Capítulos 2: Despedidas

58 6 0
                                    


A luz forte do sol que atravessava minhas pálpebras começava a me tirar do sério. Um vento forte bateu e areia começou a voar no meu rosto. Vento? Areia? Abri meus olhos muito lentamente, a luz era incômoda demais para alguém com olhos tão claros como os meus. O céu azul claro, com poucas nuvens me recebia. Apalpei o chão ao meu lado e percebi que estava deitada na areia. Tenho 100% de certeza que eu dormi na minha cama, e não na praia. Ergui meus braços e percebi que eu estava completamente vestida. Olhei as cores e percebi que estava usando o uniforme do exercito americano. Tentei me sentar, mas uma dor alucinante logo abaixo do meu ombro direito me fez perceber que não era uma boa ideia. Passei a mão por cima e encostei-a em algo molhado e gosmento. Trouxe a mão novamente ao meu campo de visão e ela estava completamente suja de vermelho, de sangue, do meu sangue. Minha audição começou a funcionar, e eu comecei a ouvir barulhos muito altos. Bombas, tiros, tanques, aviões. Eu não tinha ideia do que estava acontecendo. Como diabos eu fui parar lá, se eu tinha certeza que antes de dormir eu estava na minha cama? Os sons aumentaram, mas mesmo assim consegui ouvir alguém chamando meu nome. Sua voz estava desesperada. Tentei me sentar novamente, e a vertigem me atingiu. Deitei novamente e me contatei em tentar gritar que eu estava aqui, para a pessoa que me chamava, mas não consegui. Virei minha cabeça e vi uma garota correndo em minha direção. Ela usava o mesmo uniforme que eu, estava com um capacete e carregava um fuzil em mãos. Continuei olhando pra ela até que ela parou ao meu lado, continuava a falar meu nome, e eu só conseguia encará-la. Com extremo cuidado, a garota sem nome tirou o meu capacete e acariciou meu rosto. Parecia estar chorando. Os estrondos estavam ainda mais altos, e outra pessoa também chamava meu nome. A ultima coisa que me lembro são de seus olhos castanhos me encarando, como se tivessem dizendo adeus.

Acordei sobressaltada. Que diabos de sonho foi esse? Eu ainda estava na minha cama, eu ainda estava seminua. Desviei o olhar pra porta. Ah, então era daí que o barulho estava vindo.

-Vamos Lo, acorda. Você não pode se atrasar. – falou enquanto batia na porta

Ouvi a voz da Tay, e cocei meus olhos.

-Já acordei, vou tomar um banho e já desço.

Assim que falei, a porta parou de ser espancada e eu levantei da cama. Fui direto para o banheiro, ligando o chuveiro e me deixando relaxar embaixo dele. Queria saber qual era o motivo do sonho. Por que sonhei que tinha sido ferida? Que provavelmente estava a beira da morte? E o mais intrigante, por que aqueles olhos castanhos que eu nem conhecia direito estavam mexendo tanto comigo?

Sai do banheiro com uma toalha enrolada no meu corpo, e secando meu cabelo com outra. Peguei uma calça jeans preta rasgada, uma camiseta preta de uma das minhas bandas favoritas, The 1975, calcei meus coturnos e desci para tomar café.

-Bom dia, filha. – minha mãe me cumprimentou.

-Oi mãe, a senhora por um acaso fez aqueles ovos com bacon que eu tanto gosto?

-Mas é claro, o ultimo dia da minha filhinha em casa. Com toda certeza que eu iria fazer o café preferido dela. – disse enquanto colocava a comida em um prato e me entregava. – vai querer café?

-Claro, mas deixa que eu pego. E eu não sou sua filhinha, a Taylor é. Eu sou a mais velha. – bufei

-Não importa, você sempre vai ser meu bebezinho.

-É bebezinho. – Chris entrou na cozinha debochando.

-Deixa de ser idiota, cara.

-Ah qual é maninha, você pode ser a mais velha, mas eu sou o mais alto, o mais bonito, o mais...

-O mais burro. – Taylor comenta enquanto senta-se ao meu lado.

