Capítulo 7

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Chegamos no ponto do ônibus, Marie estava feliz, obviamente porque Lisandre não veio no meu encalço. Rick ainda estava com raiva, isso era notável. Ele tinha uma carranca bem engraçada: bochechas inchadas, olhos diminuídos, e bico de peixe.

- Que coisinha mais linda. Já te disse que você fica uma graça quando está com raiva? - falei.

- Não brinca com isso. Estou realmente com vontade de espancar ele, enfim. Olá - disse virando para Marie - Meu nome é Rick.

- Prazer em conhecer, Rick. Sou Marie. Vejo que não sou a única a detestar esse namoradinho da Laura...

- Da pra vocês pararem de implicar com ele? Ele é um pouco diferente... só isso. Ele tem sentimentos também.

- Claro, todos nós sentimos raiva. - riu Marie e Rick.

- Hahaha, que engraçado. - falei emburrada.

Eu já deveria saber que ficar defendendo Lisandre deles não era uma boa ideia. Ele não era do tipo "bom menino", nem do tipo "eu sou o cosplay do capeta"... Ele era ele com tudo o que tinha direito na seção de peculiaridades. Rick não pegava o mesmo ônibus que nós duas, mas decidiu ficar até a gente pegar o nosso para depois ir embora. Marie falava é gesticulava com as mãos, sua desenvoltura para se expressar com as mãos era quase as de um maestro. Rick sorria como se tivesse tentado engolir uma barra de ferro e ela tivesse feito seu sorriso abrir de canto a canto. Era maravilhoso ver isso.

- Vamos, Laura, você sempre tem boas histórias para contar. - disse Marie me dando um soco de leve no ombro.

- A biblioteca está fechada para manutenção, tente novamente amanhã. - ri devolvendo o soco.

- É melhor deixar pra amanhã mesmo - comentou estendendo os braços para o nosso ônibus.

Dei um abraço rápido e um beijo na bochecha e subi. Marie fez o mesmo. Quando nos sentamos, ela suspirou, estava corada.

- É, eu sei. Ele é incrível. - disse olhando pela janela.

- Meu Deus! Incrível é pouco. E ele gosta de você... se não fosse por isso, eu pedia o número dele. - se esparramou na cadeira.

- Nossa, como você é chata. - ri da situação. Peguei meu celular e entreguei a ela - Pegue o número. Faço ele te dar uma chance.

Eu estava esgotada. Foi um dia cheio para mim. Marie ficou eufórica com a notícia que podia ter o Rick só pra ela. E eu me senti horrível, porque mesmo antes, eu nunca havia sentido tamanha euforia com Lisandre.

- Tem certeza que não quer ficar com ele? - perguntou.

- Olha pra minha cara e diz que isso que você perguntou e brincadeira, sua idiota. - sorri - Claro que não quero nada com ele. Estou com Lisandre. E quer saber? Eu apoio vocês dois.

- Jura?

Não respondi. Ela me conhece bem o bastante para eu ter que ficar: "sim, querida" ; "nossa, que legal". Não. Isso definitivamente não é o que eu costumo fazer. O caminho não podia ser pior. Nunca pensei que iria me arrepender tanto de ter deixado Marie se empolgar com algo. Ela ficou o caminho todo falando como ele era legal, bonito e coisas que eu já sabia. Era horrível ter ela do meu lado. Tive vontade de empurrar ela janela a fora, no mínimo. Ela mora a três paradas antes da minha casa, o que é um alívio.

- Bem, vou indo. Te vejo amanhã? - perguntou.

- Quem sabe! Se cuida.

- Você também.

Depois que ela desceu, fiquei na paz do meu silêncio e do vento entrando pela janela. Puxei a cigarra do ônibus quase dois minutos depois que Marie desceu. Tinha muita gente na rua. O bar que ficava na esquina estava aberto e era dia de campeonato brasileiro (eu acho). Entrei no meu condomínio. A quadra estava cheia de garotos jogando bola, o parque cheio de crianças correndo e brincando, e no banco estavam as minhas pirralhas... não eram tão pirralhas assim, só mais novas um ou dois anos.

Tempos ConfusosOnde histórias criam vida. Descubra agora