Capítulo 9 - Todo Sherlock precisa de seu Watson parte I

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- Não! Por favor, não a machuque! Ela precisa de mais tempo!
- Meu caro, se você não me disser por onde ela foi, quem vai se machucar será você.
- Ainda não sabemos se é seguro!
- Eu não me importo!
- Por favor... - a voz abafada começou a ficar fraca e, então, se silenciou. No momento seguinte, meus olhos se abriram em um movimento rápido e o tronco do meu corpo se levantou do solo de concreto em um pulo. Eram as mesmas duas pessoas que eu havia visto antes de desmaiar, mas quem eram aquelas pessoas? Sobre o que eles estavam falando? Mais mistérios e dúvidas rodeavam minha mente, para variar. Precisava sair de perto daquele muro antes que desmaiasse novamente, então peguei o papel com o endereço de Greg que estava no meu bolso e percebi algo que não havia me chamado atenção antes, o papel dizia que Greg morava em uma casa, mas ainda não havia visto nenhuma na cidade. Apenas ignorei a informação e me dirigi até o local, esperando esclarecer a confusão ao chegar em sua moradia. Não fazia a menor ideia de onde era aquela rua, então fui apenas seguindo as placas. Muitas pessoas me olhavam com espanto e curiosidade por eu provavelmente estar deixando um pouco óbvio o fato de que não fazia ideia de onde estava, mas eu simplesmente as ignorava. A verdade era, estava completamente perdida e não podia pedir ajuda de ninguém, pois então saberiam que eu não era dali. Me perguntava o que aconteceria se descobrissem que eu não pertencia àquele lugar, por mais que eu também não fosse do outro lado da cidade acho que ninguém acreditaria se eu dissesse "sou de outra dimensão", claramente todos pensariam que de alguma forma eu atravessei o muro e tinha medo do que fariam comigo caso soubessem que eu não era dessa cidade.
Perdida tanto em pensamentos quanto em minha localização, andando sem rumo e sem saber meu destino, acabei encontrando a Rua Govern. A rua era pequena, com apenas oito casas, ou seja, realmente haviam casas na cidade, mas as enumerações das casas não faziam o menor sentido, era algo meio que descuidado. Além disso, a rua era vazia e suja, o que era estranho já que toda a cidade era extremamente limpa, exceto as áreas próximas à barreira, o que não era o caso da rua Govern. Todas as casas da rua eram cinzas com detalhes brancos, então andei pela rua e avistei na quarta casa o número 17. "Bingo", pensei.
Não havia campainha na casa, como era de se esperar, e já estava imaginando que não haveria nenhuma tranca na porta, mas, para não ser intrometida, bati duas vezes na porta cinza de madeira com sua tinta saindo. Em seguida, uma senhora japonesa abriu a porta com um sorriso no rosto, a qual deduzi ser a mãe de Greg.
- Você deve ser amiga do Greg! Entre, entre! - ela disse enquanto se posicionava ao lado da porta para que eu entrasse. Ao entrar notei que a casa era menor por dentro do que aparentava ser por fora, o que era quase impossível já que sua aparência exterior não era lá muito grande. O lugar estava completamente empoeirado e já podia sentir o cheiro me causando uma forte dor de cabeça. Estávamos em uma pequena sala com um sofá e uma mesa de centro, podia-se notar que era uma moradia bem simples, diferente do luxo da área da cidade em que despertei do desejo de Sarah. - Ele não trás muitos amigos aqui. Qual o seu nome, querida? - ela parecia extremamente feliz pela minha presença.
- Mackenzie.
- Eu nunca a vi pela cidade...
- Eu não costumo sair muito... Hm, o Greg está? - falei tentando mudar de assunto o mais rápido possível.
- Sim, sim. GREG VOCÊ TEM VISITA! - ela gritou.
- Mãe, mas o que...? Ah, oi, Mackenzie. - Greg saiu do corredor e ficou surpreso ao me ver. - Mãe, será que você pode nos dar um pouco de espaço, por favor?
- Claro, querido. - a mãe de Greg disse e saiu pelo mesmo corredor o qual seu filho havia chegado alguns segundos antes, sem antes virar para trás e sorrir para nós dois.
- O que você está fazendo aqui? Está tudo bem?
- Você me deu seu endereço caso eu precisasse de algo. E, bom, eu preciso de ajuda, além de precisar me acalmar.
- Como assim?
- Algo muito estranho aconteceu comigo enquanto eu estava perto da barreira e eu sinto que eu preciso ir para o outro lado logo, senão algo vai acontecer. Algo ruim.