Engasgo-me com o café e começo a rir. Minha mãe balança a cabeça resmungando, enquanto Chris lança um olhar mortal para Taylor. Levanto meu braço com a palma estendida para ela e fazemos um Hi-5. Apesar de sempre pegarmos um no pé do outro, na maioria das vezes eu e Tay nos juntávamos para zoar o Chris.

-Desemburra ai, Chris. Você que começou, a Tay so terminou. – comentei

-Cala a boca, Lauren.

Peguei um pedaço de ovo e taquei nele. Minha mãe percebeu e já interviu, antes que começássemos uma guerra de comida.

-Já chega, crianças.

-É, crianças. – minha irmã comentou levando um leve soco de Chris no braço.

Meu pai entrou na cozinha, lendo seu habitual jornal, e vestindo sua farda. Deu um beijo em cada um de nós e se sentou na ponta da mesa.

-Está preparada, querida?

-Mais do que nunca, pai. Vou sentir muita falta de vocês, falta dos abraços da mamãe, de irritar os meus irmãos, de ficar arrumando o carro com o Chris, das longas conversas com a Taylor, e dos seus carinhos. – comentei meio envergonhada.

Nunca fui o tipo de garota sentimental, mas sabia que eu provavelmente ficaria um bom tempo sem ver meus pais e meus irmãos. Dos meus amigos mais íntimos eu já tinha me despedido no dia anterior, para evitar a aglomeração aqui em casa e o possível atraso que eu iria sofrer.

-Ah minha querida, vamos sentir muita falta de você, mas esperamos que você siga seu sonho com garras e dentes. –Percebi que minha mãe já estava chorando. Deixei-a me abraçar enquanto controlava seu choro.

-Pelo menos serei o filho da vez agora. –Chris comentou

Meu pai lançou um olhar torto pra ele, e ele ficou quieto, fazendo todo mundo rir e ele ficar corado.

-Bom, acho que já está na hora de ir não? Taylor, você me ajuda a pegar as minhas coisas lá em cima?

Taylor prontamente se levantou e subimos pro meu quarto. Antes que ela pudesse falar algo, eu fechei a porta do quarto e me virei para ela.

-Lauren, o que dia..

-Tay, preciso te pedir uma coisa, e preciso que você prometa pra mim.

- Mas eu..

-Me deixe falar. Você sabe que a vida de um soldado não é fácil né? Eu sei que eu ainda vou iniciar o treinamento, mas do jeito que as coisas estão mundo a fora, provavelmente uma guerra não irá tardar. – ela ameaçou me interromper, mas eu mexi a cabeça de um lado para outro- Espere eu terminar de falar. Sei que muitas coisas podem acontecer, mas eu quero que você me prometa, que se o pior acontecer comigo, você vai ser a pilastra da mamãe e do papai. Você e Chris. Você é a mais forte de nós três, e eu preciso que me prometa que vai cuidar deles pra mim. Principalmente da mamãe.

-Mas Laur...

-Prometa Tay, por favor. – pedi, exasperada.

-Eu prometo, mas por quê? Não é como se você fosse morrer. Você não vai. Se uma guerra acontecer, tenho certeza que você vai ficar bem. Eu posso ser forte, mas também não vou aguentar perder você.

-Você não vai me perder. Só quero que prometa que caso algo aconteça, vai cuidar dos nossos pais por mim.

-Eu prometo, eu vou. Eu te amo.

-Eu também te amo maninha. – abracei-a e beijei sua testa. - Somos Jaureguis, sabe como temos uma incrível sorte de voltarmos ilesos de guerras e combates.

Soltei uma risada rouca e Taylor me acompanhou. Ela pegou uma das minhas mochilas e eu peguei a outra. Saímos do quarto e antes de descer a escada a nossa frente, Taylor me deu um soquinho no ombro.

Chegamos ao carro do meu pai, colocamos as mochilas no porta malas, e partimos. Minha mãe ainda soluçava quando meu pai estacionou em frente aos portões. Dezenas de famílias se despediam de seus filhos, choros eram ouvidos por todos os lados. Despedi-me dos meus pais e dos meus irmãos, em meio a muitas lagrimas, e me distanciei deles, indo de encontro ao meu sonho e ao meu futuro incerto.



Inside The Army  Onde histórias criam vida. Descubra agora