II - A Lua do Amor

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O capitão Henry, após terminar de inspecionar o novo projeto hídrico, desceu por um elevador até os seus aposentos para descansar um pouco. Lá sua esposa o esperava. Lanza Iroshi era uma das engenheiras nucleares mais respeitadas que ele conhecia.

— Como está querido? Não o vi acordar hoje — disse, o abraçando — Chegaram os mantimentos?

— Sim, deu tudo certo, meu amor. A nave fez uma boa viagem e, no momento, estão descarregando tudo... Supervisionei as primeiras etapas e, em seguida, aproveitei para acompanhar a construção do reservatório. Ando meio estressado com este projeto, que é gigantesco... Como parece, às vezes, a responsabilidade de comandar essa base. Não posso me descuidar nem um pouco. Ainda bem que tenho ótimos oficiais para me assessorarem neste trabalho.

Ela o beijou nos lábios e disse:

— Podíamos aproveitar que você está aqui e eu também para, quem sabe, namorar um pouco...

— Adoraria atender o seu desejo, mas não posso. Temos visita na base e posso ser chamado a qualquer momento. Não iria querer que eu parasse o que estivesse fazendo na metade, não é? À noite, teremos tempo de sobra.

Ela lhe deu as costas, parecendo realmente magoada:

— Depois que viemos para este lugar, você pensa apenas no seu trabalho... Nossa vida está se esvaindo por entre os dedos. Esqueceu-se até do plano de tentarmos ter um filho assim que chegássemos. Agora não faz mais nada além de pensar o tempo todo neste projeto. Henry, preciso mais de você do que essa maldita base! Até nos dias de descanso, você tem trabalhado. Ou você se esqueceu de que hoje seria a nossa folga, juntos?

— Calma, meu amor, tudo a seu tempo. Você sabe que um Comandante não tem folga e que gosto de supervisionar as coisas importantes pessoalmente. Não se esqueça de que eu amo você!

— Mas parece que eu deixei de ser importante para você, já que a desculpa é sempre o trabalho.

— Eu lhe garanto que ainda sou um bom marido e teremos o filho que tanto deseja. No fundo é o que eu mais quero também — disse, sorrindo para deixá-la mais contente. — Eu quero várias crianças brincando ao nosso lado, pulando na minha cabeça — ela sorriu de volta.

— Está bem, querido. Desculpe-me por tantas cobranças. Imagino que a responsabilidade sobre suas costas é grande. Vamos fazer tudo na hora certa. Tome um copo d'água. Quase não vejo você tomá-la. Faz bem à saúde.

— Obrigado querida. É que basta ouvir falar em água e me lembro do projeto do reservatório.

— Deixe tudo a seu tempo. Não foi isso o que combinamos? — Ela o fitou com falsa severidade.

Ele sorriu mais uma vez.  O capitão comeu um lanche preparado por ela e deitou-se um pouco. Adormeceu por alguns minutos.

Enquanto isso, o casal de oficiais continuava a conversar no restaurante. O tenente Cordon pediu mais um café para prolongar o tempo com a bela oficial. Sarah deu uns goles na bebida quente e disse:

— Eu acho impressionante como a diversificação das culturas humanas, desde as primeiras formações das sociedades, não deixou o homem enxergar que um dia os recursos do planeta iriam acabar, e que a disputa por crescimento econômico nada mais era que o combustível para o início da guerra e devastação do planeta. Acabaram as vantagens do crescimento econômico, as diversidades culturais e as ideologias sobre a destruição da humanidade baseadas nas profecias antigas. Na verdade, o planeta Terra foi extinto por quem deveria preservá-lo.

— Quando descobrimos que havia vida em outros planetas, tudo mudou. Você se lembra da primeira comunicação com outras civilizações, ao descobrimos através dos poderosos telescópios e equipamentos de rádio que havia seres tentando fazer contato conosco? Com as redes sociais, o mundo todo soube que o ser humano não é o único privilegiado de viver no vasto Universo. Então, os jovens que cresceram plugados ao mundo globalizado deixaram de seguir as crenças que viviam da descrença do povo, para acreditarem na diversidade do Cosmos. A maioria das religiões acabou. Agora somos um só povo da humanidade, tentando sobreviver. A ideologia é a de nos unirmos em prol de nossa descendência.

