como um fogo incontrolável

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— Até parece que não me quer mais.

Minha frase final ainda ecoava em minha cabeça, e tínhamos terminado de tomar o café em silêncio — ele tinha terminado, aliás; minha fome se foi junto com a nossa paz. Vendo que eu não ia comer mais nada, ele tomou o sanduíche de mim e comeu o resto. Em seguida, juntou os copos e os colocou na bandeja e, sem dizer nada, desapareceu no corredor do apartamento. Tive a vontade de segui-lo, porque algo me dizia que ele não voltaria, mas meu orgulho falou mais alto e continuei sentada na cama enquanto ouvia um barulho estranho ecoando pelo corredor.

Ele apareceu de novo com um pano pingando água e começou a passar pelo chão do corredor. Sorri vitoriosa: o chão sujo tinha o incomodado também. Decidi, enfim, me levantar e me aproximar dele, que está de quatro e totalmente interessado no chão, mas sei que é para não olhar para minha cara.

— Já ia te pedir para lavar esse chão. O apartamento está uma bagunça — tentei falar da maneira mais amigável possível, e ele resmunga.

Só um resmungo. E nada mais. Nem um olhar fuzilador, nem um grito, nem uma cortada e isso me amedrontou, porque sempre soube o que significava quando ele resolve ficar calado desse jeito. Significa que ele estava pensando no que eu tinha falado, isso se não estiver magoado e que, ao contrário de mim, preferia ficar calado a falar coisas da boca para fora. Assim continuamos até que ele terminasse de limpar todo o chão do corredor, precisando ir algumas vezes à cozinha para lavar o pano de chão.

— Will, fale alguma coisa. — Disse manhosa enquanto o acompanho até o cesto de panos sujos, na expectativa de que dessa vez ele dissesse alguma coisa. Eu preferia que ele gritasse comigo e me respondesse à altura do que continuar nesse gelo irritante.

— Eu não sei o que dizer, porque parece que tudo o que faço é errado, tudo o que faço você recrimina, se eu me contenho você reclama, se vou longe demais-

— Mas Wilmer, são circunstâncias diferentes. Eu estou bem agora. Eu estou livre, agora você não precisa mais-

— Será que você não entende? — Ele se virou para mim, apoiado na pia. — Porra, "até parece que você não me quer mais"? Sério? Depois de tudo o que eu fiz, você me vem com uma dessas? Como acha que eu me sinto? — Ele me olhou nervoso enquanto colocava as mãos na cabeça. — Porra, minha própria namorada aparece na minha cama de calcinha e sutiã depois de quase um mês sem vê-la, o que você acha que me deu vontade? Mas não fiz nada, eu te respeitei porque sabia que tudo o que você queria era ficar daquele jeito comigo e eu também queria. Aí, quando é hoje de manhã, você me vem com essa? Sinceramente, Demi, eu não sei mais o que fazer. — Ele estava com os músculos rígidos, completamente no seu estado de briga. Tento me aproximar e luto contra meu próprio orgulho para conseguir falar o que ambos precisávamos ouvir.

— Desculpe. É que... Às vezes, é essa impressão que você me dá. Não quis magoá-lo. — Ele olhou para o teto e cruzou os braços. — Eu falei da boca para fora — Toquei seu peito com as minhas mãos com cuidado, tirando seus braços dali, e felizmente posso ver que ele está cedendo, pois ele respira fundo e fecha os olhos.

— Tudo bem. Eu não gosto de brigar com você, você sabe. — Ele afagou minhas mãos e eu sorri fraco com o carinho.

— Eu também não. Principalmente quando você está sem camisa — ele riu com meu comentário e pega as minhas duas mãos, beijando cada um de meus pulsos.

Wilmer pegara essa mania depois de ter me visto com a pele mutilada pela primeira vez, com a desculpa de que com seu amor minhas feridas se cicatrizariam mais fácil. Nunca soube se ele estava falando só dos cortes em si ou das feridas da minha alma como um todo, já que por vezes ambas se confundiam; mas eu não ligava, porque achava aquele gesto lindo para alguém como ele, que se mostrava ser sempre tão sério.

old ways || demi lovatoOnde histórias criam vida. Descubra agora