- Calma, o que aconteceu? Não estou entendendo nada.- me sentei no pequeno sofá empoeirado e Greg se sentou ao meu lado, fazendo uma pequena nuvem de poeira de formar no ar e, então, lhe contei o que havia acontecido, o que havia escutado, tudo, sem deixar escapar nenhum detalhe e, por fim, lhe contei como me senti, como senti a necessidade de chegar ao outro lado do muro, como senti que alguém estava correndo perigo por minha causa, como senti que algo estava prestes a acontecer. Enquanto lhe contava, ele me olhava com um olhar preocupado e prestava atenção em tudo que lhe dizia. Quando terminei, o jovem japonês ficou apenas me encarando e, após alguns minutos pensando no que dizer, Greg finalmente se pronunciou.
- Você tem alguma ideia de quem eram aquelas pessoas? Você não conseguiu vê-las ou escutá-las nitidamente nem por um breve momento?
- Não, tudo que eu vi e ouvi eu te disse, mas, mesmo não as reconhecendo, sinto que preciso encontrá-las.
- E por que você acha que precisa fazer isso? O que ir para o outro lado da barreira tem a ver com isso?
- Porque... eu tenho quase certeza que eu vi essas pessoas por algum motivo, por alguma razão que eu ainda vou descobrir a qual, mas eu sei que essas pessoas estão relacionadas a mim de alguma forma, porque, senão, qual seria o motivo de eu tê-las visto? E eu sinto que elas estão do outro lado da barreira, porque foi quando eu passei um tempo perto da divisão que eu as vi,então, por favor, me ajuda a ir atrás delas?
- Eu não sei... Tem algo que não está muito certo nisso tudo. Você não se lembra como atravessou a barreira e agora isso. - Certo, tinha esse detalhe não tão pequeno de que Greg e os outros que me acolheram achavam que eu tinha atravessado a barreira e que eu tinha perdido parte da minha memória. Bom, era melhor do que falar de onde eu tinha realmente vindo, então decidi continuar omitindo a verdade. Afinal, uma mentirinha não machuca ninguém...
- Olha, eu sei que isso não é muito normal, mas você tem que concordar que nada nessa cidade é muito normal!
- Como assim?
- Como assim!? Como. Assim!? Bom, deixe-me ver: todas as ruas são iguais, todas as moradias são do mesmo jeito, todos se vestem da mesma forma, todos os lugares dessa cidade são idênticos, todas as partes da cidade tem as mesmas cores, sem ignorar o fato de que TEM UM MURO DE METAL GIGANTE CERCANDO ESSA CIDADE! - eu disse já me estressando, então Greg colocou sua mão sobre meus lábios para que eu parasse de gritar, afinal, sua mãe ainda se encontrava naquele casebre. Tinha algo em toda aquela monotonia que acabava com a minha paciência e, por mais que meus mais novos amigos também não gostassem de viver em um lugar em que tudo fosse igual todos os dias, no momento, parecia que isso não incomodava a Greg. Parecia que isso apenas incomodava a mim.
- Calma, calma. Eu já entendi. Você está certa, isso não é nada normal e é bem irritante, mas você tem que relaxar. Se alguém souber que você não gosta do jeito que o sistema funciona, do jeito que as coisas são, haverá consequências e não só para você como para mim, para o Jack, para a Amber e para o Tony e, então, nós não conseguiremos fugir daqui. Por isso, você tem que ser cautelosa, ok? Eu sei que você deve estar com vontade de gritar com tudo e com todos, mas você deve manter a calma. - calmamente Greg foi tirando sua mão de meus lábios enquanto eu o encarava furiosa. Precisava sair logo dali, nem liberdade de expressão eu tinha.
- Já terminou com a lição de moral?
- Sim...
- Ótimo, porque, realmente, já estava quase dormindo em pé de tão entediante que foi. Você vai me ajudar ou não? - só após as palavras saírem da minha boca percebi o quão grossa havia sido. Essa cidade estava me mudando completamente, precisava sair logo dali e encontrar as pessoas que havia visto quando desmaiei, senão iria ficar como a Amber e essa ideia não me agradava nem um pouco.
- Tudo bem, nós já íamos tentar sair daqui mesmo, só vamos ter que começar desde já. Pode ser cansativo, já que nós teremos que pesquisar bastante e trabalhar duro para tentar atravessar e você deve ter cuidado para não ser pega enquanto tentamos descobrir como escapar daqui. Você está disposta a se arriscar?
- Claro! Eu preciso sair daqui!
- Ótimo! Então vou pegar meu casaco - ele disse e foi em direção ao corredor e logo em seguida voltou vestindo seu casaco cinza - Pronto.
- Aonde vamos?
- Á biblioteca.
- Lá não é um lugar comum demais para ter esse tipo de informação?
- Acredite, ninguém vai à biblioteca.