— É doloroso olhar para trás e ver que bilhões de vidas foram ceifadas por causa de guerras, causadas por motivos religiosos e econômicos que nunca existiram, ou pelo menos, não existem mais — comentou Sarah.

— Meu sonho seria ter nascido no planeta verde e ver os animais que nossos antepassados diziam que viviam pelas florestas. Pássaros que voavam pela vastidão do céu azul e que cantavam demonstrando alegria, peixes nos grandes oceanos, animais caçadores que matavam somente para saciar a fome e o meio ambiente em total equilíbrio — disse Cordon.

— Até que o homem entrou no meio disso tudo, desequilibrando a vida no planeta. Graças aos nossos cientistas, uma parte da humanidade conseguiu sobreviver e criar sistemas de habitats artificiais, imitando a harmonia dos verdadeiros biomas terrestres. E estamos nós aqui hoje por causa disso, numa lua distante da Terra. E o que nos move é o nosso espírito de sobrevivência. Ele faz com que tenhamos garra para vencer, enfrentar obstáculos e lutar por algo em que acreditamos... A vida é o motivo da maior entrega da alma humana. Sempre a humanidade dará sua última gota de sangue para se auto preservar.

Eles sorriram juntos, concordando. O que seria deles sem aquilo que os povos antigos chamavam de fé?

— Que tal se assistirmos um filme juntos esta noite? — Ele disse, mudando de assunto.

— Acho legal. Vamos ao cinema holográfico mais tarde? — Ela levantou um holograma, conferindo os horários de exibição.

— Para mim está ótimo.

Após conversarem sobre amenidades, ele não resistiu à curiosidade e perguntou de modo incisivo:

— Sarah...

— O que foi, Cordon?

— Desculpe-me, estou um pouco envergonhado para lhe fazer uma pergunta...

— Por quê? Pode falar...

É agora ou nunca, ele pensou antes de finalmente indagar:

— Você tem alguém?

— Como assim? — Ela pareceu confusa com a pergunta.

— Digo... É casada? Tem namorado?

Sarah levantou as sobrancelhas e disse:

— Nossa, como você é direto, Cordon!

E ele, todo sem graça, respondeu para ela, mesmo sabendo que talvez não gostasse do que fosse ouvir:

— Talvez não a veja de novo. A distância entre as colônias é grande. O tempo é curto e o espaço é longo. Se ao menos existissem as pontes espaço-tempo ou teletransporte, seria ótimo. Mas acho que isso vai demorar muito para ser descoberto. — Ele respirou antes de continuar — Eu queria que você soubesse que gostei muito de você. Achei-a bonita e inteligente, poderia ficar horas conversando com você.

Ele colocou a mão sobre a dela, mas Sarah afastou a mão discretamente para que ninguém percebesse. Ficou envergonhada com a declaração.

— Se eu tivesse compromisso com alguém, não iria ao cinema holográfico com você. Eu não tenho ninguém no momento, mas não gosto de coisas que acontecem rapidamente. Nem o conheço! Talvez possa acontecer algo entre nós, mas vamos deixar que as coisas sejam naturais, ok?

— Espero ter este tempo que você precisa. No que depender de mim, fico aqui o tempo que for necessário para gostar de mim... — Ela aquiesceu. — Nos vemos à noite, então.

Ele se levantou, aproximou-se dela e beijou-a levemente na face. Sarah ficou surpresa, pois isso não era comum entre oficiais, mas sorriu para ele. Cordon retribuiu, com um sentimento de esperança no coração por saber que havia uma chance para ele. Afinal, Sarah não havia dito sim, mas não o recusou prontamente... E a tenente aceitara ir ao cinema com ele. Seria uma boa oportunidade para se aproximarem.

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