quando quero. – Ele disse sorrindo de canto.

Eu não conseguia tirar os olhos do rosto dele. Até então o tambor voltar a retumbar nos meus ouvidos cada vez mais alto.

- Certo, e para que tudo isso? – Perguntei um pouco ríspida desviando o olhar de seu rosto, interrompendo o ritmo desenfreado que tamborilava em meus ouvidos.

- Venha. – Ele segurou minha mão e me puxou enquanto andava pela ponte que daria ao quiosque. A ponte era de madeira, mas seus corrimãos de ferro com o mesmo trabalho intrincado das grades do quiosque.

Ao chegar no quiosque não pude evitar, olhei para o alto da abóbada e surpreendi-me ao ver os detalhes que se assemelhava aos da art nouveau. Bernard continuou a me guiar até o banco onde nós nos sentamos. Eu continuava a deslumbrar a decoração ricamente detalhada, mas então percebi o silêncio vindo dele.

Bernard parecia estar desconfortável e eu não entendia o porque. Ele encarava as estrelas nesse momento.

- Eu... – Ele começou a dizer. – Te entendo. Agora posso entender sua dor.

Prendi minha respiração. Mas que conversa era aquela?

- Depois de te ver aquele dia... – Ele retomou. - As coisas que você falou, sabe, fazem sentido. – Era difícil para Bernard falar tudo aquilo. – Eu esqueci como era Elli, se importar com os outros, se importar com a família. Quando se é vampiro o instinto mais forte é viver o agora, sentir o agora, desligar a humanidade. Você passa tempos e tempos sem se preocupar com a própria sobrevivência. Mas então... Então você chegou. E pela primeira vez em minha vida, eu me importo. Você me mostrou que ainda há esperança. – Ele interrompeu-se por um instante. Eu via claramente um conflito interno se apossar das feições de Bernard. Ele decidia algo, então a determinação transparecia seu rosto. – Eu me importo com você. Eu realmente gosto de você e é por essa razão que vou te ajudar.

Quando ouvi suas palavras paralisei. Eu não podia acreditar que ele, um Lazarus, me ajudaria.

- Sério? Você está falando a verdade? – Eu estava espantada. – Nada de trapaças?

- Elli desse jeito você me ofende. – Ele respondeu fazendo-se de ofendido. Mas então relaxou suas expressões. – Claro que estou falando sério.

- Aquele dia, eu vi minha mãe na TV Bernard, ela estava desolada. Ela pensa que eu sumi, estou sendo procurada até pela policia. Quando realmente parei pra pensar nisso de verdade, cheguei a conclusão de que não posso voltar atrás e nem parar no tempo. Eles, minha mãe e meu irmão, são tudo o que tenho e não posso deixar que descubram meu destino. Do contrário, correrão perigo. E enquanto eu não terminar meu propósito, não poderei voltar para eles, isso se eu voltar algum dia. – Parei de falar. Eu nem percebera quando as lágrimas haviam chegado, mas estavam lá, molhando meu rosto. – São as pessoas que me amaram, que me apoiaram. Não posso deixá-los. Por isso tenho que concretizar a profecia.

O silêncio tomou conta de nós dois.

- Você não está fazendo isso por ele... Está fazendo pela sua família. – Bernard disse cortando o silêncio.

- Eu quero ajuda-lo. E quero ajudar você também. – Falei fitando seus olhos, sendo totalmente sincera.

- Eu não preciso de ajuda. – Bernard disse insondável. – Mas ele sempre quis isso – E eu pude ver seus olhos ficarem tristes por algum motivo desconhecido.

Fiquei o observando, será que Bernard ainda nutria algum afeto amistoso por Casper?

- Bernard você sente falta da amizade de Casper? – Perguntei cuidadosamente.

Ele olhava distante.

- Não. – Disse ríspido. – Mas isso não significa que ele tenha sido um péssimo amigo. – Sua voz suavizou um pouco ao falar aquelas palavras.

Sorri discretamente, ele nunca iria admitir.

- As estrelas são mesmo fascinantes, não é? – Ele disse a mim observando o céu. – Mesmo à uma distância significativa da Terra, ainda conseguem iluminar a noite e embelezar o céu.

Eu ainda o observava, e sentia paz ao tê-lo ao meu lado. Aquele ali era totalmente diferente do Bernard, o vampiro monstruosamente impiedoso.

Agora ele me vislumbrava. Sua testa formava um pequeno franzir.

- Está rindo porque?

Eu nem percebera que ainda sorria um sorriso tímido.

- Por nada. – Falei suavemente. Eu sentia a mudança. Ele estava diferente e isso fazia-me sorrir. Mas sua mudança ocorrera por vontade própria? Ou por minha causa? – Mas Bernard, diga-me, porque recusar minha ajuda?

Algo mudou em seus olhos com o que eu dissera.

- Porque eu gosto de ser como sou, irei te ajudar, mas farei isso por você e por mais ninguém, nem por mim.

- Mas... – Comecei a dizer.

- Sem mas Elli. Você não tem o poder de "salvar" a todos. – Ele disse tentando fazer piada. Mas eu podia ver a escuridão que se apossava de seu semblante.

- Tem algo de errado não é? Posso ver em seu rosto. – Falei preocupada.

Bernard me observou por mais alguns instantes. Por fim decidiu-se.

- O que eu vou fazer é sério Elli. Lhe trouxe até aqui para contar tudo isso, pois se eu contasse na mansão os outros poderiam ouvir, a noticia chegaria rapidamente ao meu pai revelando nossos planos. – Ele pausou. – No entanto, deveremos esperar um pouco mais, até o plano for posto em prática.

Bernard realmente me ajudaria. Isso com certeza seria o máximo que eu poderia receber dele.

Sem perceber o que eu fazia, em um ato automático, o abracei muito forte.

- Obrigada. – Falei apenas.

Senti seus músculos retesarem, eu o havia pego de surpresa.

- Você não deveria agradecer após eu ter feito o que fiz com você. – Ele me envolveu em seus braços enquanto sua voz saia séria, algo quase impossível vindo dele.

- Todos cometem erros. Isso já passou. – Falei sentindo algo em meu estômago revirar, era estranho, mas parecia certo eu estar nos braços de Bernard.

Não, certo não, mas era bom. Acho que já era hora de nos soltarmos. Me afastei dele vendo seu rosto sorridente.

Blood and Moon - A PredestinadaOnde histórias criam vida. Descubra agora