- Porque?
- Ninguém quer saber como sair daqui, já todos acham que, enquanto estivermos desse lado do muro, estamos seguros. Todos veem o outro lado como problemático, como uma aberração derivada de classes inferiores. Ninguém os vê como o que realmente são.
- E o que realmente são? - perguntei, curiosa.
- Pessoas que sofreram discriminação buscando por justiça, essa cidade é tanto deles quanto é nossa, as pessoas são apenas esnobes demais para perceber isso.
- Eles querem o que é deles por direito... - falei, já entendendo o que Greg estava dizendo.
- Exato! Você aprende rápido. - Greg disse enquanto sorria.
- Só não entendi ainda como a biblioteca vai ter nossas respostas.
- Bom, não é como se lá fosse ter um mapa explicando como sair da cidade, mas pode ter algo que não aprendemos na escola que pode acabar nos ajudando, nos dando alguma dica ou algum rumo de onde podemos pesquisar.
- Se era só ir na biblioteca, porque vocês não começaram a investigar antes?
- Porque nós queríamos uma motivação, algo que nos mostrasse que é realmente possível atravessar o muro. Não queríamos passar meses fazendo pesquisas e investigações para no final descobrirmos que é impossível atravessar a barreira, mas aí você apareceu, você é nossa motivação, você nos fez acreditar que é realmente possível atravessar o muro. -  Greg disse isso com um imenso olhar esperançoso, com uma esperança de encontrar felicidade, de fugir desse lugar tão monótono. Foi então, nesse momento, que eu senti a culpa sobre mim, pois mesmo sem ter vindo daquele lado eu continuava alimentando a esperança daquele menino tão gentil e que estava disposto a ajudar, mas eu percebi que, se eu falasse de onde eu havia realmente vindo, Greg não me ajudaria, nem nenhum de seus amigos. Então, pelo bem de todos, continuei mantendo meu segredo apenas entre eu e o Destino e, se dependesse de mim, somente nós dois saberíamos disso nessa dimensão.
- Hm... Que bom então que vocês me encontraram - sorri tentando disfarçar meu sentimento de pena por o estar enganando, mas eu tinha fé de que iríamos conseguir achar uma maneira de atravessar o grande muro metálico.
- Teria sido melhor ainda se você se lembrasse de como chegou aqui, mas nem tudo é como a gente quer. - ele disse rindo - Então, vamos? - notei que ainda estávamos parados em frente à porta de sua casa, então fiz que sim com a cabeça.- MÃE, NÓS ESTAMOS SAINDO! - Greg gritou avisando sua mãe enquanto abria a porta e fazia um gesto com as mãos para que eu passasse na sua frente e logo saiu atrás de mim, fechando a porta de sua casa, sem trancar, obviamente. Enquanto ainda andávamos por sua rua, decidi tirar uma dúvida que tinha desde que havia encontrado a Rua Govern.
- Porque eu só vi casas aqui na sua rua?
- Nunca houve uma reforma em nossa rua desde que o muro se ergueu, já que vários moradores dessa área na época em que o muro surgiu eram contra a existência dessa barreira por defenderem a igualdade. O governo, então,  decidiu nos punir nunca modernizando nossa rua, por isso muitas pessoas nos desprezam porque acham que até hoje todos apoiamos os revoltosos.
- Mas se passaram 100 anos! - respondi, indignada.
- Sim...
- É por isso que você quer atravessar o muro, além de querer fugir da monotonia?
- Eu acho esse lado muito injusto. Todos parecem perfeitos, mas se julgam demais. Além de serem todos cegos pelo governo, todos deixam com que o Superior controle suas mentes e suas vidas, ninguém aqui pode ser quem quer. Eu quero poder fazer minhas próprias escolhas, não quero ter um emprego normal como todo mundo. Eu quero apenas viver, sem me preocupar com nada.
- Você não tem medo dos perigos do outro lado? Sabe... Já que lá não tem regras...
- Eu acho que eu consigo me virar, pensa bem, lá eu posso ser livre! Eu não preciso ser como todo mundo.
- Uau, eu não sabia que você tinha esse lado punk. - ri de forma divertida enquanto Greg me olhava com um olhar confuso.
- Punk?
- Você não sabe...? Quer saber, deixa. - decidi que seria melhor não tentar explicar o que era "ser punk", pois senão confundiria a mente de Greg.
- Hm... Tudo bem...
- Eu acho legal você querer isso, querer ser quem você é. - eu disse e Greg sorriu timidamente. - É chato ser apenas um robô da sociedade.
- Você realmente pensa como alguém de West-GateNY.
- Eu... Hm, é.

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⏰ Última atualização: May 28, 2016 ⏰

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