Um estranho no beco

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  O muro a segurava para não desabar no chão. Todo seu corpo tremia e as lágrimas brotavam, quentes e contrastantes com a noite fria.
  _ Por favor, leve tudo. Telefone, carteira... Só não...
  Ele parou a poucos passos. Era alto, esguio.
  Levantou o capuz. Era lindo.
  Olhos brilhantes e turbulentos, pele levemente bronzeada e cabelos pretos ondulados. Narciso, certamente, pararia para admirá-lo.
  _ Eu não quero dinheiro.
  Virou a cabeça, levemente para a esquerda, a fim de avaliar a entrada do beco. Sombras se moveram e passos soaram. O estranho a observava em quanto remexia o bolso interno da jaqueta.
  _ Você deixou isso cair. - Um punhado de chaves com seu pen-drive e um chaveiro de mini bailarina pendiam do dedo indicador do rapaz. - Dois moleques pegaram quando começou a correr e estavam indo atrás de você; uma brincadeira de mal gosto, julgo.
  A voz era densa e cortava sua pele como espinhos. Era deliciosa.
  Luxuriante.
  Ash sentiu o rubor no rosto e desviou o olhar, já o encarava a tempo mais que suficiente.
  O pensamento que algo ruim poderia ocorrer, ainda nublada sua visão. Ela se sentiu fraca e se apoiou ainda mais na parede. As pernas tremiam. 
  _ Desculpe-me, se o julguei mal. Achei que...
  _ Estava certa em correr. - Disse passando a mão pelos cabelos. - Vá para casa, a rua não é lugar para menininhas. Principalmente a essa hora.
  Ela tentou dar um passo e tropeçou. Caiu de bunda no chão e estranho a olhou com um olhar divertido. Sua fronte estava vermelha, sentia os vasos se dilatando.
  Vamos tentar de novo.
  Aysha balbuciou algo e, apoiando-se na grade lateral, se levantou e sacudiu - desajeitadamente - a poeira do vestido.
  _ Prazer. - Disse estendendo a mão depois de guardar suas chaves e conferir se nada mais faltava em sua bolsa. - Aysha.
  Ele deu um sorriso malandro como se soubesse seu efeito sobre as pessoas.
  Promiscuidade.
  Por que diabos essas coisas não saíam de sua mente. Provavelmente por coisa do susto, da bebida ou qualquer outro motivo não tão claro.
  _ Cain. O prazer é meu.
  Eles sorriam.
  _ Bom, Cain, acho melhor eu ir pra casa.
  _ São quase quatro da madrugada. Você não acha melhor...
   _ VÁ PARA CASA AYSHA! - Ele gritava em sua mente. As sombras ao redor dos dois estranhos do beco se tornaram mais densas e mais rápidas. O vento começou a assoviar e derrubou uma das lixeiras na entrada do beco enquanto formas e vultos se estendiam pelas paredes altas dos prédios.
  Aysha soltou um gritinho.
  O garoto a puxou, arrastando-a junto dele até o meio da rua onde se puseram a caminhar, descendo a rua. A temperatura não deveria estar mais que dez ou doze graus, a menina congelava sobre seus saltos.
  Cain tirou a pesada jaqueta e jogou pra ela, sem dizer uma palavra, sem parar de andar.
  Ela murmurou algum agradecimento e depois de algumas varias ruas, saltos nas mãos e meio maço de cigarros por parte dele, estavam parados na frente do ateliê que se encontrava no final de um bairro de classe média, bem arborizado.
  _ Pessoas felizes, em casas bonitas; até parece um comercial de margarina ou produto contra insetos não acha?
  _ Você é melancólica assim normalmente?
  Ela soltou um risinho enquanto abria a porta.
  _ Eu me esforço.
  Ela olhou para Cain mais uma vez e o vento soou mais forte. Seus olhos se desviaram para o início da rua, pelo caminho que percorreram.
  'Criança.'
  Era um aviso. Toda sua visão se tornou límpida. Ela retornou o olhar para o homem a sua frente, agradecendo timidamente a companhia.
  Ele lhe ofereceu um sorriso e ela sorriu de volta, entrando no ateliê olhando pelo vidro para ele que terminava de acender um cigarro e já estava a caminho seja lá para onde.
  Aysha subiu as escadas, correndo as mãos pelo corrimão e cantarolando uma música qualquer e somente quando chegou à sala espelhada para ir ao vestiário que percebeu que ficara com a jaqueta dele.
  Sorriu timidamente seguindo para o vestiário.

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⏰ Última atualização: Feb 11, 2017 ⏰

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